TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
170 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pagas por quem estava obrigado a fazê-lo – é necessariamente anterior à decisão judicial que as estabelece, pois o momento da constituição da necessidade do menor é também anterior à sentença e mesmo, dir-se-á, ao próprio pedido de intervenção judicial. Isto não significa que não se possa considerar este último como um momento particularmente relevante, pois corresponde à fase em que se esgotaram ou se mostraram inviáveis todas as possíveis vias legais que pudessem preencher o mesmo fim (seja pelo pagamento voluntário, seja pelo pagamento coercivo das presta- ções de alimentos devidos a menor). Com efeito, ele ocorre após se frustrarem as diligências de ativação dos mecanismos coercivos de cobrança das prestações pecuniárias incumpridas pelo devedor de alimentos (como previsto, designadamente, no artigo 189.º do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro – OTM), ao que a lei responde com a criação de uma prestação mensal ao menor em causa, a pagar por um Fundo específico estadual, sendo essa quantia entregue à pessoa à guarda do qual o menor se encontra. O pedido é igualmente relevante para o conhecimento da situação de carência que o justifica, já que se trata de despoletar uma intervenção pública necessariamente subsidiária face à omissão de cumprimento dos deveres de assistência financeira (pagamento da prestação de alimentos) por parte do progenitor a tanto judicialmente obrigado. Uma vez verificada a falência das vias disponíveis para o cumprimento da obrigação de alimentos por parte do devedor, ao Estado é cometida, por via do Fundo, uma responsabilidade pelo pagamento em substi- tuição do devedor – sempre existindo direito ao reembolso pelo devedor, já que o Estado fica sub-rogado em todos os direitos do menor a quem sejam atribuídas prestações (artigo 5.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de maio). Atendendo também aos critérios estabelecidos na lei para um recurso bem sucedido a este mecanismo, verifica-se que o mesmo se dirige a um conjunto de situações de manifesta precariedade, determinada pela carência de meios financeiros suficientes para a satisfação condigna das necessidades essenciais do menor, inerentes à sua subsistência e ao seu desenvolvimento como pessoa – alimentação, vestuário, educação, habitação. A lei estabelece como requisito de atribuição das prestações de alimentos um apertado limite de rendimentos, assegurando o pagamento das prestações pelo Estado, através do Fundo, apenas aos menores que não tenham rendimentos líquidos superiores ao salário mínimo nacional nem beneficiem nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontrem [artigo 3.º, n.º 1, alínea b) , e n.º 2, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de maio]. Ora a interpretação da norma contida no artigo 4.º, n.º 5 no sentido do diferimento do pagamento de prestações de alimentos a menor (em substituição do devedor) para momento posterior ao da decisão judicial que determina o respectivo montante, só aí se constituindo a obrigação do Estado, ainda que em substituição do devedor, determina o prolongamento no tempo da situação de carência que justifica o direito à prestação estadual, ignorando as opções inviabilizadas e as consequências que poderão ter ocorrido nesse lapso tem- poral, com projecção na esfera pessoal do menor, tal como o empobrecimento do progenitor, as mais das vezes a mãe, ou da pessoa com a guarda do menor (logo, do próprio menor), o abaixamento da satisfação das suas necessidades ao nível mais básico da subsistência ou o endividamento do progenitor ou da pessoa com a guarda do menor e responsável por essa satisfação, o que necessariamente se repercutirá na situação futura da criança e do seu agregado familiar (que poderá até incluir outras crianças). E, como defendido acima, a responsabilidade do Estado não se deve considerar constituída apenas com a decisão judicial, mas em momento anterior, que sempre cumpre ao legislador fixar, de modo a assegurar a maior eficácia na protecção dos direitos da criança face a um incumprimento comprovado do dever de pres- tação de alimentos por parte do progenitor ao mesmo obrigado e ao qual o Estado se substitui. A responsabilidade do Estado perante as situações abrangidas pelo regime normativo em causa corres- ponde, pois, a uma forma de responsabilidade, ‘subsidiária’ em relação ao devedor, derivando a responsabi- lidade de ambos de imperativos constitucionais. Com efeito, o universo dos beneficiários das prestações de alimentos integra uma categoria particular de pessoas, qualificada pela menoridade, a que a Constituição confere uma protecção acrescida.
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