TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
161 acórdão n.º 274/13 o alimentado não tenha um rendimento líquido suficiente para se autossustentar, nem beneficie, nessa medida, de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre; 6) Na verdade, nestes casos de frustração do cumprimento da obrigação de alimentos no quadro da solida- riedade familiar, os menores incorrem numa situação grave de falta ou diminuição de meios de subsistência, que coloca em risco o seu direito a uma vida digna; 7) O legislador dispõe de ampla liberdade na escolha dos meios de intervenção do Estado em apoio das crianças que se encontrem em situação de risco, mas esses meios tem que ser suficientes, sob pena dos referidos direitos constitucionais serem incumpridos, por violação do princípio da proibição do défice de tutela; 8) Não sendo fácil apurar o nível de suficiência exigido, existirá, seguramente, um mínimo social que o Estado deve garantir, tendo em consideração o nível de desenvolvimento civilizacional, os recursos públicos e as condições que, segundo os valores dominantes, são indispensáveis a uma vida digna; 9) Após se terem previsto mecanismos coercivos de cobrança das prestações pecuniárias incumpridas pelo devedor de alimentos (designadamente o artigo 189.º da OTM), quando se frustram essas diligências, o legislador nacional previu a criação de uma prestação mensal ao menor em causa, a pagar por um Fundo específico estadual, sendo essa quantia entregue à pessoa à guarda do qual o menor se encontra; 10) Ora, para avaliar a suficiência desta medida, são parâmetros fulcrais não só os requisitos estabelecidos para a atribuição das prestações e o montante destas, mas também os momentos em que o Estado passa a ser responsável pelo seu pagamento, ou seja, o da constituição da respetiva obrigação, e o da sua exigibilidade; 11) No âmbito da atribuição de prestações pecuniárias regulares, destinadas a custear as despesas dos menores, a questão temporal da satisfação dessas prestações revela-se, com efeito, essencial; 12) Nessa medida, o sistema de segurança social deve garantir uma adequação temporal da resposta, conce- dendo oportunamente as prestações legalmente previstas para uma satisfatória promoção das condições dignas de vida das crianças; 13) Este objetivo, porém, só se poderá ter por alcançado, se as prestações sociais, atribuídas aos menores, cobri- rem, o mais aproximadamente possível, todo o período em que se verifica o incumprimento de quem tem o dever de prover à sua subsistência; 14) Estando em causa menores privados de meios de subsistência necessários ao seu desenvolvimento, esta é uma situação em que não há razões que possam justificar uma resposta tardia do Estado na defesa de condições dignas de vida destes seus cidadãos; 15) Na interpretação normativa sob fiscalização, apenas está em jogo o momento da constituição da obrigação do Estado pagar uma prestação mensal, que garanta à pessoa, a cuja guarda o menor se encontre, os meios suficien- tes para esta prover a um saudável crescimento do menor; 16) Ao fixar o momento de constituição da obrigação do Estado pagar essa prestação mensal na data em que é proferida a decisão que apura a verificação dos requisitos para a sua atribuição, a solução normativa em apreciação compromete a eficácia jurídica da satisfação das necessidades básicas do menor alimentando, na medida em que a mesma se traduz na aceitação de sucessivos períodos, de duração incerta, de carência continuada de recebimento de qualquer prestação, depois de se ter revelado a frustração da solidariedade familiar; 17) O Estado não pode satisfazer-se com a garantia da mera sobrevivência fisiológica das crianças a quem faltou a solidariedade familiar, exigindo-se-lhe que garanta o desenvolvimento integral em condições dignas dessas crianças, proporcionando-lhe atempadamente as condições para um crescimento saudável; 18) Está em causa, com efeito, a satisfação de necessidades vitais, objeto do direito a um mínimo de existência condigna. Ora, este direito goza de um estatuto especial dentro dos direitos sociais, sendo dotado de um grau de fundamentalidade praticamente equivalente ao dos direitos pessoais; 19) Para além das disposições constitucionais referidas, também a Convenção da ONU dos Direitos da Criança, bem como a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, impõem que se tenha particularmente em conta, no caso dos presentes autos, “o superior interesse da criança”.»
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