TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
103 acórdão n.º 474/13 Vale por dizer que a interpretação que vinha sendo dada ao artigo 53.º da Constituição não inviabi- lizava a introdução de despedimentos por justa causa objetiva – algo que sucedeu, para os trabalhadores contratados, com a entrada em vigor do artigo 18.º da Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, e prosseguiu com o Decreto-Lei n.º 200/2006, de 25 de outubro, e com a Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, que aprovou o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas – nem tampouco colocava obstáculos à modificação do regime da mobilidade especial (cfr. a Lei n.º 53/2006, de 17 de dezembro) no sentido de este poder passar a culminar numa situação de efetiva cessação do vínculo dos funcionários públicos e agentes administrativos. Recorde-se que, nos termos do artigo 25.º da Lei n.º 53/2006, de 17 de dezembro, a mobilidade especial desembocava numa fase de compensação, de duração indeterminada, durante a qual o funcionário ou agente tinha direito a auferir uma remuneração de quatro sextos da remuneração base mensal. Deflui, portanto, que a intenção do legislador, com a introdução do modelo de requalificação, foi a de aprimorar as virtualidades da mobilidade especial e a de adaptar as causas objetivas de cessação da relação laboral previstas no Código do Trabalho às idiossincrasias da Administração Pública, colocando todos os titulares de contrato de trabalho em funções públicas sob a alçada do mesmo regime. A aplicação tout court das causas objetivas de cessação de contrato de trabalho ao emprego público, mormente no que respeita ao despedimento coletivo (artigo 359.º do Código do Trabalho) e ao despedimento por extinção do posto de trabalho (artigo 367.º do Código do Trabalho), não sendo intrinsecamente impossível, suscita natural- mente as maiores reservas (cfr. Miguel Lucas Pires, Os regimes de vinculação e a extinção das relações jurídicas dos trabalhadores da Administração Pública, Almedina, 2013, p. 215). Não se trata de uma impossibilidade intrínseca porque existe noutros ordenamentos jurídicos, como, por ex., o espanhol, em que, por força do artigo 7.º da Ley 7/2007 , de 12 de abril, que institui o Estatuto Básico del Empleado Público , valem para os trabalhadores da administração pública as causa objetivas de cessação do vínculo laboral previstas no Estatuto de los Trabajadores. Trata-se, porém, de uma opção de duvidosa valia, na medida em que os órgãos e serviços da Administração não têm fins lucrativos e não concorrem em regime de mercado, encontrando-se o setor empresarial público fora do âmbito de aplicação do Decreto. À luz do Decreto-Lei n.º 200/2006 (e da Lei n.º 53/2006, de 7 de dezembro), estão previstas quatro modalidades de reorganização de serviços – a extinção, a fusão e a reestruturação dos serviços – e ainda a racionalização dos efetivos. De acordo com o artigo 3.º, n.º 4, “a racionalização de efetivos ocorre quando, por decisão do dirigente máximo do serviço ou do membro do Governo responsável de que depende, se procede a alterações no seu número ou nas carreiras ou áreas funcionais dos recursos humanos necessários ao adequado funcionamento de um serviço, após reconhecimento, em ato fundamentado, na sequência de pro- cesso de avaliação, de que o pessoal que lhe está afeto é desajustado às suas necessidades permanentes”. Ora, o n.º 2 do artigo 4.º amplia a figura da racionalização de efetivos, na medida em que esta deixa de se processar apenas nas situações mencionadas naquele normativo, para passar abranger outros dois motivos ou causas: “redução de orçamento do órgão ou serviço decorrente da diminuição das transferências do Orçamento do Estado e de receitas próprias” e “necessidade de requalificação dos respetivos trabalhadores, para a sua ade- quação às atribuições ou objetivos definidos, e de cumprimento da estratégia estabelecida, sem prejuízo da garantia de prossecução das suas atribuições”. Admite-se que não é fácil perceber quais as reais consequências desta ampliação, tendo em conta os ins- trumentos já previstos na lei. Em todo o caso, a intenção legislativa parece ter sido a de reiterar e esclarecer que, paralelamente a causas organizativas ligadas à fusão, extinção ou organização dos serviços, também as causas económicas (quanto ao caso que nos ocupa, diga-se, inerentes à particular situação de crise económico- -financeira que o país atravessa, como é do conhecimento público) podem ter impacto no processo de gestão dos recursos humanos. O Código do Trabalho reconhece a possibilidade de despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho com base em “motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos”, avançando alguma doutrina que tais despedimentos serão de admitir para lá dos casos limite ou de iminente insolvência
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