TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 87.º Volume \ 2013
100 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E, na verdade, para além do alargamento do âmbito subjetivo que a medida comporta, pois esses traba- lhadores compõem boa parte da Administração Pública, não se encontra fundamento que permita conside- rar a presença de razões de interesse público com peso prevalecente sobre a confiança gerada pela expectativa legítima reforçada de defesa relativamente ao afastamento do despedimento sem justa causa subjetiva, nos mesmos termos de outros trabalhadores com que partilharam até à entrada em vigor da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, o regime de nomeação definitiva. Noutra perspetiva, falece justificação para a lesão de expectativa fortemente reforçada pelo legislador, na igualdade formal que se obtém entre esses trabalhadores e os trabalhadores em regime de contrato de trabalho em funções públicas constituídos a partir de 2009. A uniformidade das relações jurídicas laborais não constitui um valor per se, nem integra, seja no regime público, seja no privado, fundamento de interesse público para postergar a tutela da confiança legítima e justificar a não continuidade do comportamento estadual quanto à modificação de elementos nucleares e identitários do estatuto laboral. Em especial num quadro tão vasto e complexo como a Administração Pública, dificilmente deixarão de existir hipóteses de trabalhadores a desempenhar a mesma tarefa com vinculações não inteiramente coincidentes, o que, note-se, acontece igualmente na relação jurídica de emprego privada. Em suma, estão reunidas razões bastantes para considerar que não se demonstram razões de interesse público idóneas a postergar a tutela de confiança legítima quanto à continuidade do comportamento do Estado relativamente a peça nuclear do estatuto juslaboral dos trabalhadores abrangidos pela norma do n.º 4 do artigo 88.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro. Assim sendo, a norma revogatória sub judicio viola a previsibilidade do Direito, como forma de orientação de vida (cfr. Maria Lúcia Amaral, A forma da República, 2005, p. 185) e, desse jeito, a confiança e a segurança jurídica inerentes ao princípio do Estado de direito consagrado no artigo 2.º da Constituição. III – Decisão Pelo exposto, o Tribunal Constitucional decide: a) Pronunciar-se pela inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 18.º do Decreto n.º 177/XII, enquanto conjugada com a segunda, terceira e quarta partes do disposto no n.º 2 do artigo 4.º do mesmo diploma, por violação da garantia da segurança no emprego e do princípio da proporcionalidade, constantes dos artigos 53.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portu- guesa; b) Pronunciar-se pela inconstitucionalidade da norma constante do n.º 1 do artigo 4.º, bem como da norma prevista alínea b) do artigo 47.º do mesmo Decreto n.º 177/XII, na parte em que revoga o n.º 4 do artigo 88.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, e na medida em que impõem, conjugadamente, a aplicação do n.º 2 do artigo 4.º do mesmo Decreto aos trabalhadores em fun- ções públicas com nomeação definitiva ao tempo da entrada em vigor daquela lei, por violação do princípio da tutela da confiança ínsito no artigo 2.º da Constituição República Portuguesa. Lisboa, 29 de agosto de 2013. – Fernando Vaz Ventura – Maria Lúcia Amaral (com declaração) – Lino Rodrigues Ribeiro – Carlos Fernandes Cadilha – Ana Guerra Martins – José da Cunha Barbosa [vencido quanto à questão suscitada na alínea a) , de acordo com a declaração de voto que junto] – Joaquim de Sousa Ribeiro.
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