TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
719 acórdão n.º 197/13 inadmissibilidade implicaria que a tributação das empresas incidisse não sobre o rendimento das empresas mas apenas sobre as manifestações positivas periódicas do mesmo. VI. A impossibilidade de dedução do prejuízo de exercícios anteriores ao lucro tributável fere, no que à tributa- ção do rendimento concerne, não só aqueles princípios mas igualmente a própria noção de lucro enquanto base de incidência do imposto. VII. Ademais, constitui um desvio à incidência do imposto – constitucionalmente determinada – sobre o rendi- mento real e efetivo das empresas a favor de uma tributação incidente sobre meras manifestações periódicas e isoladas de saldos patrimoniais positivos. VIII. A tributação das empresas pelo lucro real é, pois, alcançada com a necessária consideração dos lucros e prejuí- zos numa perspetiva de médio prazo e não numa perspetiva míope que não alcança mais do que um exercício fiscal. IX. A derrama municipal é um imposto, tributo unilateral, assente no princípio da capacidade contributiva, e não um tributo comutativo, assente no da equivalência ou benefício. X. Mesmo que o benefício tivesse algum relevo em sede de derrama municipal, que não tem, o lucro anual não seria um indício da medida da vantagem que as empresas auferem das utilidades públicas locais, uma vez que esta, a existir, é tomada independentemente do facto de as empresas apresentarem lucro ou prejuízo e independentemente da forma como o seu rendimento real é distribuído pelos vários exercícios. XI. A dedução de prejuízos, que permite preservar a incidência do IRC dos efeitos perniciosos da especialização dos exercícios, é constitucionalmente imposta para a determinação da matéria coletável da derrama. XII. O Tribunal Arbitral considerou que, sendo a derrama um imposto autónomo, distinto do IRC, não lhe é aplicável o princípio da solidariedade de exercícios, o qual é, na perspetiva da ora Recorrente, decorrência do princípio da capacidade contributiva. XIII. O princípio da capacidade contributiva é um princípio material, de quilate superior, que prevalece sobre a regra formal da especialização de exercícios. XIV. A solidariedade de exercícios, de que deriva o reporte de prejuízos, é uma manifestação do princípio da capacidade contributiva, pois só poderá ser verdadeiramente apurada através de mecanismos que atenuem os efeitos da periodização do lucro tributável. XV. O respeito, nos termos enunciados, pelo princípio da capacidade contributiva e da tributação do rendimento real não fere o princípio constitucional da autonomia do poder local previsto no artigo 238.º da CRP. XVI. Pois ao estabelecer que a derrama incide sobre a matéria coletável, e não a sobre a coleta do IRC, permite ainda aos Municípios definir a sua receita fiscal de forma independente das opções tributárias do Estado (nomeadamente, as relativas à determinação das diferentes taxas do IRC). XVII. A douta sentença arbitral considerou – erradamente, na perspetiva da ora Recorrente – que não ocorreu qualquer violação do princípio da igualdade tributária – decorrência do artigo 13.º da CRP – com base numa interpretação lógico-formal do mesmo. XVIII.Decidiu igualmente – de forma errada na perspetiva da ora Recorrente – que o princípio da igualdade tribu- tária não tem aplicabilidade quando a situação dos contribuintes é alargada de um exercício para dois. XIX. O princípio da capacidade contributiva exprime e concretiza o princípio da igualdade fiscal ou tributária na sua vertente de ‘uniformidade’ — o dever de todos pagarem impostos segundo o mesmo critério — preen- chendo aquela capacidade o critério unitário da tributação ( maxime que a incidência e a repartição dos impostos ocorra segundo a capacidade económica ou “capacidade de gastar” de cada um e não segundo o que cada um eventualmente receba em bens ou serviços públicos, como sucede de acordo com o critério do benefício). XX. O princípio da capacidade contributiva é o critério sobre o qual deve assentar o apuramento da igualdade entre as empresas para efeitos de imputação tributária. XXI. A dedução de prejuízos de exercícios anteriores é igualmente imposta pelo princípio da igualdade pois este impõe, por um lado, (i) que duas empresas que realizem o mesmo lucro ao longo de um período de 2 anos sejam tributadas na mesma medida, independentemente do modo como este se reparta por cada um desses
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=