TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
68 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL “consigna o módulo constitucional específico da igualdade de direitos entre os cidadãos portugueses e os demais”. Sob a epígrafe «Estrangeiros, apátridas, cidadãos europeus», dispõe-se aí o seguinte: «(…) 1. Os estrangeiros e apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português. 2. Excetuam-se do disposto no número anterior os direitos políticos, o exercício das funções públicas que não tenham caráter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusi- vamente aos cidadãos portugueses. (…)» Tais normas, cujo texto remonta à versão originária da Constituição, inscrevem-se numa linha com tradição no direito português (cfr. o Acórdão deste Tribunal n.º 340/95). Garantindo aos estrangeiros e apátridas que se encontrem ou residam em Portugal os direitos e deveres do cidadão português, o n.º 1 daquele preceito consagra o chamado princípio do tratamento nacional isto é, “um tratamento pelo menos tão favorável como o concedido ao cidadão do país, designadamente no que respeita a um certo número de direitos fundamentais” (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , anot. V ao artigo 15.º, p. 357; vide, em idêntico sentido, Jorge Pereira da Silva, ob. cit. , anot. I ao artigo 15.º, p. 263). Quanto à definição do âmbito objetivo da equiparação consagrada no artigo 15.º, a jurisprudência e doutrina constitucionais vêm perfilhando uma conceção ampla do princípio, de acordo com a qual os direi- tos referidos no artigo 15.º, n.º 1, da Constituição não serão apenas os direitos fundamentais, os direitos, liberdades e garantias ou os direitos constitucionalmente garantidos, mas também os direitos consignados aos cidadãos portugueses na lei ordinária (cfr. os Acórdãos n. os 423/01 e 72/02; e Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , anot. III ao artigo 15.º, p. 357; Jorge Pereira da Silva, ob. cit., anot. I ao artigo 15.º, p. 263; Mário Torres, Prefácio a Direitos dos Estrangeiros, de Ana Vargas e Joaquim Ruas, Lisboa, 1995, p. 17; e Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976 , 5.ª edição, 2012, pp. 127 a 129). Tal compreensão, para além de consonante com o resultado de uma interpretação histórica, sistemática e lite- ralmente conformada do n.º 1 do artigo 15.º da Constituição, é justificada pelo caráter universalista da tutela dos direitos fundamentais num Estado de direito democrático baseado na dignidade da pessoa humana (cfr. o citado Acórdão n.º 423/01), sendo considerada, por isso, inerente ao texto constitucional (cfr. o Acórdão n.º 345/02). A Constituição prescreve, contudo, exceções ao princípio da equiparação e admite que a lei possa esta- belecer outras mais. Entre as exceções prescritas, constam as relativas a direitos políticos – nos quais se incluem os direitos, liberdades e garantias de participação política elencados nos respetivos artigos 48.º a 52.º −, ao exercício de funções públicas que não tenham caráter predominantemente técnico – conceito cuja delimitação deverá ser alcançada por contraposição às funções em que predomine o exercício de prerrogativas de autoridade pública (cfr. Jorge Pereira da Silva, ob. cit. , anot. VIII ao artigo 15.º, pp. 270 e segs.) – e aos direitos e deveres reser- vados pela própria Constituição aos cidadãos portugueses. Quanto às exceções admitidas – aquelas que o legislador ordinário pode estabelecer –, é aceite que a possibilidade de que este em geral beneficia de colocar autonomamente sob reserva da nacionalidade o gozo de determinados direitos, para além dos contemplados na Constituição, se encontra, ela própria, sujeita a diversos parâmetros condicionadores (cfr. o Acórdão n.º 345/02; vide também, Vieira de Andrade, ob. cit., pp. 128 e 129). Entre tais parâmetros avulta – uma vez que as exceções legais em causa restringem o princípio da equi- paração – a sujeição ao regime do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição das leis que, no todo ou em parte, excluam da titularidade de determinados direitos os estrangeiros e apátridas presentes ou residentes em Por- tugal (cfr. o Acórdão n.º 345/02). Assim, qualquer restrição legal do princípio da equiparação só será cons-
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