TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
676 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL desempenhefunção idêntica à da acusação – na prática, funciona como «acusação alternativa» –, sendo, por isso, natural que tenha de obedecer aos mesmos requisitos. De outro modo, em especial se de tal requerimento apenas fosse obrigatório constar as razões de facto e de direito da discordância em relação à decisão de arqui- vamento, o mesmo funcionaria como impugnação desta última junto do juiz de instrução. Ora, a instrução é mais do que isso e não pode ser dissociada da posição do arguido. Nos termos do artigo 286.º, n.º 1, do CPP, a mesma “visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento”. Deste modo, tendo o juiz de instrução de se debruçar apenas sobre o thema decidendum , e só podendo realizar os atos necessários àquela comprovação (cfr. o artigo 290.º, n.º 1, do CPP), os factos integradores do objeto da atividade de instrução têm de estar pré-definidos na acusação ou no requerimento para abertura de instrução, não competindo ao juiz selecionar, a partir do material coligido no inquérito, o que eventual- mente possa ser relevante. Tal seleção é incompatível com o princípio do acusatório enformador do processo penal português. 9. A questão de inconstitucionalidade suscitada perante o tribunal recorrido respeita à interpretação do artigo 287.º, n.º 2, do CPP, em articulação com o disposto no artigo 283.º, n.º 3, alíneas b) e c) , do mesmo Código, no sentido deste não impor a formulação de um convite ao aperfeiçoamento do requerimento para abertura da instrução, apresentado pelo assistente e que não contenha o essencial da descrição dos factos imputados aos arguidos, delimitando o objeto fáctico da pretendida instrução. Para aquele tribunal, “pre- tender que a omissão dos requisitos formais previstos no artigo 283 n.º 3 b) e c) não poderia ser sancionada seria deixar sem sentido e esvaziar quer a remissão feita na parte final do n.º 2 do artigo 287.º do CPP, quer a cominação da nulidade prevista naquele primeiro” (cfr. fls. 491). O Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 358/04 (disponível, assim como os demais adiante referidos, e m http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ) pronunciou-se expressamente no sentido de não ser inconstitucional a norma do artigo 283.º, n.º 3, alíneas a) e b) , do CPP, interpretada no sentido de ser exigível, sob pena de rejeição, que constem expressamente do requerimento para abertura de instrução apresentado pelo assistente, os elementos mencionados nessas alíneas. Na mesma linha, e relativamente a um caso paralelo ao dos presente autos, afirmou-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 389/05: «(…) 5. (…) no presente processo o requerimento apresentado pelo assistente não contém os factos cuja prática gera responsabilidade criminal, ou seja, o requerimento não contém a menção, ainda que imprecisa, dos fundamentos da responsabilidade criminal do arguido. Desse modo, o requerimento apresentado não permite a delimitação, em termos minimamente adequados e inteligíveis, do objeto da instrução cuja abertura foi requerida. […] No presente caso, a peça processual apresentada não tem, como se referiu, a virtualidade de desempenhar a função que legalmente lhe é atribuída (possibilitar a abertura da instrução, fixando o respetivo objeto). Trata‑se, nessa medida, de um requerimento “inepto”. Qualquer convite que fosse formulado traduzir‑se‑ia na concessão da possibilidade de repetição do ato (não seria, portanto, confundível com um mero convite para aperfeiçoamento de ato anterior). Assim sendo, é manifesto que nenhum preceito constitucional (ou de outra natureza) impõe a possibilidade de o assistente praticar de novo um ato que já praticou no respetivo prazo de modo absolutamente inadequado. O requerimento apresentado é pois um requerimento “não aperfeiçoável”. 6. Cabe ainda realçar que a representação do assistente por advogado (artigo 70.º do Código de Processo Penal) visa garantir uma utilização tecnicamente adequada dos mecanismos processuais por esse sujeito. Na verdade, o direito de acesso à Justiça no contexto destes autos concretiza‑se na consagração do direito a requerer a abertura da instrução. Uma vez que é representado por advogado, o assistente dispõe das condições
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