TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

668 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL os Direitos Civis e Políticos (PIDCP), bem como o artigo 6.º, n.º 3, alíneas b) , c) , d) e e) da Convenção Euro- peia dos Direitos do Homem (CEDH) (cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, fls. 87 dos autos). O Tribunal da Relação do Porto limita-se, desta forma, a afirmar que um determinado resultado inter- pretativo, obtido após um percurso argumentativo, seria inconstitucional, pelo que não o aplica. O Tribu- nal começa por discorrer sobre o enquadramento constitucional e de Direito Internacional da situação em presença, para depois se debruçar sobre os preceitos aplicáveis de direito ordinário. No termo do raciocínio interpretativo, o Tribunal conclui que existem duas interpretações possíveis do complexo normativo em causa: uma primeira, que considera «formal» e uma alternativa, decorrente de «uma leitura jusfundamen- tal dos seus direitos» (cfr. o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, fl. 86, verso, dos autos). Face a esta dicotomia, o Tribunal opta por aplicar a segunda interpretação possível. Trata-se de um raciocínio típico de interpretação da lei conforme à Constituição e não de desaplicação de norma desconforme com a Consti- tuição. Os preceitos em causa não são desaplicados – o que é afastada, por inconstitucional, é uma leitura possível desses preceitos. 8. Refira-se, aliás, que o Ministério Público concorda com a desnecessidade de desaplicação da “norma” em causa para obter o resultado normativo aplicado pelo acórdão recorrido («Naturalmente que à Relação do Porto poderia eventualmente bastar interpretar o direito ordinário – no caso, os preceitos do Código de Processo Penal –, à luz dos princípios constitucionais para concluir pela não sanação de nulidade», cfr. alega- ções de recurso, fls. 107 dos autos; cfr. também fls. 117 dos autos, 2.º) e que a argumentação expendida em defesa do caráter de desaplicação do acórdão recorrido (cfr. fls. 116-117 dos autos) não foi de molde a afastar a convicção de que se trata de uma mera interpretação conforme à Constituição e a demonstrar a existência de desaplicação. 9. No contexto de semelhante decisão não pode considerar-se que esteja aberta a via de recurso para o Tribunal Constitucional que a alínea a) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição e alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC preveem. Com efeito, uma decisão com estas características não é uma recusa de aplicação de norma com fun- damento em inconstitucionalidade; é, antes, uma decisão de aplicação de um complexo normativo em sen- tido conforme com a Constituição, da qual, como é evidente, não cabe qualquer recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos da Constituição e da LTC. Tanto basta para que, no caso, se não possa conhecer do objeto de recurso. III – Decisão 10. Termos em que se decide não conhecer do objeto do recurso. Lisboa, 20 de março de 2013. – Maria de Fátima Mata-Mouros – José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Maria João Antunes – Joaquim de Sousa Ribeiro (vencido, pois entendo que – abstraindo das vias possíveis da boa solução do caso, quer no plano infraconstitucional, quer na interpretação conforme à Con- stituição – o que o acórdão recorrido efectivamente fez foi uma recusa da aplicação do “bloco legal” consti- tuído pelos aplicados artigos do Código de Processo Penal.)

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