TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
662 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Atentas estas considerações, é mister recuperar as soluções doutrinal e jurisprudencialmente avançadas para a questão vertente, que passa, recorde-se, por perceber se a criação e a disciplina das contribuições pode ser levada a cabo pelo Governo através de decreto-lei simples mesmo antes de aprovado o regime geral a que se refere o artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da CRP. Verdadeiramente, não basta apurar se os elementos especificados na LCE são mais ou menos porme- norizados que os constantes de um eventual regime geral das “demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas” (cfr. a argumentação constante do Acórdão n.º 613/08, já referido), visto que tal maior “pormenor” não colmata a ausência de um regime harmonizador e dador de coerência, como se presume que seja um regime daquele tipo. Certo é também, porém, que a solução – de criação doutrinal – que pugna pela recondução das contribui- ções financeiras ao regime jurídico dos impostos paralisaria e bloquearia “a autonomia da ação governamental num domínio que afinal lhe é próprio”. Este argumento adquire validade acrescida quando em causa estejam, como é o caso, tributos que assumem uma função reguladora – entendida esta enquanto tarefa dos poderes públicos que visa garantir o funcionamento eficiente e socialmente responsável dos setores ligados aos serviços de interesse económico geral – codeterminada pelo direito europeu [neste sentido, Cardoso da Costa, Sobre o princípio da legalidade das “taxas” (e das “demais contribuições financeiras”), cit., pp. 803-804]. Está em causa um tributo que – mesmo de forma mitigada, como vimos – ainda se rege pelo princípio da equivalência, ou seja, ao qual não é aplicável o princípio da capacidade contributiva subjacente aos impos- tos (Sérgio Vasques, Manual de Direito Fiscal, cit., p. 244). Assim sendo, a solução passa por ponderar o risco de paralisação da atividade do Governo, por um lado, com o risco de proliferação, não controlada pelo Parlamento, de tributos híbridos ou de sinalagmaticidade imperfeita, por outro. Dessa ponderação deflui que as contribuições financeiras devem ser criadas por lei do Parlamento, exigindo-se que a este nível estejam já suficientemente recortados alguns dos seus elementos essenciais – o que, in casu , efetivamente sucede. Neste sentido, há que concluir que, tendo a taxa pela utilização do espectro radioelétrico sido criada mediante lei formal, a densificação, pelo Governo, através de Decreto-Lei simples e/ou de Portaria, de alguns dos seus elementos essenciais não consubstancia uma violação da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP. III – Decisão 8. Atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide: a) Não julgar conjugado com o respectivo anexo inconstitucional o n.º 7 da Portaria n.º 126-A/2005, de 31 de janeiro, por violação da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP; b) Por conseguinte, conceder provimento ao recurso. Sem custas. Lisboa, 20 de março de 2013. – José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Joaquim de Sousa Ribeiro. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 14 de maio de 2013. 2 – Os Acórdãos n. os 1140/96 , 558/98, 63/99, 369/99, 22/00 e 227/01 estão publicados em Acórdãos , 35.º, 40.º, 42.º, 44.º, 46.º e 50.º Vols., respetivamente. 3 – Os Acórdãos n. o s 20/03 e 204/03 estão publicados em Acórdãos , 55.º Vol.. 4 – Os Acórdãos n. os 437/03 , 127/04 , 68/07, 365/08 e 410/10 estão publicados em Acórdãos , 57.º, 58.º, 67.º, 72.º e 79.º Vols., respetivamente.
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