TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

66 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL n.º 280/2001, de 23 de outubro). As «funções» em causa correspondem ao “conjunto autónomo de tarefas, competências, deveres e responsabilidades profissionais dos marítimos, que podem corresponder à respetiva categoria ou a categoria diferente ou constar de dispositivos legais em vigor” (assim, o artigo 2.º, n.º 2, do mesmo diploma). E “a inscrição marítima é requerida aos órgãos locais do Sistema de Autoridade Marítima (SAM) competentes, devendo o requerente indicar os elementos a integrar no registo, devidamente compro- vados por documento” (vide artigo 4.°, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 280/2001). Ser «inscrito marítimo» é uma condição necessária do exercício da atividade profissional de marítimo, porquanto, nos termos do artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 280/2001, de 23 de outubro, “só podem exer- cer a atividade profissional dos marítimos os inscritos marítimos habilitados com as respetivas qualificações profissionais e detentores dos respetivos certificados”. A norma impugnada, constante do n.º 2 do artigo 4.º do referido diploma, procede, por sua vez, à deli- mitação do universo dos sujeitos a quem é reconhecida a faculdade de requerer a inscrição marítima ao dispor que “podem requerer a inscrição marítima os indivíduos maiores de 16 anos de nacionalidade portuguesa ou de um país membro da União Europeia, sem prejuízo do disposto em convenções ou em outros instrumentos internacionais em vigor no ordenamento jurídico nacional”. Deste preceito resulta, assim, que, ressalvado o cír- culo dos nacionais dos Estados membros da União Europeia, bem como os casos eventualmente abrangidos por convenções ou outros instrumentos internacionais em vigor no ordenamento jurídico português, a faculdade de solicitar a inscrição marítima − e, consequentemente, de reunir os requisitos necessários para aceder ao exercício da atividade profissional dos marítimos – se encontra reservada a cidadãos portugueses. 6. Tal norma não constitui uma disposição original no ordenamento jurídico português. Com efeito, um regime semelhante constava já do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 104/89, de 6 de abril – diploma entretanto revogado expressamente pelo artigo 86.º do Decreto-Lei n.º 280/2001, de 23 de outubro. Aquele diploma veio proceder, de acordo com o respetivo preâmbulo, à “regulamentação da ins- crição marítima”, contemplando “a reestruturação das profissões relativas à tripulação e operação dos navios de comércio e pesca” através da valorização da “capacidade profissional”, surgindo esta como “condição básica de acesso entre categorias profissionais”. O citado preceito estatuía que a inscrição marítima apenas poderia ser requerida por “indivíduos maiores de 16 anos, de nacionalidade portuguesa, com salvaguarda das obrigações resultantes da adesão de Portugal às Comunidades Europeias e de convenções internacionais celebradas entre Portugal e outros Estados”. E já esta disciplina do diploma de 1989 também não era integralmente nova. Na verdade, anteriormente as normas reguladoras da atividade profissional dos marítimos constavam do «Regulamento da Inscrição Marítima, Matrícula e Lotações dos Navios da Marinha Marcante e da Pesca», aprovado pelo Decreto n.º 45 969, de 15 de outubro de 1964, em execução do disposto no artigo 49.º do Decreto-Lei n.º 45 968, também de 15 de outubro de 1964. Completando o regime geral então definido nos artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 45 968, o mencionado Regulamento, depois de condicionar o acesso à condição de marítimo à “inscrição marítima” (cfr. o artigo 1.º), veio regular este ato no título II, estabelecendo para o mesmo determinados requisitos, entre os quais, ainda que de forma indireta, o relativo à nacionalidade. Assim, nos termos do artigo 8.º do referido Regulamento, a realização da inscrição marí- tima tinha como pressuposto a apresentação, junto da autoridade marítima competente, de um conjunto de documentos que incluíam, de acordo com a respetiva alínea b) , “a certidão de idade, de teor, comprovando ser cidadão português”. Uma vez que, de acordo com esta norma, o requerimento para a inscrição marítima deveria ser obrigatoriamente instruído com documento comprovativo da nacionalidade portuguesa, torna-se claro que, também sob regime jurídico resultante do Decreto-Lei n.º 45 968 e sua regulamentação, o acesso à atividade de marítimo se encontrava vedado a estrangeiros: requerendo a inscrição marítima a comprova- ção documental de nacionalidade portuguesa, e sendo essa inscrição uma condição do exercício da atividade profissional de marítimo, é incontroversa a conclusão de que os nacionais de outros Estados se encontravam privados do direito de aceder a essa profissão.

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