TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

624 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: 1. Por sentença do Juízo de Família e Menores da Comarca da Grande Lisboa – Noroeste, foi atribuído a  A., recorrida nos presentes autos em que é recorrente B., o direito ao arrendamento da “casa morada da família”, bem próprio do segundo, cuja utilização tinha sido atribuída à requerente no acordo de divórcio por mútuo consentimento. O ora recorrente impugnou esta decisão invocando, designadamente, a inconsti- tucionalidade do artigo 1793.º do Código Civil «na parte em que possibilita ao juiz decretar a constituição de uma relação arrendatícia, a favor de um dos cônjuges, quando a casa de morada de família seja um bem próprio do outro cônjuge, desde que essa constituição seja contra a vontade deste» (fls. 235), por violação do artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) nas dimensões do direito de propriedade enquanto direito de uso e fruição.  O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 3 de novembro de 2011 (fls. 257 e seguintes), confir- mou a decisão recorrida, apenas alterando o montante da renda mensal para 420 euros. Quanto ao problema de constitucionalidade invocado pelo recorrente, disse o seguinte: «(…) Na 2.ª conclusão da alegação de recurso, o apelante levanta a questão da inconstitucionalidade do n.º 1 do artigo 1793.º do CC – por violação do artigo 62.º da CRP – na parte em que possibilita ao juiz decretar a consti- tuição de uma relação arrendatícia, a favor de um dos cônjuges, quando a casa de morada de família seja um bem próprio do outro cônjuge, desde que essa constituição seja contra a vontade deste, na medida em que tolhe o direito de propriedade, nas suas dimensões de direito de uso e fruição. Salvo melhor entendimento, não assiste razão ao apelante. Dispõe o artigo 1793.º n.º I do Cód. Civil que pode o tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada de família, quer essa seja comum quer própria do outro, considerando, nomeada- mente, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal. Por seu turno, preceitua o artigo 62.º n.º 1 da Lei Fundamental que a todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição. Dispondo o artigo 65.º n.º 1 do mesmo diploma legal que todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar. Sendo que a família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros – cfr. artigo 67.º n.º 1 da citada lei Fundamental. Em anotação ao artigo 1793.º do Cód, Civil, referem Pires de Lima e Antunes Varela, na citada obra, que “(…) É, todavia, uma das normas integradoras do sistema global arquitectado pela Reforma de 1977 para protecção da habitação da família, um pouco na sequência do pensamento programático da acção do Estado delineado nos artigos 65.º e 67.º da Constituição da República (…)”. Tais normas constitucionais – inseridas nos direitos e deveres económicos, sociais e culturais – são de natureza programática por serem de aplicação diferida e mediata. constitucionais, designadamente os decorrentes do princípio da proporcionalidade, devam intervir no escrutínio da conformidade à Constituição de específicos sentidos normativos com que o preceito seja aplicado, tal não caberia na competência deste Tribunal.

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