TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

586 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pena de, a assim se entender, se alargar o âmbito da reação penal de forma desmesurada e a fortiori quando se trate de levantar ou puxar de camisola para espreitar dos seios, mero agarrão ou sua tentativa! J. Mais que a própria liberdade de autodeterminação sexual aquilo que estará em causa é a liberdade de ação ou omissão das vítimas, traduzindo-se num crime de perigo concreto não se vislumbrando ameaça a tais bens jurídicos nem o constrangimento e a concretização inequivocamente especificante dos contactos de natureza sexual, uma vez que querendo abandonar o local o fizeram sem problema e esforço! K. Alega-se a questão da inconstitucionalidade derivada da preocupação que parece radicar em tal preceito legal de confundir necessidade de intervenção do Direito Penal de ultima ratio com moral e bons costumes, enten- dendo-se que os factos descritos na douta acusação (e a fortiori os dados como provados!) não atingem o pata- mar mínimo de dignidade penal a justificar a entrada no terreno de jogo do Direito Penal; L. Conjuntamente com tal crime foi criada a figura do contacto sexual, havendo que procurar desmistificar tal figura e conceito que não será sinónimo de ato sexual (presunção vertida no n.º 3 do artigo 9.º CC), signifi- cando aquele, “estado relativo, situação de dois ou mais corpos que se tocam”, indicando assim contiguidade e toque, só isso justificando que o artigo 171.º n.º 3 nas suas duas alíneas consagre na alínea a) a previsão do artigo 170.º e na b) a conversa, escrito, etc., a significar que o contacto sexual não engloba escritos e conversas de cariz sexual (elementos literal e sistemático) sendo perfeitamente inócua e sem qualquer importância a con- versa tida com as menores do “fazer coisa e tal”; M. Temos assim que a fórmula ato sexual será mais abrangente por não se restringir ao toque, pelo que, não havendo contacto não haverá crime de importunação sexual, o que in casu , nos termos do depoimento da testemunha D. apenas pudesse haver um único crime, sendo certo que ao não se especificar sobre quem e que parte do corpo recaiu não se possa dar por provado tal requisito e tenha o arguido de ser absolvido, conclusão idêntica à da não punibilidade da tentativa. N. Como afirma Roxin, não sendo a conceção do bem jurídico estática, esta deve sempre conformar-se com os fins das normas constitucionais, as quais estão abertas às mutações sociais e aos progressos do conhecimento científico, indo os mesmos no sentido de uma maior abertura, tendo de presidir in casu um certo dolo espe- cifico e toda uma multiplicidade de elementos objetivos (constrangimento e contacto de natureza sexual), não se podendo tomar como limite a questão da moralidade sexual mas sim averiguar se tais factos têm em si a relevância exigível do ponto de vista criminal a justificar a sua tipificação como crime ou consubstanciam unicamente atuação menos correta, cortês, delicada e moral; O. Entende-se que os factos não atingem o minus de relevância penal a ponto de exigir a intervenção de tal ramo do Direito, sendo a douta sentença clara ao afirmar que não resultaram provadas quaisquer consequências para as ofendidas (confirmada no tocante à menor B. pelo depoimento da sua mãe C. na passagem 12:34 a 12:46), tendo assim de ficar de fora os atos bagatelares ou considerados insignificantes bem como todos aqueles que, ainda que de algum significado e impróprios, atenta a sua instantaneidade, ocasionalidade e reduzida ocorrên- cia não sejam obstáculo de forma significativa à livre determinação sexual da vítima; P. E todos os preceitos constitucionais integram normas que fornecem os parâmetros de interpretação reta do Direito que lhe está infra ordenado, devendo assim lançar-se mão do princípio da interpretação conforme a Constituição da República Portuguesa, não sendo a progressividade mais do que a densificação do conceito de justiça proveniente da igualdade material, principio base de todo o Direito, pressupondo uni conceito de democraticidade; a lei penal é igual para todos; Q. E ternos assim por violados os princípios da igualdade (que consiste em tratar de forma igual o igual e de forma diferenciada o desigual), proporcionalidade bem como do caráter de ultima ratio do Direito Penal que assim se vê convocado quando a litigiosidade e danosidade material se mostra secundária e a justiça restauradora uma realidade ao alcance, dado que com o caráter subsidiário e fragmentário do Direito Penal importa conjugar um outro princípio fundamental – o da proporcionalidade – a significar a exigência de razoabilidade na proporção da necessidade de tutelar um bem fundamental, sendo certo que a intervenção do Direito Penal, por força das sanções jurídicas que lhe são características, colide com o direito de liberdade, direito fundamental do cidadão,

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