TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
579 acórdão n.º 104/13 seu anexo I. E, se a conta é impugnada com fundamento na inconstitucionalidade de algum dos critérios normativos que presidem à sua elaboração, deve considerar-se suscitada uma questão de inconstitucionali- dade normativa que o tribunal competente para a decisão da impugnação tem de decidir no exercício do seu poder-dever de não aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consigna- dos (cfr. o artigo 204.º da Constituição). Tais questões dessa natureza, uma vez suscitadas – ou mesmo independentemente da sua suscitação – integram sempre os poderes de cognição do tribunal, em termos de, no caso de ter havido suscitação pelas partes, a decisão do caso proferida pelo tribunal implicar um juízo positivo ou negativo de inconstitucio- nalidade, ainda que implícito. Aliás, por isso mesmo, é que a Constituição se basta com a suscitação da inconstitucionalidade de norma aplicada num dado caso concreto para abrir a via recursória para o Tribunal Constitucional [cfr. o artigo 280.º, n.º 1, alínea b) , da Constituição]. 7. No despacho recorrido refere-se que a norma legal sindicada no presente recurso foi aplicada na ela- boração da conta por anterior determinação judicial, já que, segundo a informação prestada pela contadora a fls. 108, nos termos do artigo 61.º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais, “a elaboração da conta foi efetuada de harmonia com a sentença de fls. 80 a 86 «Custas pela recorrente, nos termos do artigo 446.º, n.º 1, do CPC, atendendo-se para esse efeito, ao valor da ação principal nos termos do artigo 6.º, n.º 1, alínea o) , do CCJ»”. Implicitamente o tribunal recorrido invoca a força de caso julgado formal da parte do dispositivo da aludida sentença quanto à condenação em custas para indeferir a reclamação da conta oportunamente apresentada e não apreciar a questão de inconstitucionalidade nela suscitada. Todavia, sem razão. Em primeiro lugar, porque ordenar a elaboração da conta de harmonia com a lei aplicável – sendo para o efeito irrelevante se a referência à lei é genérica ou, como sucedeu no caso vertente, individualizada – não significa aplicar tal lei: como referido, a decisão sobre custas – ou seja, a definição da responsabilidade pelas custas, para que é competente o juiz da causa e que se encontra, no essencial, disciplinada no artigo 446.º e seguintes do Código de Processo Civil – não se confunde com o ato de contagem – a elaboração da conta propriamente dita, que é da competência dos funcionários judiciais e segue a disciplina própria contida no Código das Custas Judiciais. Ora, somente na elaboração da conta é que o contador – e não o juiz – procede à aplicação dos critérios normativos a que deve obedecer o ato de contagem, e, entre eles, também o critério previsto no artigo 6.º, n.º 1, alínea o) , do citado Código. Deste modo, a referência no dispositivo da sentença de fls. 80 e seguintes ao modo como deve ser apurado o valor da causa para efeito de custas – a ordem dada ao contador para no ato de contagem atender a uma dada interpretação de certo preceito legal aplicável –, não tem por objeto nem a relação material controvertida nem a própria relação processual, mas apenas a relação funcional com o contador. Como tal, não é suscetível de adquirir força de caso julgado formal (cfr. os artigos 671.º e 672.º, ambos do Código de Processo Civil). Acresce, em segundo lugar, que a questão da inconstitucionalidade do artigo 6.º, n.º 1, alínea o) , do Código das Custas Judiciais é uma questão de direito que foi suscitada na reclamação da conta deduzida a fls. 98 e seguintes dos autos, e que a aplicação de tal preceito é necessária para a elaboração da conta em apreço. Con- sequentemente, em virtude do aludido poder-dever estatuído no artigo 204.º da Constituição, não podia o juiz abster-se de decidir sobre ela. Aliás, o não conhecimento expresso de tal questão corresponde a um juízo implí- cito de não inconstitucionalidade do artigo 6.º, n.º 1, alínea o) , do Código das Custas Judiciais, que abre a via de recurso para o Tribunal Constitucional. Com efeito, se no ato de contagem foi aplicado o mencionado artigo 6.º, n.º 1, alínea o) , o indeferimento da reclamação de tal ato, fundada na inconstitucionalidade desse preceito, e a consequente confirmação do mesmo ato, corresponde a uma «decisão que aplica norma cuja inconstitucio- nalidade foi suscitada durante o processo» e, simultaneamente, desde que se verifique o pressuposto específico, uma «decisão que aplica norma anteriormente julgada inconstitucional pelo próprio Tribunal Constitucional» [cfr. o artigo 280.º, n. os 1, alínea b) , e 5, da Constituição e o artigo 70.º, n.º 1, alíneas b) e g) , da LTC]. Finalmente, é incontroverso que a aplicação implícita pelo tribunal recorrido de norma anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional é relevante para efeitos do disposto na alínea g) do artigo 70.º, n.º 1, da LTC. Nesse sentido, refere Lopes do Rego:
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