TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

548 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL No primeiro dos arestos acima referidos escreveu-se sobre esta dimensão do princípio do acusatório: «Ao consagrar o n.º 5 do artigo 32.º da Constituição uma tal garantia – a garantia do processo criminal de tipo acusatório –, o que, pois, a lei fundamental pretende assegurar é que a entidade que julga (o juiz) não tenha funções de investigação e acusação: esta última tarefa há de ser levada a efeito por uma outra entidade (em regra, o Ministé- rio Público); e, no julgamento do feito penal, há de o juiz mover-se dentro dos limites postos pela acusação. Com isto, como decorre do que atrás se disse, pretende a Constituição que os arguidos, que hajam de ser submetidos a julgamento, acusados da prática de uma infração criminal, tenham um julgamento independente e imparcial, que é, justamente, o que também se lhes garante no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aprovada pela Lei n.º 65/78, de 13 de outubro (…)». No Acórdão n.º 423/00, salientou-se que era entendimento reiterado do Tribunal Constitucional nesta matéria que “um juízo de inconstitucionalidade da norma que permita a intervenção no julgamento do juiz que participou numa fase anterior, por violação do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, pressupõe que as intervenções do juiz – pela sua frequência, intensidade ou relevância – sejam aptas a razoavelmente permitir que se formule uma dúvida séria sobre as condições de isenção e imparcialidade desse mesmo juiz ou a gerar uma desconfiança geral sobre essa mesma imparcialidade e independência”. Na verdade, o Tribunal Constitucional tem mantido, a propósito desta questão, uma linha orientadora no sentido de que o critério da admissibilidade da intervenção no julgamento de juiz que tenha tido inter- venção anterior no processo passa pela distinção entre intervenções que pela sua frequência, intensidade ou relevância, sejam aptas a razoavelmente permitir que se formule um dúvida séria sobre as condições de isenção e imparcialidade desse mesmo juiz ou a gerar uma desconfiança geral sobre essa mesma imparcialidade e inde- pendência e intervenções pontuais ou isoladas. Só no primeiro caso a estrutura acusatória do processo veda a participação do juiz no julgamento. Já a prática de atos isolados durante o inquérito não constitui, em prin- cípio, causa de quebra objetiva da imparcialidade do juiz, determinante do seu impedimento no julgamento. E sobre o que, neste âmbito, deverá entender-se por imparcialidade dos tribunais, escreve-se o seguinte no citado Acórdão n.º 129/07: «[…] a imparcialidade dos tribunais é uma exigência não apenas contida no artigo 32.º da Constituição, mas uma decorrência do Estado de direito democrático (artigo 2.º), na medida em que se inscreve na garantia universal de defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, através de um órgão de soberania com competência para administrar a justiça (artigo 202.º n.º 1 Constituição). Ora, neste dever genérico de imparcialidade do tribunal inclui-se uma exigência de não suspeição subjetiva do juiz; a atividade do juiz não pode apresentar-se contaminada por circunstâncias geradoras de desconfiança quanto à sua imparcialidade. Todavia, do citado artigo 32.º retira-se, para além disto, uma exigência de imparcialidade objetiva do tribunal, decorrente da estrutura acusatória do processo penal, circunstância que impede que o juiz do julgamento esteja envolvido na atividade instrutória, quer carreando para os autos elementos de prova suscetíveis de serem utili- zados pela acusação, quer envolvendo-se em atos que possam significar dirigir a investigação. Esta exigência de imparcialidade objetiva do juiz, justifica-se do ponto de vista das garantias da defesa, é certo, mas igualmente pela necessidade de proporcionar ao juiz as condições de isenção requeridas pelo exercício das suas funções. Assim se explica que seja confiado ao próprio juiz o dever de se declarar impedido, a par de se permitir aos restantes sujeitos processuais a iniciativa de suscitar no processo o reconhecimento do impedimento do juiz (artigo 41.º do Código de Processo Penal).» Regressando ao caso dos autos, importa salientar que, como é facilmente percetível, a questão não é idêntica às que foram objeto dos arestos citados. No caso em apreço não se está perante uma situação em que se coloque a questão da admissibilidade de intervenção no julgamento de juiz que tenha tido intervenção em fases anteriores do processo. Trata-se, sim, de saber se o reconhecimento ao juiz de julgamento da competência

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