TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
546 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL traduz-se necessariamente numa violação expressa da delimitação funcional dos diversos tribunais criminais e, por consequência, do princípio da estrutura acusatória do processo penal português consagrada no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição. Neste mesmo sentido, o arguido D. defende que a delimitação do âmbito da competência funcional dos diversos tribunais criminais assume-se, precisamente, como uma concretização, no plano da lei ordinária, da estrutura acusatória do processo, em obediência ao princípio plasmado no referido artigo 32.º, n.º 5, da Constituição. Assim, segundo este recorrente, estando em causa a ponderação acerca da validade ou invalidade de um vastissimo conjunto de atos praticados pelo juiz de instrução do 1.º juízo do TIC de Lisboa em fase de inquérito, entre os quais se contam, inclusivamente, a aplicação da medida de coação de prisão preventiva a vários dos arguidos ora submetidos a julgamento, não se vê como o Tribunal de julgamento, sem ofensa das regras de competência funcional – artigos 17.º, in fine , 33.º, n.º 1, 268.º e 269.º, todos do CPP – e do princípio consagrado no artigo 32.º, n.º 5, da Constituição, possa conhecer, apreciar e decidir tais questões. Acrescenta ainda que o reconhecimento de competência para tal ao tribunal de julgamento importa a violação das garantias de isenção, imparcialidade e independência do tribunal de julgamento, pois o juiz do julgamento, ao apreciar a validade ou invalidade daqueles atos, abordando a nulidade que aí foi conhecida e declarada, numa lógica de anulação ou de aproveitamento dos atos em causa, tem intervenção em fase anterior do processo, isto é, na fase de inquérito, estando implicado na definição do objeto do processo, não havendo assim a separação entre o juiz que controla a acusação e o juiz de julgamento, que é imposta pelo princípio do acusatório. O arguido H. sustenta ainda que a interpretação normativa questionada, ao conferir competência ao Tribunal de julgamento para cumprir o acórdão proferido em 17 de janeiro de 2004 pelo Tribunal da Rela- ção de Lisboa, extravasando e anulando a delimitação da competência funcional dos tribunais criminais contidas naquelas normas, é inconstitucional, por violação do artigo 211.º, n. os 1 e 2, da Constituição. Vejamos se lhes assiste razão, começando por analisar o teor das normas cuja interpretação normativa é questionada. Assim, os artigos 14.º e 17.º do Código de Processo Penal, estabelecem a competência do tribunal coletivo e do juiz de instrução, respetivamente, dispondo o último destes preceitos (na redação anterior à introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, que foi a aplicada pela decisão recorrida), sob a epígrafe «Competência do juiz de instrução»: «Compete ao juiz de instrução proceder à instrução, decidir quanto à pronúncia e exercer as funções jurisdicio- nais relativas ao inquérito, nos termos prescritos neste Código.» Por sua vez, o artigo 33.º do Código de Processo Penal, cuja redação se manteve inalterada com a entrada em vigor da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, dispõe o seguinte: «Efeitos da declaração de incompetência 1 – Declarada a incompetência do tribunal, o processo é remetido para o tribunal competente, o qual anula os atos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo e ordena a repetição dos atos necessários para conhecer da causa. 2 – O tribunal declarado incompetente pratica os atos processuais urgentes. 3 – As medidas de coação ou de garantia patrimonial ordenadas pelo tribunal declarado incompetente con- servam eficácia mesmo após a declaração de incompetência, mas devem, no mais breve prazo, ser convalidadas ou infirmadas pelo tribunal competente. 4 – […]»
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