TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
538 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O assistente é um sujeito processual cuja posição merece tutela constitucional nos termos do artigo 32.º, n.º 7, da Constituição, uma vez que é titular dos interesses jurídico-criminais que a lei quis especialmente proteger com a incriminação, tendo especial interesse em ver exercida em termos adequados a ação penal, precisamente para defesa daqueles seus interesses. Sendo claro que não se pode falar da existência de uma equiparação entre a tutela processual do arguido e a do assistente (desde logo, é a própria Constituição que confere a cada um deles uma tutela distinta e, como é natural, atribui maior relevância à tutela dos direitos de defesa do arguido), o legislador ordinário conferiu a este último uma posição processual de colaborador do Ministério Público, a cuja atividade subordina, em regra, a sua intervenção no processo, salvas as exceções da lei (artigo 69.º do Código de Processo Penal). Ou seja, o assistente tem o estatuto de um verdadeiro sujeito processual, identificado, em geral, com o titular do interesse que a lei penal quis proteger com a incriminação, e a quem a lei confere competên- cias próprias, enumeradas no artigo 69.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, entre as quais se inclui, em determinados casos, a possibilidade de agir independentemente ou até mesmo em sentido oposto ao do Ministério Público (Para maiores desenvolvimentos sobre o conceito e estatuto do assistente, cfr. Figueiredo Dias, “Sobre os sujeitos processuais no novo Código de Processo Penal”, in Jornadas de Direito Processual Penal – O novo Código de Processo Penal, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 9 e segs., Damião da Cunha, “Algu- mas reflexões sobre o estatuto do assistente e seu representante no Direito Processual Penal Português”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal , Ano 5, 2.º, Abril-Junho 1995, pp. 153 e segs., e “A participação dos particulares no exercício da ação penal (alguns aspetos)”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 8, 4.º, Outubro-Dezembro 1998, pp. 627 e segs.) Este estatuto conferido ao assistente tem sido reiteradamente reconhecido pelo Tribunal Constitucional. Escreveu-se no Acórdão n.º 690/98 deste Tribunal (acessível e m www.tribunalconstitucional.pt ) : «(…) o assistente surge como um verdadeiro sujeito processual, com atribuições próprias, permitindo-lhe a lei, pelo menos em determinadas situações, agir sozinho ou até contra o Ministério Público [cfr., por ex., artigos 69.º, n.º 2, 287.º, n.º 1, alínea b) , e 401.º, n.º 1, alínea b) , do CPP]. Ainda que com limites, é certo, os assistentes, pelo menos nessa medida, não subordinam totalmente a sua atuação à do Ministério Público (…)». Neste mesmo sentido, se pronunciou também o Acórdão n.º 338/06: «A constituição de assistente, com o rol de poderes que lhe estão atribuídos, concretizando o direito do ofen- dido de intervir no processo, insere-se numa funcionalidade público-processual, qual seja a de poder tornar possí- vel um melhor e mais eficaz exercício da ação penal, por banda do Ministério Público, a quem o respetivo poder está constitucionalmente conferido (artigo 219.º, n.º 1, da Constituição), por ser de admitir que o titular dos interesses jurídico-criminais, que a lei quis especialmente proteger com a incriminação, tenha especial interesse em ver exercida em termos adequados a ação penal, precisamente em abono da defesa daqueles seus interesses, e possa, também, ser possuidor de relevantes conhecimentos de facto e de direito que possam mostrar-se pertinentes a tal melhor exercício.» O assistente está legitimado a intervir como verdadeiro sujeito em todo o procedimento criminal, mesmo que numa posição de colaborador do Ministério Público, pelo que, tendo sido consagrada a solu- ção de apenas ser possível a leitura em audiência de declarações anteriormente prestadas quando exista um consenso nesse sentido de todos os titulares de interesses jurídicos reconhecidos no processo penal, a parti- cipação do assistente nesse consenso seja imprescindível. A conformidade constitucional da solução adotada estende-se, por isso, à necessidade do acordo do assistente à leitura, pedida por um arguido, de declarações produzidas, em inquérito, por assistentes e testemunhas. Pelas razões expostas, impõe-se concluir que a interpretação normativa objeto de fiscalização não viola o disposto nos artigos 32.º, n.º 1, e 20.º, n.º 4, da Constituição, nem se vislumbra que ofenda qualquer outro
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