TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

51 acórdão n.º 86/13 10.3 As normas aqui questionadas – artigos 1.º, n.º 2, 3.º, alínea d) , e 18.º da Lei n.º 22/2012 – deter- minam, na parte mais relevante, a obrigatoriedade da reorganização administrativa do território das freguesias­ [artigo 1.º, n.º 2, primeira parte, e alínea d) do artigo 3.º]; estabelecem a aplicação da Lei n.º 22/2012 a todo o território nacional (n.º 1 do artigo 18.º); e determinam que as pronúncias e os projetos previstos nos cita- dos artigos 11.º e 15.º sejam entregues às respetivas assembleias legislativas regionais (n.º 2 do artigo 18.º). Considerando o parâmetro constitucional invocado, o que se questiona é a admissibilidade de uma lei do Estado determinar uma obrigatoriedade de reorganização administrativa do território das freguesias situadas nas regiões autónomas, sendo certo que essa reorganização está balizada pela necessidade de cumprir determinados parâmetros de agregação (elencados no artigo 6.º), que resultam parcialmente de uma classi- ficação dos municípios em três níveis e de uma lista de lugares urbanos por município, já pré-determinadas na Lei n.º 22/2012. Ao assim dispor, a Lei n.º 22/2012, enquanto “lei de enquadramento”, vai além das suas antecessoras, na medida em que obriga à reorganização administrativa do território das freguesias e define os parâmetros de agregação que devem ser alcançados, através de uma redução global do número de freguesias, bem como o procedimento e os prazos a que essa reorganização deve obedecer. No entanto, mesmo tendo isso em conta, daí não resulta qualquer ofensa para o poder autonómico reconhecido na alínea l) do n.º 1 artigo 227.º da CRP, poder apenas exercitável “nos termos da lei” – justa- mente, neste caso, a Lei n.º 22/2012, de onde constam as normas impugnadas. E não se vê que estas normas, ao fixarem a referida obrigatoriedade de reorganização, bem como a necessidade de cumprir certos parâme- tros de agregação, invadam a esfera de competência própria das regiões autónomas, pois dessas normas não é inferível a obrigatoriedade de, em concreto, extinguir ou modificar esta ou aquela freguesia. O regime geral previamente estabelecido não põe em causa a competência do órgão legislativo da região autónoma para, por ato próprio, criar, extinguir ou modificar o território de uma concreta autarquia local, deixando margem de decisão, quanto ao modo de, em concreto, proceder à reorganização do território das freguesias − à seme- lhança do que acontece em todo o território nacional. É certo que o obrigatório cumprimento dos parâmetros estabelecidos na lei de enquadramento não permite liberdade de decisão quanto ao se da extinção ou modificação das freguesias. Mas, traduzindo- -se o poder conferido às regiões autónomas, pela alínea l) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, numa competência legislativa condicionada pelo disposto na lei de enquadramento, cabe ainda dentro da eficácia condicionante desta lei o estabelecimento de índices a que a organização do território das freguesias tenha que obedecer, com a consequente obrigatoriedade dos reajustamentos necessários à sua observância. Como acentuam J. J. Gomes Canotilho/ Vital Moreira ( ob. cit., p. 721), o regime geral da lei de enquadramento pode estabelecer pressupostos objetivos que vinculem os atos legislativos concretos de criação, modificação ou extinção das autarquias locais, tais como, entre outros, índices geográficos, demográficos e sociais. 10.4 A obrigatoriedade de reorganizar o território das freguesias situadas na Região Autónoma dos Aço- res, à luz dos parâmetros fixados na Lei n.º 22/2012, em paralelo com a obrigatoriedade de reorganização das freguesias localizadas no continente, não deixa de decorrer da unidade do sistema autárquico para o território nacional – mesmo que a unidade do sistema comporte especialidades decorrentes da realidade regional cuja medida não cumpre equacionar (cfr. Acórdão n.º 496/97, n.º 6). O artigo 6.º da Constituição, sob a epígrafe «Estado unitário», dispõe, no seu n.º 1, que «O Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da subsi- diariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da administração pública». Ao princípio constitucional geral da unidade do Estado são associados princípios de âmbito específico, designadamente os princípios da autonomia regional e da autonomia local, “que qualificam aquele sem o contrariarem” (como escrevem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra, 2007, p. 232). Tão importantes um quanto os outros, todos integram os limites materiais de revisão constitucional [artigo 288.º, alíneas a), in fine , n) e o) , da CRP].

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