TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
506 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de Processo Penal, interpretados no sentido de que deve ser rejeitada a impugnação da matéria de facto do recurso, sem que haja lugar a um convite ao aperfeiçoamento que, apesar de especificar os concretos pontos da matéria de facto que pretende impugnar e as concretas provas em que se funda, não faça corresponder a cada ponto da matéria de facto cada uma das concretas provas em que se funda, antes optando por reportar a cada conjunto de factos agregados um conjunto de concretas provas que a ele se reporta, numa apresentação global das concretas razões da discordância em relação a cada núcleo factual. OMinistério Público, nas suas contra-alegações, defende que o recurso não deve ser conhecido nesta parte porque foi omitido o cumprimento do dever de suscitação prévia perante o tribunal recorrido desta questão de constitucionalidade e porque o critério enunciado não corresponde ao critério seguido pela decisão recorrida, relativamente ao cumprimento do dever de especificação dos pontos da matéria de facto impugnada. Se é verdade que o recorrente não colocou previamente ao tribunal recorrido a questão de constitucio- nalidade que agora submete ao Tribunal Constitucional, admite-se que não lhe era exigível tal antecipação. Na verdade, a adoção desse comportamento implicaria a admissão de um incumprimento voluntário dos requisitos de apresentação formal de uma peça processual, antecipando desse modo um eventual juízo reprovador do tribunal nesse sentido, o que seria frontalmente contrário aos seus próprios interesses. Nestas situações, tal como este tribunal já entendeu em casos similares ( v. g. os Acórdãos n.º 605/95 e 122/00, acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt ) deve considerar-se que a parte está dispensada no cum- primento do ónus exigido pelo artigo 72.º, n.º 2, da LTC. Já quanto à apontada falta de coincidência entre o critério normativo enunciado pelo recorrente e aquele que foi adotado na decisão recorrida há que ter presente as razões que motivaram a rejeição do recurso do arguido na parte em que impugnava a decisão da matéria de facto da primeira instância. Lê-se no acórdão recorrido: “Alega o recorrente que pretende impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto quanto aos pontos 106. a 106.22., 113. a 116., 120. a 124, 125. a 127. e 131 a 135.2.. Verifica-se, porém, que o recorrente não deu cumprimento ao disposto no artigo 412.º, n. os 3 e 4, do CPP, nem nas conclusões, nem na motivação do recurso. De acordo com o n.º 3 deste preceito o recorrente ao impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto deve especificar: a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) as provas que devem ser renovadas. E o n.º 4 do mesmo artigo estabelece que, quando as provas tenham sido gravadas, as menções das als. a) e b) devem ser feitas por referência ao consignado na ata de julgamento, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação. Como se refere no Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/10/2009, proferido no âmbito do Proc. 121/07.9PBPTM.E1.S1, disponível i n www.dgsi.pt a impugnação deve ser feita ponto por ponto, não relevando uma impugnação genérica ou imprecisa dos factos. Ora, o recorrente, pese embora tenha começado por indicar os pontos de facto que pretendia impugnar, ao longo de 583 páginas tece as mais variadas considerações sobre o acórdão recorrido, refere-se a provas produzidas indiscriminadamente durante o inquérito, instrução e julgamento, sem que, contudo, faça qualquer referência aos concretos pontos de facto que está a impugnar. Ou seja, o recorrente impugna de forma genérica a matéria de facto, não especificando em relação a cada ponto de facto as razões da sua discordância. Nestes casos em que o recorrente não dá cumprimento ao ónus de impugnação especificada, nem nas conclusões, nem na motivação de recurso, não há que endereçar-lhe convite para aperfeiçoamento, pois tal equivaleria, no fundo, à concessão de novo prazo para recorrer, o que não pode considerar-se compreendido no próprio direito ao recurso.”
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