TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
49 acórdão n.º 86/13 Como escreve Mário Aroso de Almeida a propósito da Lei n.º 142/85, esta «enuncia um conjunto de requisitos de que depende a criação de novos municípios e impõe exigências a observar no procedimento de elaboração das leis que venham a determinar tal criação» (“Regime Jurídico da criação de municípios e recurso para o Tribunal Constitucional no âmbito das ações de responsabilidade do Estado por ilícito legis- lativo: a propósito do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 134/10” in Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor Jorge Miranda , Vol. II, Coimbra, 2012, p. 756). Na verdade, as leis de enquadramento ou leis-quadro não se limitam a estabelecer as bases do respe- tivo regime jurídico, mas estabelecem «os parâmetros (e por vezes os procedimentos) dos ulteriores atos de execução legislativa» (cfr. J. J. Gomes Canotilho/ Vital Moreira, ob. cit. , pp. 65-66; e, no mesmo sentido, Acórdão n.º 192/03, que se debruçou sobre a repartição de competências entre a Assembleia da República e o Governo, em matéria de reprivatizações). Por isso, o poder atribuído às Assembleias Legislativas regionais, pela alínea l) do n.º 1 do artigo 227.º, traduz-se numa competência legislativa “condicionada”, porque dependente de lei de enquadramento que dispõe sobre as condições do exercício do poder atribuído às regiões através das Assembleias Legislativas (Jorge Miranda, “A autonomia legislativa das regiões autónomas após a revisão constitucional de 2004”, in Scientia Iuridica , tomo LIV, n.º 302, abril/junho 2005, pp. 201-216, p. 205). 9.2 Além do Acórdão referido no ponto anterior (Acórdão n.º 134/10), em dois casos o Tribunal Cons- titucional se ocupou diretamente da questão da delimitação da competência reservada da Assembleia da República em matéria de criação, extinção e modificação de autarquias locais. No primeiro caso, a delimitação de competências operou também por referência à competência legisla- tiva das regiões autónomas na matéria. Pelo Acórdão n.º 496/97, foi declarado inconstitucional um conjunto de normas contidas no Decreto da Assembleia Legislativa Regional n.º 13/97, relativo à “Adaptação à Região Autónoma dos Açores da Lei n.º 8/93, de 5 de março – Regime jurídico de criação de freguesias”, aprovado pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores em 28 de maio de 1997. Lê-se neste aresto: «(…) a Assem- bleia da República não pode delegar no legislador regional toda ou parte de uma reserva de competência legislativa que é sua e só sua (ou seja, exclusiva). Se a autonomia regional implica uma conceção descentra- lizada do Estado, como é a que está presente na Constituição, e, em certo sentido, há aí uma policracia ou pluralidade de centros de poder, a verdade é que esse quadro não briga com uma reserva absoluta de compe- tência legislativa da Assembleia da República (não há em tais casos uma contração dos poderes da Assembleia da República)» (n.º 5). Entendeu-se, assim, que as normas da Lei n.º 8/93 (entretanto revogada pelo artigo 21.º da Lei n.º 22/2012) não podiam ser “adaptadas”, como foram, pelo legislador regional, visto aquela lei ser o produto de uma competência legislativa reservada em absoluto à Assembleia da República [estabelecida, à data, no artigo 167.º, alínea n) , da Constituição]. No processo em que foi proferido o Acórdão n.º 587/00, estava em causa a demarcação da fronteira entre duas freguesias, discutindo-se, nas instâncias, se a competência para essa demarcação cabia aos tribu- nais ou à Assembleia da República. Com efeito, «o Supremo Tribunal Administrativo, considerando não ser, sequer, possível um conflito de direitos em matéria de fronteiras autárquicas, a resolver pelos tribunais, interpretou e aplicou a norma contida no artigo 1.º da Lei n.º 11/82 no sentido de atribuir competência à Assembleia da República para delimitar autarquias, definindo – teoricamente – as respetivas fronteiras, mesmo na hipótese de serem duvidosos – teoricamente – os limites» (Acórdão n.º 587/00, n.º 5). Este aresto julgou inconstitucional a norma do artigo 1.º, n.º 1, da Lei n.º 11/82, de 2 de junho (regime de criação e extinção das autarquias locais, entretanto revogado pelo artigo 21.º da Lei n.º 22/2012), na interpretação segundo a qual cabe à Assembleia da República a competência para proceder à demarcação da fronteira de duas freguesias. Ou seja, entendeu-se que essa competência não se incluía entre aquelas que a Constituição atribui à Assembleia da República, resultantes da conjugação dos então artigos 110.º, n.º 2, e 161.º a 163.º (correspondentes, hoje, aos artigos 113.º, n.º 2, e 164.º a 166.º).
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=