TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

486 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (…) O Tribunal considera que está indiciado e, por conseguinte, poder vir a considerar para efeitos de eventual integração no objeto do presente processo e/ou para alteração da qualificação jurídica dos factos o seguinte:” au) Reafirmando o que antes decidira quanto à irregularidade por falta de fundamentação no despacho profe- rido em 11/01/2010, sendo esta interpretação que o recorrente não pode aceitar, por claramente afrontar o estatuído nos artigo 205.º n.º 1 e 32.º da Constituição da República Portuguesa e ainda o artigo 6.º da CEDH, diminuindo as suas garantias de defesa. av) A fundamentação da decisão de alteração não substancial dos factos vertidos no despacho de pronúncia vem contida no singelo trecho acima transcrito, sendo que da frase – “face à prova produzida em audiência de julgamento”, utilizada nos despachos proferidos em 23/11/2009 e 14/12/2009 –, ou da frase “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento, entre a qual (mas sem prejuízo da que não for neste momento expressamente mencionada)”, utilizadas não decorre fundamentação alguma inteligível que per- mita descortinar a razão de ser das alterações comunicadas, o que esvazia de conteúdo útil o exercício do direito de defesa e não assegura o respeito pelo princípio do contraditório que, afinal, o artigo 358.º do Código de Processo Penal visa acautelar. aw) Passando-se de uma abstração unitária para abstrações parceladas, sem indicação de nenhuma prova con- creta não se permite ao arguido percecionar, compreender, entender o que o Tribunal “sentiu”, teve em mente para considerar provadas indiciariamente as alterações comunicadas e impugná-las diretamente por não provadas ou apresentar prova que contrarie tais novos factos. az) Não decorrendo dos despachos que comuniquem alteração de factos qualquer motivação que minima- mente as sustente, invocando apenas a produção de prova, ou toda a prova produzida em audiência e a já constante dos autos à data de início da audiência, remete-se necessariamente para um vazio impossível de preencher. ba) A norma contida no artigo 358.º do Código de Processo Penal só pode ser entendida como um aforamento do princípio da verdade material, que a lei processual penal estatui para situações que diríamos “normais”, devendo, na medida em que encerra em si mesmo um conflito com outros princípios estruturantes do processo penal, como sejam os da máxima extensão das garantias de defesa, do contraditório e da estru- tura acusatória do processo, ser interpretada e aplicada num sentido restritivo, porquanto estes últimos princípios, sendo princípios constitucionais atinentes a direitos, liberdades e garantias, dispõem de força vinculante acrescida, nos termos do disposto no artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa. bb) A fundamentação que abranja toda a prova produzida ao longo de audiência de julgamento, bem como de prova adquirida ainda na fase de inquérito, não descriminando os meios de prova indicados relativamente a cada uma das alterações comunicadas, não permitindo conhecer o caminho percorrido pelo Tribunal no sentido de julgar que tais alterações se justificam e, consequentemente, de o arguido organizar a sua nova defesa equivale à falta de fundamentação. bc) A indicação “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento”, não permite à defesa saber con- cretamente qual a prova produzida que conduziu à decisão de modo a ser possível a contraprova eficiente e que a mera afirmação de que a comunicação é feita nos termos do artigo 358.º do Código de Processo Penal, de modo algum constitui fundamento de direito. bd) Um despacho que comunique a possibilidade de alterações proferido pelo Tribunal nos termos do artigo 358.º, n. os 1, 2 e 3 do Código de Processo Penal é, naturalmente, uma decisão sujeita ao princípio do dever geral de fundamentação das decisões, consignado no artigo 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e também no artigo 97.º, n.º 5 do Código de Processo Penal, impondo-se que sejam ainda especificados os motivos de facto e de direito da decisão, pelo que jamais bastará remeter apenas para a fór- mula de cómodo: “face à prova produzida em audiência de julgamento” ou “face a toda a prova produzida em audiência de julgamento, entre a qual (mas sem prejuízo da que não for neste momento expressamente mencionada)”

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