TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
483 acórdão n.º 90/13 não estiver presente a total garantia dos direitos de defesa, corre-se o risco de confundir falta de prova do crime com indiciação de alterações. t) È em consideração das garantias de defesa, que os regimes das alterações substanciais e não substanciais são diferentes, sendo que quanto a estas, o artigo 358.º do Código de Processo Penal não vai além de possibilitar uma defesa incidental, preparada no tempo “estritamente necessário” e quanto às substanciais, porque incidem sobre o núcleo factual, incluindo as suas componentes temporal e espacial, não estando, em princípio, totalmente garantida a defesa no próprio processo, o artigo 359.º Código de Processo Penal impõe que não sejam tomadas em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso, admitindo o procedimento pelos novos factos em novo processo, com as mesmas possibilidades de defesa proporcionadas ab initio no processo em que foram comunicadas as alterações. u) Ainda que por natureza, a alteração não substancial dos factos comprima, inevitavelmente, as garantias de defesa e afete a estrutura acusatória do processo penal, uma vez que o tribunal de julgamento estará ine- vitavelmente a imiscuir-se na indiciação de factos que não constam da acusação, interferindo em área que a Constituição da República Portuguesa e a lei processual penal reservaram ao Ministério Público e, com estritos limites, ao juiz de instrução criminal. v) Que possa ser feito ao abrigo da faculdade prevista no artigo 358.º do Código de Processo Penal, com lati- tude necessariamente restrita e em homenagem a princípios conflituantes, como os da investigação e da descoberta de verdade material, é algo que não se contesta em tese geral, mas, na aplicação que do artigo 358.º, n.º 1 do Código de Processo Penal o Tribunal de julgamento faça tem que atentar nas circunstâncias concretas e as consequências a que supra se aludiu, sob pena de inevitavelmente violada aquela norma legal, bem assim como os princípios constitucionais constantes dos artigo 32.º, n. os . 1, 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa. w) Assim a alteração referida, ao vir substituir os factos da pronúncia por factos novos, que transformaram o quadro factual descrito noutro manifestamente diferente, no que respeita aos seus elementos integrantes, constitui verdadeira alteração substancial de factos, enquadráveis no regime previsto no artigo 359.º do Código de Processo Penal, e não do artigo 358.º do Código de Processo Penal, pois delas resulta a imputa- ção de um facto diverso – conforme o artigo 1.º, alínea f ) do Código de Processo Penal. x) Pelo que a interpretação efetuada dos artigos 358.º, n.º 1, 359.º e 1.º alínea f ) do Código de Processo Penal, é inconstitucional, por violar as garantias de defesa conferidas pelo artigo 32.º, n. os 1, 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa, ou seja, por violação dos princípios da máxima extensão dos direitos de defesa em processo penal (em conjugação com o artigo 18.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa) e da presunção de inocência, do direito a um processo leal, equitativo e célere, da estrutura acusatória do pro- cesso penal e do contraditório, entendido este na sua única conformação constitucionalmente admissível, como princípio de conteúdo material e dotado de plena eficácia, inconstitucionalidade essa que se pretende seja declarada com as devidas consequências, em conformidade com o disposto no artigo 80.º da Lei do Tribunal Constitucional. z) A segunda questão decorrente dos despachos já identificados que vieram a ser integralmente confirmados pelo Tribunal da Relação de Lisboa, neste ponto do recurso de (in)constitucionalidade, reconduz-se à inter- pretação efetuada do artigo 358.º do Código de Processo Penal, no sentido de, à luz daquele preceito, ainda ser possível naquele momento, proceder à comunicação de alterações de facto – por violação dos artigos 20.º, n.º 4, 32.º, n. os 1, 2 e 5, e 18.º, n. os 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa, e artigo 6.º, n. os 1 e 3, alínea a) , da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. aa) Para a correta análise e delimitação desta questão releva considerar que a audiência de discussão e julga- mento teve início em novembro de 2004, tendo os dois assistentes relacionados com estes factos E. e C. começado a prestar declarações, respetivamente no dia 20 de junho de 2006 e terminado em 25 de julho de 2006, e em 23 de janeiro de 2006 terminando em 26 de fevereiro do mesmo ano, relevando ainda o exame ao local efetuado pelo Tribunal de primeira instância à casa do Restelo identificada no despacho de pronúncia, com a participação de ambos os assistentes, o que ocorreu no dia 09 de fevereiro de 2006.
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