TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

478 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL aj) Não é legítimo negar ao arguido um meio de defesa tão relevante para a sua absolvição, não podendo aceitar-se na interpretação conjugada do disposto nos artigos 204.º, 18.º e 32.º, n. os 1 e 5 da CRP e artigo 355.º e 356.º, n. os 2, alínea b) e 5, do CPP que intervenientes instrumentais possam obstar sistematica- mente à produção de prova que pode ser tão relevante para a condenação ou absolvição, por mera oposição infundamentada de modo a poder aferir-se se a oposição respeita os limites constitucionais às restrições ao exercício da defesa. ak) Neste sentido milita também um elemento histórico que importa atentar, visto, não existir nem traço nem paralelo, ao entendimento de proibição de leitura condicionada à autorização dos autos consignado no artigo 356.º n.º 2 alínea b) e n.º 5 do CPP, na história recente processual penal. al) O código de Processo Penal de 1929 que resultou de um longo processo de reforma e compilação de legis- lação anterior, teve como finalidade primordial a busca da verdade material. am) Durante a vigência daquela Código de Processo Penal, apesar de todas as alterações a que foi sujeito, quase até à entrada em vigor do atual código de processo penal, o regime de leitura de declarações de testemunhas regia-se pelos artigos 438.º e 439.º, dispondo o primeiro daqueles preceitos da leitura de declarações de testemunhas presentes na audiência de julgamento e o segundo, das ausentes, permitindo ambos a leitura dos depoimentos prestados na fase investigatória.  an) Existiu assim no Código de Processo Penal de 1929 uma forma reforçada de acesso à verdade material por parte do Juiz, que podia confrontar as testemunhas com os seus depoimentos anteriores, verificando assim a veracidade das suas declarações, instrumento útil na medida em que obrigava as testemunhas a manterem-se fiéis às declarações prestadas, e protegia-as de coações a que eventualmente pudessem estar sujeitas. ao) Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 35 007, 13 de outubro de 1945, deu-se uma viragem de todo o sistema criminal autoritário iniciado com a Constituição de 1933 e com o Código de Processo Penal de 1929, mas mesmo durante o período de vigência deste sistema os mecanismos dos artigos 438.º e 439.º mantiveram-se em vigor inalterados. ap) Com a revolução ocorrida em abril de 1974, alterou-se novamente o processo penal, com o duplo intuito de o simplificar e imprimir-lhe maior celeridade, o que foi feito através do decreto Lei 605/75 de 3 de novembro, mas sem alterações no regime da leitura das declarações, tendo acontecido o mesmo com os diplomas imediatamente anteriores (de 1976 e o de 1977). aq) As alterações ao processo penal ocorridas, essencialmente após a entrada em vigor da Constituição da Repú- blica Portuguesa de 1976, e nos seus diplomas de aplicação, causaram um regime disperso e com legislação contraditória, criando a necessidade de uma revisão global do sistema com então foi reconhecido. ar) O projeto elaborado no âmbito da comissão de revisão em 1983, composta por Figueiredo Dias, Maia Gonçalves, Costa Andrade, Castro e Sousa, José António Barreiros e Cunha Rodrigues, estava sujeito ao cumprimento da Lei de Autorização Legislativa n.º 43/86, de 26 de setembro, onde se verifica, no ponto 63 do artigo 2.º, que o Decreto-Lei a apresentar devia conter a: “Proibição, salvo em casos excecionais, de valoração em julgamento de quaisquer provas que não permitam o estabelecimento do contraditório em audiência, alargando nomeadamente o elenco de situações em que são proibidas as leituras de autos de instrução contendo declarações de arguidos, assistentes, partes civis ou testemunhas não presentes na audiência de Julgamento”. as) A pouca doutrina que se debruçou sobre este tema, e dos quais se destaca Damião da Cunha indica este ponto da lei de autorização como uma das razões para a proibição da leitura das declarações das testemu- nhas em audiência, mas erradamente visto que o que se afirmou na lei de autorização legislativa, foi que deveria ser restringida a leitura de declarações proferidas por vários intervenientes processuais quando estes não estiverem presentes na audiência de julgamento. at) Este entendimento, aliás, segue o do parecer da Comissão Constitucional n.º 18/81, de 27 de junho de 1981, que levou o Conselho da Revolução a considerar inconstitucional o artigo 439.º do CPP (que per- mitia a leitura de depoimentos de testemunhas não presentes em audiência de julgamento), sem que, no

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