TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
472 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL […] B) Conclusões: a) Na audiência de julgamento que teve lugar em 14 de março de 2005 (fls. 28 916 ponto 2. a 28 927), suscitou o recorrente a questão de inconstitucionalidade das normas dos artigos 346.º n.º 1 e artigo 347.º n.º 1 do Código de Processo Penal quando interpretadas no sentido de que a tomada de declarações dos assistentes e dos demandantes cíveis, é sempre realizada pelo Presidente, no caso de Tribunal Coletivo e que a ordem definida para a realização das instâncias é imperativa, por violação do disposto nos números 1, 2 e 5 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. b) Por despacho de 17/03/2005 (cfr. fls. 28 916 a 28 927) que conheceu da exceção da fiscalização concreta da constitucionalidade dos referidos artigo 346.º n.º 1 e 347.º do Código de Processo Penal, declarou o tribunal de primeira instância a interpretação efetuada dos artigos em causa, conforme à Constituição, entendendo assim que a tomada de declarações dos assistentes e dos demandantes cíveis, é sempre realizada pelo Presidente, no caso de Tribunal Coletivo, e, caso o Ministério Público, o advogado do assistente, o advogado do demandante cível ou o defensor pretendam que seja formulada alguma questão ou pedido algum esclarecimento, deverão estes solicitar ao Presidente do Tribunal que formule tais questões ou pedi- dos de esclarecimentos aos assistentes e demandantes cíveis. c) Tal despacho declarou igualmente a conformidade com a Constituição da República interpretação efetuada sobre a imperatividade da ordem definida para a realização das instâncias, pelo que, o defensor do arguido formulará o seu pedido de questão ao Presidente, depois do Ministério Público, mas antes do mandatário dos assistentes e dos demandantes cíveis. d) Esta interpretação dos artigos 346.º n.º 1 e 347.º do Código de Processo Penal bem como a sua confor- midade com os preceitos e princípios constitucionais foi mantida pela Relação de Lisboa, (fls. 73 507 a 73 547) decidindo não se verificar qualquer violação do pleno exercício dos direitos de defesa, nem pade- cerem de inconstitucionalidade, à luz do disposto nos n. os 1, 2 e 5 do artigo 32.º da Constituição e dos princípios fundamentais subjacentes a este dispositivo, as normas do processo penal em causa – artigos 346.º, n.º 1, e 347.º n.º 1, do Código de Processo Penal com a interpretação efetuada. e) No entanto, tal interpretação dos normativos ao impedir o interrogatório direto da(s) defesa(s) e ao impôr uma sequência imperativa na formulação dos pedidos de esclarecimento aos assistentes e às partes civis – primeiramente o Ministério Público, de seguida o defensor e, por último, os advogados das partes civis e dos assistentes ou vice-versa, consoante os casos, restringe de forma inaceitável as garantias de defesa dos arguidos, comprometendo as garantias de espontaneidade e da imediação próprias de um contrainterro- gatório, violando, muito em particular, os princípios constitucionais do contraditório e da presunção da inocência. f ) Aos assistentes poucas ou quase nenhumas situações encontram de entrar em contradição com o que já haviam dito anteriormente. g) As garantias de defesa do arguido, maxime , o direito de contra interrogar e contraditar diretamente toda a prova incriminatória que seja produzida na audiência de julgamento – fora as exceções dos artigos 349.º e 350.º do Código de Processo Penal –, não se mantêm intactas se as normas em crise impuserem que todo o interrogatório do assistente e das partes civis, nomeadamente, do demandante cível, seja realizado por intermédio do presidente do Tribunal. h) A aplicação do regime resultante da interpretação normativa impugnada prejudica a espontaneidade do depoimento, retirando-lhe conteúdo emocional, ou seja, tudo aquilo que permite, em sede de audiência de julgamento, aceder à humanidade da prova e, consequentemente, à possibilidade de valoração. i) Não se pode fazer uma interpretação meramente literal das normas citadas, visto que como decorre do n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, “(…) a interpretação não se deve cingir à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico”, do qual faz parte e se sobrepõe às regras processuais penais, as normas e princípios constitucionais, donde se destaca o disposto no artigo 32.º n.º 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa, resíduo nuclear das
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