TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

455 acórdão n.º 90/13 74.ª Por isso, não podia beneficiar de confissão ou arrependimento. 75.ª Apesar disso e ao ratificar a atuação do Tribunal de primeira instância, o acórdão recorrido manteve a legitimidade das muitas referências ao silêncio do recorrente, o que patenteia que o artigo 343.º-1 do CPP foi interpretado no sentido indicado pelo recorrente, sendo manifesto que tal interpretação foi relevante na ratio deci- dendi de confirmação integral da decisão condenatória. 76.ª A norma do artigo 343.º-1 do CPP ao impor que o silêncio do arguido não o pode desfavorecer, constitui uma garantia de defesa conferida pelo artigo 32.º da Constituição, garantia que, sob pena de violação dessa norma constitucional, não admite limitações. 77.ª Por isso, para serem respeitadas as garantias de defesa conferidas pela norma constitucional violada, deve esta norma processual ser interpretada no sentido de que o silêncio do arguido é completamente inócuo, não podendo em nada desfavorecê-lo, designadamente pela muita repetida referência ao silêncio, com inevitável inter- ferência na apreciação dos factos e na sua relevância penal, devendo os factos ser reapreciados sem referência e com esquecimento do silêncio do recorrente. Inconstitucionalidade do artigo 127.º do CPP 78.ª Esta inconstitucionalidade foi suscitada no recurso da decisão final, conforme conclusões transcritas a fls 75922 e, a fls 76100, foi decidido pelo acórdão recorrido “que não se verifica”, que “inexiste”, 79.ª O recorrente indicou (fls 76680) a interpretação inconstitucionalizante do artigo 127.º do CPP feitas na decisão recorrida, como sendo no sentido de que a livre apreciação da prova pode ser feita com sobrevalorização da livre convicção e subvalorização das regras de experiência, com sobrevalorização das provas positivas e subvalo- rização ou mesmo esquecimento das provas negativas, com prevalência da imediação e consequente dificultação do recurso em matéria de facto, como se, nos crimes de abuso sexual, a presunção de inocência fosse substituída pela presunção de culpa. 80.ª Afirma-se, nomedamente, no douto acórdão recorrido, a fls 76101, que “O acórdão não deixou de se debruçar sobre esta questão” (o assistente G. enganou-se no nome do arguido, referindo por duas vezes o nome “Z.), a fls 76102 que “teve equívocos, dúvidas, por vezes aparência de incongruências” e que “o tribunal não ficou com a impressão de que aquela retificação deixasse transparecer que o assistente tinha sido “apanhado” em alguma coisa. 81.ª Depois, a fls 76105, o acórdão vinca que “não queremos deixar de afirmar e chamar a atenção para quão importante é a imediação. 82.ª Face ao referido e ao mais constante do acórdão recorrido e que por economia processual se não transcreve, é manifesto que o acórdão recorrido interpretou o artigo 127.º do CPP no sentido indicado pelo recorrente e que tal interpretação foi relevante na confirmação da decisão de terem sido considerados provados os factos imputados ao recorrente relativamente ao assistente G.. 83.ª A norma do artigo 127.º do CPP, ao impor que a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, interpretada no indicado sentido do acórdão recorrido, viola as garantias de defesa e a presunção de inocência consagradas nos n. os 1 e 2 do artigo 32.º da Constituição. 84.ª No contexto das conclusões 97.º a 134.º, referidas pelo acórdão recorrido a fls 76099 e transcritas de fls 75919 a fls 75924 (que por economia processual se dão por reproduzidas), a norma processual referida, para serem respeitadas as garantias de defesa e a presunção de inocência consagradas nas normas constitucionais violadas, deve ser interpretada no sentido de que a livre apreciação da prova deve ser objetiva, sem interferência da mera impressão gerada pelos diversos meios de prova, devendo os factos vir a ser reapreciados com consideração da objetividade da prova produzida em audiência de julgamento e com postergação da mera impressão subjetiva gerada por essas provas e, quiçá, eventualmente de algum modo influenciada pela ambiência social, comunicacional e justiceira que o caso suscitou e empolou durante uma década. (…)»

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