TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

440 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 33. Esta interpretação não encontra qualquer arrimo na letra daquele preceito legal, artigo 115.º, n.º 1 do CP, pelo que não traduz de modo algum uma interpretação extensiva do mesmo. 34. Aliás, não se tratará aqui sequer de equacionar acerca da possibilidade de recurso à interpretação exten- siva em Direito Penal – que, como é sabido, é discutido por alguma doutrina e jurisprudência no que respeita à interpretação extensiva de normas incriminadoras em sentido amplo. Uma tal interpretação teria, nos termos do artigo 9.º, n.º 2 do Código Civil, que encontrar na letra da lei “um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”. 35. A interpretação em direito penal atento o princípio da legalidade não pode, extravasar a correspondência verbal possível e consentida pela lei, dúvidas não existindo, pois, que em direito penal a integração de lacunas através de interpretação analógica (quer ela seja de normas ou de direito) se encontra expressamente excluída por disposição constitucional e ordinária (artigos 29.º n.º 3 da CRP e artigos 1.º n.º 3 do C.P. respetivamente). 36. Face ao exposto e atenta a natureza processual material das normas relativas ao instituto da queixa, nas suas várias vertentes – exercício, caducidade e desistência –, e à inerente sujeição ao princípio da legalidade, consagrado no artigo 29.º, n.º 1 da CRP e no artigo 1.º, n. os 1 e 3 CP, não é admissível a sua aplicação analógica. 37. Assim, não obstante no Acórdão recorrido se afirmar não ter sido feita qualquer aplicação analógica da norma processual em causa, antes tendo aplicado, em conjugação com as normas jurídicas que no caso vertente se aplicam, interpretando-as de acordo com o espírito da lei, manifestamente, nem a letra do preceito em referência – artigo 115.º, n.º 1 do CP –, a verdade é que nem a sua letra, nem o seu espírito, contempla, ou suporta, mini- mamente, o sentido interpretativo sufragado no Acórdão recorrido. 38. Pelo Contrário, o que as alterações legislativas introduzidas pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, eviden- ciam relativamente ao regime anteriormente vigente decorrente das alterações introduzidas pela Lei n.º 65/98, de 2 de setembro, é a existência de uma verdadeira e própria lacuna que o legislador da Reforma de 2007 entendeu por bem colmatar por via legislativa, como inevitavelmente teria que ser – inovando por via da introdução das normas constantes dos artigos 113.º, n.º 6 e 115.º n.º 2 do CP. 39. Do Acórdão recorrido decorre uma interpretação do disposto no artigo 5.º, n.º 1 do CP, na redação que lhe foi dada pelo DL n.º 48/95, de 15 de março no sentido de que o alargamento do prazo do exercício do direito de queixa dali previsto para, de seis meses após o termo ali fixado, não comporta uma interpretação analógica daquela norma penal, mas antes um interpretação conjugada das várias normas penais e processuais penais aplicáveis, inter- pretadas de acordo com o espírito da lei. 40. Contudo, a interpretação normativa efetuada no Acórdão recorrido, conduziu ao alargamento, não con- templado na lei, do prazo do exercício do direito de queixa, sendo pois forçoso concluir que se traduziu, em sentido verdadeiro e próprio, na integração de uma lacuna da lei penal. 41. Tal integração redundou na aplicação analógica da norma constante do artigo 115.º, n.º 1 do CP, no que respeita ao prazo ali previsto para o exercício do direito de queixa, a situações como a dos presentes autos, com o sentido normativo segundo o qual o terminus a quo da contagem do prazo seria o da data em que os ofendidos adquirem capacidade de exercício do direito de queixa (cfr., a contrario, o disposto no artigo 113.º, n.º 3 do CP), ou seja, a data em que completem dezasseis anos, independentemente do momento em que tenham tomado conhecimento do facto e da identidade dos seus autores. 42. A interpretação normativa efetuada no Acórdão recorrido das normas do artigo 113.º, n.º 3, e 115.º, n.º 1 do CP, na redação vigente à data dos factos, implica um alargamento do prazo para apresentação da queixa, com base na aplicação analógica do regime atual dos artigos 113.º, n.º 6 e 115.º, n.º 2, do CP, a um caso manifesta- mente não incluído na intenção do legislador. 43. Tal analogia, ao determinar um alargamento do prazo de exercício do direito de queixa, não contem- plado na lei, permitindo a verificação de uma condição de procedibilidade que, de outro modo, não se verificaria, redunda em desfavor do arguido, sendo inadmissível, conduzindo a uma solução desconforme e violadora do princípio da legalidade ínsito no artigo l.º, n. os 1 e 3 do CP e no artigo 29.º, n.º 1 da CRP.

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