TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
430 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 5. Com a comunicação da alteração de factos ao ora recorrente não está em causa, a consequente produção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que a defesa entenda por necessária ao exercício efetivo do direito de defesa, no que se inclui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao cumprimento efetivo das garantias de defesa consagradas no artigo 32.º da CRP. 6. Assim, a admissão de alterações após conclusão das alegações orais, embora consentida pela mera literali- dade legal – “no decurso da audiência”-, constitui surpresa e irracionalidade processuais, violadoras da plenitude das garantias de defesa (que tem ínsita a estrutura acusatória do processo penal e o princípio do contraditório) conferida pelo artigo 32.º da CRP e do processo equitativo imposto pelo artigo 20.º, n.º 4 da CRP e pelo artigo 6.º da CEDH. 7. A violação das garantias de defesa está evidenciada pela conjugação da extemporaneidade da decisão com a amplitude temporal das alterações preconizadas. 8. Sendo a admissibilidade de alterações indiciárias justificada pelo princípio da verdade material, não pode este princípio aos da plenitude das garantias de defesa, do acusatório e do contraditório, devendo os “conflitos” ser resolvidos com recurso aos princípios da adequação, da exigibilidade, da proporcionalidade e da proibição do excesso, cuja observância é imposta pelo artigo 18.º da CRP. 9. Neste enquadramento constitucional, as alterações devem ser comunicadas no mais curto prazo após a sua indiciação no decurso da audiência, o que também está estatuído e de forma mais direta no artigo 6.º, n.º 3, alínea a) da CEDH, que confere ao acusado o direito de “ser informado no mais curto prazo, em linguagem que entenda e de forma minuciosa, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada”, impondo-se a correspetiva obriga- ção de forma mais evidente quando a acusação passa a ser a acusação inicial alterada, em relação à qual vinha sendo exercido o direito ao contraditório e à defesa. 10. Ao fim de mais de cinco anos de julgamento, não pode deixar de se entender que tal estado de coisas briga com um processo justo e equitativo, o qual exige, como seu elemento conatural, que acusação e defesa tenham a possibilidade efetiva de defender os seus interesses numa posição idêntica, e não numa situação substancial de desvantagem, em que o princípio da igualdade de armas se apresenta como elemento incindível daquele, como aliás tem sido sucessivamente reafirmado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH). 11. A comunicação da referida alteração no momento em que foi efetuada, viola ainda o direito a um processo equitativo e o princípio da igualdade por violação do disposto nos artigos 20.º, n.º 4, 32.º, n. os 1, 2 e 5, 18.º, n. os 2 e 3 da CRP e artigo 6.º, n.º 1 e 3 alínea a) da CEDH. 12. Pelo que forçoso será concluir que a (injustificada) extemporaneidade da comunicação das alterações dos factos viola, objetivamente, a plenitude das garantias de defesa consagradas no artigo 32.º, n. os 1, 2 e 5 da CRP e o princípio do processo equitativo imposto pelos artigos 20.º, n.º 4 da CRP e 6.º da CEDH. 13. Termos em que a interpretação normativa conjugada dos artigos 358.º, n.º 1 e 1.º, alínea f ) do CPP efetuada no Acórdão recorrido, no sentido de que a comunicação da alteração não substancial dos factos cons- tantes do despacho de pronúncia, abrangendo quase todos os factos ali vertidos, efetuada após as alegações finais, decorrido mais de um ano sobre o termo das mesmas e da produção de prova, e mais de 4 anos sobre a produção da prova oferecida pela acusação pública e pelos assistentes, foi efetuada em prazo razoável e adequado, não sendo impeditiva do exercício efetivo dos direitos de defesa dos arguidos por ela visado, nem violadora das garantias de defesa do arguido, do direito à decisão da causa em prazo razoável e sequer do direito a um processo equitativo, inconstitucional por manifestamente violadora do disposto nos artigos 32.º, n.º 1, 2 e 5, 20.º, n.º 4 e 18.º, n. os 2 e 3 da CRP, bem como ainda do disposto no artigo 6.º, n. os 1 e 3 alínea a) da CEDH, e como tal do direito a um processo justo e equitativo, inconstitucionalidade que deve ser declarada. 14. A interpretação normativa conjugada dos artigos 358.º, n.º 1 e 1.º, alínea f ) do CPP conforme àqueles princípios e preceitos constitucionais e aos princípios neles consagrados, bem como o direito a um processo equi- tativo tal como consagrado no artigo 6.º, n. os 1 e 3, als. a) e b) da CEDH, impunha que o despacho proferido ao
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