TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
428 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 5. Assim, uma vez efetuada tal concreta determinação, o tempo e o lugar integram o facto não só ontologi- camente mas também quanto à sua cognição, pois o facto criminoso não é uma abstração parcelada, é um facto concreto e unitário. 6. À luz desta conceção, as circunstâncias de tempo, lugar e modo não se apresentam como um elemento acessório, mas antes um elemento integrante dos factos objeto da acusação, pelo que, alterando-se a narração do núcleo do tempo ou do lugar que integram o crime imputado, verifica-se a imputação de um crime diverso, não sendo mantida a imputação do mesmo crime. 7. Sendo que a nova indiciação de um crime em concreto diverso não é confundível com a indiciação de um diverso tipo legal de crime, a qual, sem alteração da narração factual, incluindo o lugar e o tempo, constitui alte- ração da qualificação jurídica dos factos, que não está em causa na douta decisão recorrida e que está regulada no n.º 3 do artigo 358.º do CPP. 8. Os limites à identidade do crime, na qualificação de uma alteração, terão que ser a total garantia dos direitos de defesa do Arguido e a prossecução da justiça e da verdade material, pelo que, sempre que essa alteração ponha em causa a defesa, estaremos perante uma alteração substancial dos factos. 9. A alteração de factos descritos no despacho de pronúncia como ocorridos num dia indeterminado situado entre outubro de 1998 e outubro de 1999, tinha o menor 14 anos de idade, no sentido de poderem ter ocorrido em dia não concretamente apurado, situado entre o fim do ano de 1997 e julho de 1999, tinha o assistente 13/14 anos de idade, traduz a imputação de um crime diverso. 10. As circunstâncias referidas no despacho proferido, ao virem substituir os factos da pronúncia por factos novos, que transformam o quadro factual descrito noutro manifestamente diferente no que respeita aos seus ele- mentos integrantes, constituem verdadeiras alterações substanciais de factos, enquadráveis no regime previsto no artigo 359.º do CPP, e não do artigo 358.º, pois delas resulta a imputação de um crime diverso – cfr. o artigo 1.º, alínea f ) do CPP. 11. Da alteração em causa resulta não a mera especificação dos factos descritos na pronúncia, mas uma inova- ção do quadro fáctico relativo às circunstâncias de tempo, com imputação de um crime diverso. 12. A interferência na defesa do arguido decorrente de tal alteração tem força suficiente para impedir que a alteração seja tratada no âmbito do artigo 358.º, n.º 1 do CPP, uma vez que a mesma ficou inviabilizada. 13. Preparando o visado pela alteração, há cinco anos a sua defesa (por referência à data da comunicação) relativamente a um imputado crime num certo período, já de si excessivamente longo, não respeitando de modo algum as suas garantias de defesa ser restringido, decorridos cinco anos, à possibilidade de uma defesa incidental, em tempo estritamente necessário, quando já não pode dispor de meios de prova a que ainda poderia ter tido acesso antes desse período. 14. Com a comunicação de alteração de factos ao ora recorrente não estava em causa a consequente produ- ção de prova suplementar relativamente a um qualquer facto complementar, mas antes a produção de prova que entendida por necessária ao exercício efetivo do direito de defesa, no que se inclui a renovação dos meios de prova tidos por necessários e convenientes ao efetivo exercício das garantias de defesa consagradas no artigo 32.º da CRP. 15. Na questão em análise verificaram-se pois alterações de factos que modificaram a narração do núcleo do lugar e ou do tempo dos crimes imputados nos termos acima referidos, importando analisar se efetuadas tais alterações de factos e, ainda que respeitado o disposto no artigo 358.º do CPP, podem mostrar-se absolutamente postergadas as garantias de defesa do Arguido. 16. As alterações de factos que se verificaram modificaram, no final da audiência de julgamento, a narração do núcleo do lugar e ou do tempo dos crimes imputados, tendo ocorrido a variação temporal de um ano relativamente aos factos imputados na acusação e, subsequentemente, no despacho de pronúncia. 17. Atendendo à distância temporal dos factos novos imputados ao Arguido – tendo decorrido mais de 10 anos entre a data da suposta prática daqueles e o momento em que tais factos lhe foram comunicados – a estratégia que definiu para exercer o seu direito à defesa face à acusação e despacho de pronúncia (em que teve em conta o lugar e ou o tempo dos factos que lhe foram imputados na acusação) e à dificuldade de lançar mão de alguns meios prova ou até mesmo à impossibilidade de oferecer alguns meios de prova (como por exemplo os dados de tráfego
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