TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

413 acórdão n.º 90/13 25. Não gostaria A. de ter de sustentar tal vício de inconstitucionalidade, porque o seu objetivo sempre foi o de demonstrar a sua inocência, mas os seus advogados, por dever de patrocínio, não podem deixar de colocar a questão. 26. No requerimento de abertura de instrução (cfr. fls. 16 792 a 16 866), o arguido A. – tal como outros arguidos – suscitou a questão de nenhuma das supostas vítimas – ou os seus representantes legais – terem apresentado queixa no prazo de seis meses previsto no artigo 115.º n.º 1 do C.P., razão pela qual caducara o seu direito de queixa. 27. Porém, o Senhor Juiz de Instrução Criminal não atendeu a tal arguição, uma vez que adotou o enten- dimento de que o prazo previsto no artigo 115.º n.º 1 do Código Penal só se conta – em relação às vítimas – a partir do momento em que tais vítimas perfazem a idade de 16 anos, regra que, apesar de não estar expressamente previsto, se deveria aplicar a tal situação. 28. Desse despacho o arguido interpôs recurso, a 29 de março de 2004, ainda em fase de instrução, o qual foi agora apreciado pelo acórdão recorrido, que manteve o ponto de vista da 1.ª instância, nos termos que, resumida- mente, a seguir se enunciam: O arguido A., basicamente, invoca que o Tribunal faz uma aplicação analógica da norma constante do artigo 115.º do CP, no que respeita ao prazo ali previsto para o exercício do direito de queixa, com o sentido normativo segundo o qual o terminus a quo da contagem daquele prazo será o da data em que as vítimas adquirem capacidade de exercício do direito de queixa, ou seja, na data em que completem 16 anos, independentemente do momento em que tenham tomado conhecimento do facto e da identidade dos seus autores. Com o devido respeito, trata-se de uma conclusão que o arguido retira, desconsiderando por completo o com- plexo das normas penais e processuais penais que aqui têm que ser chamadas à colação, como bem se constata nas decisões recorridas e na resposta do Ministério Público. O que o Tribunal recorrido fez não foi qualquer interpretação analógica do citado normativo do artigo 115.º, n.º 1, do CP, mas antes a interpretação conjugada das normas aplicáveis e que aponta para a resposta que foi encon- trada, como aliás, a nossa jurisprudência tem entendido (vejam-se, a esse propósito, os acórdãos citados quer pelo Ministério Público na sua resposta, quer os que são invocados pelo Tribunal recorrido no despacho proferido no acórdão final). Como facilmente se constata, os arguidos não indicam uma única decisão de um Tribunal Superior que suporte as conclusões por si defendidas. Voltando ao arguido A., reitera-se que não se verifica qualquer interpretação analógica de uma norma penal, mas sim a interpretação conjugada das várias normas jurídicas aplicáveis, encontrando-se o único sentido útil e justo para situações como as que aqui se colocam, como é dever do Tribunal – interpretar as normas legais reconstituindo a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições especificas do tempo em que é aplicada, sendo que na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas (art. 9.º do CC). (…) No mais, ambos os arguidos vêm invocar a inconstitucionalidade da interpretação feita pelo Tribunal recorrido quanto à contagem do prazo para o exercício do direito de queixa por parte dos ofendidos e consequente legitimi- dade do Ministério Público para exercer a ação penal, por violação do princípio da legalidade, previsto no artigo 1.º, n.º 3, do CP, e no artigo 29.º, n.º 1, da CRP. É óbvio que ocorrendo aplicação analógica de uma norma processual penal, que conduziria ao alargamento, não contemplado na lei, do prazo do exercício do direito de queixa, se estaria a violar o princípio da legalidade. No entanto, mais uma vez teremos que o afirmar, não foi essa a atuação do Tribunal a quo. O Tribunal não aplicou analogicamente qualquer norma, antes tendo aplicado, em conjugação, as normas jurídicas que no caso vertente se aplicam, interpretando-as de acordo com o espírito da lei. Não se consegue, pois, descortinar qualquer inconstitucionalidade da interpretação normativa feita no despa- cho recorrido, por alegada violação do artigo 29.º, n.º 1, da CRP. 29. Assim sendo, o acórdão recorrido adota um entendimento normativo relativamente ao artigo 115.º n.º 1 do Código Penal – na redação vigente à data dos factos – no sentido de que o direito de queixa só se extingue no prazo de seis meses a partir do momento em que os ofendidos completem a idade de 16 anos, o que, não estando

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