TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

388 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL efetuada, em si mesma considerada, e sujeita a determinada taxa, sendo a tributação autónoma apurada de forma independente do IRC que é devido em cada exercício, por não estar diretamente relacionada com a obtenção de um resultado positivo, e por isso, passível de tributação. Assim, e no caso do IRC, estamos perante um imposto anual, em que não se tributa cada rendimento perce- bido de per si, mas sim o englobamento de todos os rendimentos obtidos num determinado ano, considerando a lei que o facto gerador do imposto se tem por verificado no último dia do período de tributação (cfr. artigo 8.º, n.º 9, do CIRC). Já no que respeita à tributação autónoma em IRC, o facto gerador do imposto é a própria realização da des- pesa, não se estando perante um facto complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas perante um facto tributário instantâneo. Esta característica da tributação autónoma remete-nos, assim, para a distinção entre impostos periódicos (cujo facto gerador se produz de modo sucessivo, pelo decurso de um determinado período de tempo, em regra anual, e tende a repetir-se no tempo, gerando para o contribuinte a obrigação de pagar imposto com caráter regular) e impostos de obrigação única (cujo facto gerador se produz de modo instantâneo, surge isolado no tempo, gerando sobre o contribuinte uma obrigação de pagamento com caráter avulso). Na tributação autónoma, o facto tributário que dá origem ao imposto, é instantâneo: esgota-se no ato de realização de determinada despesa que está sujeita a tributação (embora, o apuramento do montante de imposto, resultante da aplicação das diversas taxas de tributação aos diversos atos de realização de despesa considerados, se venha a efetuar no fim de um determinado período tributário). Mas o facto de a liquidação do imposto ser efetuada no fim de um determinado período não transforma o mesmo num imposto periódico, de formação sucessiva ou de caráter duradouro. Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do con- junto de operações sujeitas a essa tributação autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efetuadas na determinação da taxa. E esta distinção tem relevância, designadamente, para efeitos de aplicação da lei no tempo e para a análise da questão da proibição da retroatividade da lei fiscal desfavorável prevista no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. Com efeito, conforme refere Cardoso da Costa “(…) a linha demarcadora do âmbito da retroatividade fis- cal constitucionalmente admissível passará, desde logo, pela distinção entre situações tributárias «permanentes» e «periódicas» e «factos» cuja eficácia fiscal se esgota ou se firma «instantaneamente», para cada um deles «de per si» ( maxime , pela distinção entre «impostos periódicos» e «impostos de obrigação única»), e passará provavelmente, depois, no que concerne àquele primeiro tipo de situações, pela distância temporal que já tiver mediado entre o período de produção dos rendimentos e a criação (ou modificação) do correspondente imposto. Isto, de todo o modo, sem prejuízo do relevo de outras circunstâncias, cujo possível peso não poderá ignorar-se.” (Cfr. Cardoso da Costa, “O Enquadramento Constitucional do Direito dos Impostos em Portugal”, in Perspetivas Constitucionais nos 20 anos da Constituição, Vol. II, Coimbra, 1997, p. 418). Neste caso estamos perante um tributo de obrigação única, incidindo sobre operações que se produzem e esgo- tam de modo instantâneo, em que o facto gerador do tributo surge isolado no tempo, originando, para o contri- buinte, uma obrigação de pagamento com caráter avulso. Ou seja, as taxas de tributação autónoma aqui em análise não se referem a um período de tempo, mas a um momento: o da operação isolada sujeita à taxa, sem prejuízo de o apuramento do montante devido pelos agentes económicos sujeitos à referida “taxa” ser efetuado periodicamente, num determinado momento, conjuntamente com outras operações similares, sem que a liquidação conjunta influa no seu resultado. Por esta razão, Sérgio Vasques (cfr. Manual de Direito Fiscal, Almedina, 2011, p. 293, nota 470) chama a aten- ção para a circunstância de os impostos sobre o rendimento contemplarem elementos de obrigação única, como as taxas liberatórias do IRS ou as taxas de tributação autónoma do IRC. 4. Regressando ao caso concreto, é manifesto que se está perante uma hipótese de aplicação retroativa do dis- posto no artigo 81.º, n.º 3, do CIRC, na redação introduzida pela Lei n.º 64/2008, de 5 de dezembro, ou seja, aplicação de lei nova a factos tributários de natureza instantânea, já completamente formados, anteriores à data da sua entrada em vigor.

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