TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

378 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL para ele foi interposto, e a decisão no sentido da intempestividade, quando esta decorre inteiramente da questão da legalidade de uma prorrogação do prazo para recorrer, ou motivar, o recurso deferida precedentemente pela primeira instância, por decisão que não foi impugnada ou questionada por outro sujeito do processo.” (cfr. Acórdão n.º 103/06, disponível in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ).  Porém, desde a reforma de 2007, o próprio legislador passou a prever um prazo mais longo de inter- posição de recurso (artigo 411.º, n.º 4, do CPP), tendo colocado um ponto final naquela polémica. A única questão a dirimir nos presentes autos assenta, portanto, na possibilidade de aplicação de um prazo mais curto – neste caso, o prazo geral – quando o relator do tribunal de recurso tenha entendido que não pode conhecer-se do objeto do recurso quanto à matéria de facto (cfr. novamente acordão de fixação de jurispru- dência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/12, de 8 de março de 2012, acima citado).  Ora, na linha do preconizado pelo Ministério Público (cfr. fls. 602 a 604), entende-se que o momento decisivo para a fixação legal do prazo de recurso penal não pode deixar de ser a data de apresentação do res- petivo requerimento de interposição, sendo irrelevante a decisão – sempre posterior – que o relator venha a proferir quanto à admissibilidade de conhecimento do respetivo objeto. Assim é porque a finalidade que presidiu à fixação de um prazo mais longo assenta, precisamente, na maior dificuldade na preparação do recurso penal sobre matéria de facto, por exigir uma audição integral da prova gravada.  Assim sendo, a finalidade que justifica a fixação de um prazo mais longo de interposição de recurso não reside – nem podia residir – na própria aferição da procedência ou admissibilidade do recurso, mas antes na atenuação das dificuldades de elaboração do recurso que tenha por base a impugnação de prova produzida e gravada em suporte magnético ou digital. É, aliás, nesse sentido que a jurisprudência Supremo Tribunal de Justiça se tem pronunciado (cfr. acordão do Supremo Tribunal de Justiça no proc. n.º 1704/07.2BTBBG. P1.S1, de 11 de janeiro de 2012).  O prazo de interposição de recurso é fixado, pela lei, em função do modo como o recorrente concebe o respetivo objeto – ou seja, optando por recorrer apenas quanto a matéria de facto, quanto a matéria de Direito ou quanto a ambas –, aplicando-se o prazo mais longo, quando haja cumulação de impugnação de facto e de Direito. Assim, sendo a interpretação normativa extraída pela decisão recorrida dos n. os 1 e 4 do artigo 411.º coloca em causa, de modo grave, o princípio da segurança e da confiança jurídicas decorrentes do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição) bem como o processo equitativo e as garantias de defesa do arguido consagradas no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portu- guesa (CRP).  Com efeito, um aspeto tão decisivo como o prazo de interposição de recurso de decisão penal conde- natória não pode ficar dependente de uma ulterior ponderação acerca da procedência substancial do recurso, sob pena de o recorrente não dispor de meios para determinar, com um grau elevado de certeza, qual o prazo processual a que está sujeito. Em última instância, tal conduziria a que todos os recorrentes passassem, ad cautelam a interpor recursos sobre matéria de facto que envolvesse uma apreciação de prova gravada no prazo geral, mais curto, de 20 dias, sob pena de enfrentarem, a final, uma decisão de extemporaneidade. Em conclusão, considera-se que a interpretação normativa segundo a qual os recursos penais para reapre- ciação de prova gravada deixam de beneficiar do prazo alargado de interposição de 30 dias quando venham a ser rejeitados relativamente à matéria de facto – por exemplo, por falta de cumprimento das especificações exigidas pelo n.º 3 do artigo 412.º, do CPP, como ocorreu nos presente autos – afeta, de modo grave o princípio da segurança jurídica e da confiança jurídicas decorrentes do princípio do Estado de direito demo- crático (artigo 2.º da CRP) bem como o processo equitativo e as garantias de defesa do arguido consagradas no artigo 32.º, n.º 1, da CRP e padece, portanto, de inconstitucionalidade.

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