TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

377 acórdão n.º 80/13  O recorrente tinha, portanto, razões suficientes para apenas ter suscitado as questões de inconstitucio- nalidade que constituem objeto do presente recurso em sede de reclamação para a conferência do despacho de não admissão proferido pelo Relator junto do Tribunal da Relação de Évora.  Questão diversa é a de saber se em relação a cada uma das questões colocadas subsistem outros funda- mentos para o não conhecimento do objeto deste recurso, colocando-se este problema particularmente em relação à primeira questão.  Recorde-se que um dos pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade neste Tribu- nal é que exista coincidência entre a norma aplicada pelo tribunal recorrido e a norma cuja inconstituciona- lidade é suscitada pelo recorrente, de modo a que este último se possa pronunciar sobre ela. Sucede que, no caso em apreço, o modo como o recorrente configurou a norma constante do artigo 412.º, n.º 4, do CPP, não coincide com o modo como ela foi aplicada pelo tribunal recorrido.  Senão vejamos:  O recorrente configurou a norma, colocando o acento tónico “na identificação das concreta[s] provas que impõem decisão diversa da recorrida, indicando sempre o início e o fim de cada um dos depoimentos gravados, mesmo quando essas referências não constem da ata, sob pena de o recurso sobre a matéria de facto não poder ser apreciado” (fls. 518)”.  Pelo contrário, a ratio decidendi não se baseia na indicação do início e do fim de cada um dos depoimen- tos, mas sim na falta de especificação, por referência aos factos, nos moldes legalmente exigíveis, de quais as provas que no entender do recorrente imporiam decisão diversa (cfr. fls. 508, p. 15, da decisão do Tribunal da Relação de Évora).   Assim sendo, não existe coincidência entre a norma cuja inconstitucionalidade é suscitada pelo recor- rente e a norma aplicada pelo tribunal recorrido, pelo que não deve este Tribunal conhecer do objeto deste recurso quanto à primeira questão.  6. Passemos então à segunda questão de constitucionalidade, a qual – recorde-se – se relaciona com a interpretação normativa extraída “do artigo 411.º, n.º 1 do CPP conjugado com o n.º 4 do mesmo diploma legal no sentido de que é extemporâneo o recurso interposto para além do 20.º dia depois da leitura de sen- tença (e até ao 30.º dia) quando venha a ser rejeitado o recurso sobre a matéria de facto” (fls. 518).  O n.º 4 do artigo 411.º do CPP fixa um prazo mais longo de interposição de recurso – 30 dias –, quando esteja em causa recurso “que tiver por objeto a reapreciação da prova gravada”. Ora, a decisão recor- rida considerou que, não estando preenchidos os requisitos legais necessários à reapreciação da matéria de facto, o prazo previsto no n.º 4 do artigo 411.º do CPP não seria de aplicar, vigorando antes o prazo geral de 20 dias fixado pelo n.º 1 do mesmo preceito legal.  A questão da fixação de um prazo de motivação de recurso penal mais longo, quando esteja em causa a impugnação de matéria de facto, foi bastante discutida e controvertida antes da entrada em vigor da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, que procedeu a uma profunda revisão do CPP. Com efeito, antes dessa data, discutia-se sobre se era admissível a extensão do prazo geral de motivação, por força da aplicação subsidiária do n.º 6 do artigo 698.º do CPP (assim, ver acordão de fixação de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/12, de 8 de março de 2012, e, na doutrina, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 4.ª edição, 2011, p. 1136).  Ajuizando da alegada inconstitucionalidade de interpretação normativa que não permitia a extensão do prazo de motivação, por aplicação subsidiária daquela norma processual civil, este Tribunal concluiu pela improcedência daqueles argumentos, precisamente, num caso de impugnação de matéria de facto fundada na apreciação de prova gravada (cfr. Acórdão n.º 542/04, disponível in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ) , tendo, posteriormente, decidido “julgar inconstitucional, por violação dos princípios da segurança jurídica, da confiança e do processo equitativo, e das garantias de defesa consagradas nos artigos 2.º e 32.º, n.º 1, da Constituição, a norma dos artigos 411.°, n.º 3, 414.°, n. os 2 e 3, e 420.°, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de permitir ao tribunal ad quem a apreciação oficiosa da tempestividade do recurso que

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=