TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

362 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Coloca-se, por isso, com toda a pertinência a seguinte questão de constitucionalidade: é admissível à luz da Constituição a existência de pensões devidas a sinistrados por acidentes de trabalho não remíveis e que também não sejam atualizáveis de acordo com a inflação? 6. A resposta a tal questão dada no despacho recorrido e acolhida nas alegações do Ministério Público é inequivocamente negativa. E, na verdade, não se vislumbra qualquer razão legítima que justifique o impedimento legal de atualiza- ção das pensões insuscetíveis de remição, nos mesmos moldes em que as restantes pensões não remidas são atualizadas, ou seja, de acordo com os termos do artigo 82.º, n.º 2, da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, em articulação com o disposto no artigo 1.º, n.º 1, alínea c) , subalínea i) , do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de abril. É de subscrever o entendimento sufragado no despacho recorrido de que, tal como sucede nos casos das pensões remíveis não remidas ou das pensões sobrantes em resultado da remição parcial da pensão originária, também em relação às pensões correspondentes a uma incapacidade permanente parcial inferior a 30% “está em causa a manutenção do valor efetivo das pensões, importando garantir aos sinistrados um valor de reparação constante, que não se degrade conforme as flutuações da moeda”. Mais: há que assegurar a igualdade de tratamento, relativamente a todos os que auferem uma pensão não remível ratione valoris , independentemente do respetivo grau de incapacidade permanente parcial ser superior, igual ou inferior a 30%, porquanto a finalidade da pensão é em todos os casos o mesmo – trata-se de uma prestação destinada “a compensar o sinistrado pela perda ou redução permanente da sua capacidade de ganho resultante de acidente de trabalho” (cfr. o artigo 48.º, n.º 2, da Lei n.º 98/2009; nesta perspetiva, a pensão desempenha uma função substitutiva do vencimento para a subsistência do beneficiário, conforme tem sido salientado na jurisprudência deste Tribunal) – ; e tal finalidade fica irremediavelmente comprometida com a desvalorização monetária. Por idêntica ordem de razões, também se deve impedir – como refere o Mmo. Juiz a quo – “que os sinistrados em acidente de trabalho, afetados de uma incapacidade inferior a 30% mas com pensões supe- riores a seis vezes a retribuição mínima mensal garantida, sejam colocados numa situação de desvantagem em relação aos sinistrados com incapacidade inferior a 30%, mas que viram as suas pensões imediatamente remidas, não correndo assim o risco da desvalorização monetária”. Em suma, a não atualização das pensões de montante igual ou superior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida em vigor no dia seguinte ao da alta do trabalhador sinistrado que em consequên- cia do acidente de trabalho tenha ficado com uma incapacidade permanente parcial inferior a 30% viola o direito à justa reparação do trabalhador sinistrado consignado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f ) , da Constitui- ção, uma vez que não acautela a desadequação do quantitativo da pensão à função reparatória e compen- satória que lhe é inerente (neste sentido, cfr. o já referido Acórdão deste Tribunal n.º 302/99). Acresce que tal solução de não atualização, ao impor soluções diferentes relativamente a quantias que desempenham nos termos da Constituição e da lei função idêntica – como sucede relativamente às pensões remíveis não voluntariamente remidas, às pensões sobrantes determinadas em razão de prévia remição parcial e às pensões não remíveis compensatórias de incapacidade permanente parcial igual ou superior a 30% –, também não se mostra materialmente fundada, sendo por isso mesmo arbitrária. Com efeito, como se disse no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 546/11 (igualmente disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ) :  «(…) [É] ponto assente que o n.º 1 do artigo 13.º da CRP, ao submeter os atos do poder legislativo à observância do princípio da igualdade, pode implicar a proibição de sistemas legais internamente incongruentes, porque inte- grantes de soluções normativas entre si desarmónicas ou incoerentes. Ponto é, no entanto – e veja-se, por exemplo, o Acórdão n.º 232/03, disponível em www.tribunalconstitucional.pt – que o carácter incongruente das escolhas do legislador se repercuta na conformação desigual de certas situações jurídico-subjetivas, sem que para a medida de desigualdade seja achada uma certa e determinada razão. É que não cabe ao juiz constitucional garantir que

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