TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
348 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL informações financeiras, relacionadas com a sua atividade, para que aquela pudesse desempenhar todas as com- petências previstas na lei (n.º 1), devendo os respetivos pedidos de informações obedecer a princípios de ade- quabilidade ao fim a que se destinam e de proporcionalidade e serem devidamente fundamentados (n.º 3). O artigo 113.º, n.º 1, alínea sss) , do mesmo diploma, determinou que constituía contraordenação a vio- lação da obrigação de prestação de informações, ao abrigo dos n. os 1 e 3 do artigo 108.º, passando o conteúdo desta alínea, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 176/2007, de 8 de maio, à Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, a integrar a alínea ttt) . E no n.º 2 do artigo 113.º, na redação aplicada na decisão recorrida, previu-se a aplicação de uma coima de € 5 000 a € 5 000 000, para esta contraordenação quando praticada por pessoa coletiva. A invocação de inconstitucionalidade deduzida pela recorrente baseia-se, num primeiro argumento, na alegação de que a norma em causa viola o princípio da proporcionalidade porque sanciona um com- portamento que não é suficientemente censurável para que possa sofrer um juízo antijurídico na dimensão contraordenacional. No ilícito de mera ordenação social o objeto da valoração jurídica não é constituído apenas pela conduta, como tal, nele assumindo também especial relevância a proibição legal. É o substrato complexo formado pela conduta e pela decisão legislativa de a proibir que suporta a valoração da ilicitude (Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral , p. 162, 2.ª edição, Coimbra Editora). Daí que o conceito de culpa, no âmbito contraor- denacional, se distinga da censura ética dirigida à pessoa do agente e à sua atitude interna – característica do direito penal – consubstanciando-se antes numa imputação do facto à responsabilidade social do seu autor pela violação da proibição legalmente estabelecida ou pelo incumprimento do dever imposto por lei. Quanto à sanção principal, no âmbito contraordenacional – a coima –, esta assume um caráter patri- monial, representando uma mera admonição ou especial advertência, conducente à observância de certas proibições ou imposições legislativas e destinada a garantir a preservação da ordenação social estabelecida. No presente recurso está em causa o sancionamento do incumprimento de um dever de informação destinado a habilitar uma autoridade reguladora a cumprir as suas funções de supervisão e fiscalização no setor das comunicações. Não sendo as atividades económicas ligadas ao exercício do direito de iniciativa privada absolutamente livres, estando sujeitas a restrições e condicionamentos que resultam da necessidade de proteção do interesse público em geral e dos interesses de terceiros em particular, compreende-se que o legislador possa exigir dos particulares que queiram desenvolver tais atividades a máxima lealdade para com o Estado, especialmente quando estiverem defronte das autoridades reguladoras competentes, o que implicará que tenham um dever geral de colaborar com essas autoridades, nos termos legalmente impostos (P. de Sousa Mendes, em “O pro- cedimento sancionatório especial por infrações às regras de concorrência”, in Regulação em Portugal: Novos tempos, novo modelo?, p. 717, 2007, Almedina). Assim, a obrigação de prestar informações e entregar documentos à entidade reguladora surge como uma condição de eficácia da efetiva salvaguarda da necessidade de regulação, supervisão e fiscalização da ati- vidade económica, num domínio em que a colaboração dos agentes económicos se torna fundamental para o exercício de tais funções de excecional relevância pública. Ora, sendo necessário assegurar o cumprimento efetivo desta obrigação típica de uma Administração conformadora, o sancionamento da sua inobservância como contraordenação revela-se, como alternativa a uma legislação penal, o meio coativo adequado e proporcional a satisfazer tal necessidade. Num mundo de negócios a sanção patrimonial é a indicada para compelir os vários intervenientes a cumprir as regras públicas reguladoras da atividade económica. A previsão da contraordenação aqui sob fiscalização tem, pois, plena justificação como meio dissuasor da inobservância do referido dever de colaboração, não violando a ideia de proporcionalidade em sentido amplo, enquanto referência fundamental do controlo da atuação dos poderes públicos num Estado de direito.
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