TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

291 acórdão n.º 3/13 Não obstante, são vários os Acórdãos deste Tribunal relevantes para o presente caso que se pronuncia- ram sobre questões de constitucionalidade semelhantes e, assim, sobre interpretações normativas de tribunal superior que, indo no sentido da extemporaneidade do recurso, punham em causa, implicitamente, decisões de instância inferior, não recorridas, em matéria de prazos de interposição de recurso susceptíveis de modelar a conduta dos sujeitos processuais – vide, os Acórdãos n. os 39/04, 159/04, 44/04 e 722/04 (todos disponíveis em http://tribunalconstitucional.pt ). 6.3.1 Especial importância para o caso dos autos tem, pela sua similitude com o presente caso o Acórdão n.º 44/04, pois também aí a questão de constitucionalidade suscitada se prendia com a aferição, por tribunal superior, da tempestividade de recurso em matéria penal, pondo em crise decisão precedente proferida em primeira instância quanto à prorrogação de prazo processual para interposição de recurso (assim consti- tuindo o direito de intervenção processual dos arguidos) que não tenha sido objecto de impugnação. Nesse aresto, em tudo próximo do presente, “a questão de constitucionalidade suscitada (…) con- substancia‑se na eventual violação de princípios constitucionais relacionados com as garantias de defesa, a segurança jurídica e a confiança pelo critério normativo segundo o qual um tribunal superior, aferindo oficiosamente da tempestividade da interposição de um recurso em processo penal, ponha em causa decisões precedentes das instâncias quanto à prorrogação de prazos processuais, que não tenham sido objecto de qualquer impugnação. Com efeito, tendo sido prorrogado o prazo do arguido para recorrer da matéria de facto pela primeira instância, com base na aplicação subsidiária do artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, sem que tivesse havido qualquer impugnação, veio o Tribunal da Relação de Coimbra, oficiosamente, considerar intempestivo o recurso interposto pelo arguido dentro daquele prazo prorrogado. Está, assim, em causa, como ratio decidendi , ainda que implicitamente, o critério normativo derivado dos artigos 411.º, n.º 1, e 420.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, nos termos do qual o prazo consagrado em tais normas poderia ser estritamente aplicado por um tribunal superior, revogando um despacho judicial não impugnado que tenha concedido a prorrogação de tal prazo”. Foram então julgados inconstitucionais os artigos 411.º, n.º 1, e 420.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual tais normas permitiriam a destruição dos efeitos anteriormente pro- duzidos de uma decisão não impugnada da primeira instância quanto à prorrogação do prazo de recurso, por violação dos princípios da segurança jurídica e da confiança e das garantias de defesa consagrados, respecti- vamente, nos artigos 2.º e 32.º, n.º 1, da Constituição. Revendo a respectiva fundamentação: “No recurso sub judicio , a única questão relevante é a da alteração de uma decisão de primeira instância quanto à prorrogação de prazos com fundamento no disposto em normas reguladoras de prazos, que não contemplam qualquer possibilidade de prorrogação. Ora, a interpretação dos artigos 411.º, n.º 1, e 420.º, n.º 1, do Código de Processo Penal que faz decorrer dos mesmos uma força vinculativa que ultrapassa a situação jurídico processual resultante da não impugnação de decisão anterior que concedera a prorrogação do prazo põe manifestamente em causa a confiança jurídica que a estabilidade de uma decisão judicial não impugnada gera no arguido enquanto sujeito processual. Independentemente de se saber se a prorrogação dos prazos determinada pela decisão judicial de primeira ins- tância corresponde a uma interpretação correcta do direito ordinário, ou mesmo se aquela decisão quanto a uma prorrogação de prazo deveria ter sido notificada a todos os sujeitos processuais, é claro que, uma vez produzidos os efeitos dessa decisão, eles não poderiam ser posteriormente destruídos, abalando as expectativas do arguido relati- vamente ao prazo de que disporia para recorrer alicerçadas numa decisão judicial não impugnada. O princípio do Estado de direito impõe uma vinculação do Estado em todas as suas manifestações, e portanto também dos tribunais, ao Direito criado ou determinado anteriormente, de modo definitivo. Assim, não é legítimo que uma decisão ao abrigo da qual se constitua um direito de intervenção processual, ainda que baseada numa eventual interpretação errónea do direito, mas não arbitrária ou ela mesma flagrantemente violadora de direitos (o

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