TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
261 acórdão n.º 2/13 proibição da utilização por esta de informações que possam desrespeitar direitos de autor ou de propriedade indus- trial ou configurar práticas de concorrência desleal, nos termos do artigo 10.º da Lei n.º 65/93, estariam desde logo autorizadasconstitucionalmenteà partida pela própria expressão constitucional do conteúdo do direito. O principal argumento contra esta interpretação é o de o n.º 2 do artigo 268.º ter considerado necessária uma reserva de lei restritiva em matérias de segredos de Estado, de segredos de instrução criminal e de intimidade das pessoas, que na referida interpretação estariam igualmente excluídas do sentido imediato do direito de acesso. Haveria que dizer que no n.º 2 não se tem uma verdadeira reserva de lei, mas a simples remissão para a lei da definição de certos limites. De qualquer modo, a exacta delimitação dos documentos que podem ser comunicados e dos que permanecem sob sigilo na hipótese sub judice sempre exige uma cuidadosa ponderação do conflito de direitos e interesses consti- tucionalmente protegidos e uma demonstração da necessidade e proporcionalidade da recusa de acesso à informa- ção. Tal ponderação e, portanto, o recurso aos critérios do artigo 18.º sempre seriam adicionalmente necessários. Bastará, para tanto, observar que o direito de informação instrumental do direito à tutela jurisdicional expresso nos n. os 1, 4 e 5 do artigo 268.º e que a recorrente considera justamente apenas implícito nestes números, não tem qualquer conteúdo imediatamente expresso na Constituição, pelo que não tem sentido falar de limites imanentes desse conteúdo como limites à partida. Relativamente a tal direito, que, como vimos, é o único em causa neste processo, não valem as anteriores considerações acerca do n.º 2 do artigo 268.º Em geral, sempre que a solução de um conflito de direitos ou interesses constitucionalmente protegidos se faça pela proibição do exercício de um direito em certas circunstâncias, seja a proibição explícita, implícita ou obtida por remissão, têm justificação as cautelas constitucionais contra as leis restritivas. Ora na hipótese em crise trata- -se de justificar constitucionalmente uma proibição de acesso a documentos que interessam ao titular do direito à tutela jurisdicional para este mesmo efeito. Tem todo o cabimento as cautelas constitucionais. 11 . Demonstrada a possibilidade em abstracto de restrições aos direitos de informação previstos, quer no n.º 2 do artigo 268.º – que não está directamente em causa –, quer no n.º 1 do artigo 268.º, ou derivados dos n. os 4 e 5 do mesmo artigo, em situações de conflitos entre direitos fundamentais (ou interesses constitucionalmente prote- gidos), quer em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas, quer em outras matérias, falta demonstrar a necessidade e a proporcionalidade de restrições determinadas por situações de conflito em matéria de segredo comercial ou industrial, de direitos de autor ou de direitos de proprie- dade industrial, e de concorrência desleal, tendo em vista os critérios dos n. os 2 e 3 do artigo 18.º Como se disse no Acórdão n.º 282/86 ( Acórdãos cit., 8.º Vol., p. 223), o princípio da necessidade e da proporcionalidade – esta não é mais do que a necessidade não apenas da existência de restrição, mas de certa medida ou modo de restrição – enunciado no artigo 18.º, n.º 2 vale directamente para todas as medidas restritivas dos direitos fundamentais. A sua aplicação exige a definição genérica (“tem de revestir carácter geral e abstracto”: n.º 3 do artigo 18.º) das situações de conflito entre direitos fundamentais ou interesses constitucionalmente protegidos, o que equivale à enunciação das circunstâncias ou dos pressupostos de facto em que o direito prevalece e das circunstâncias ou dos pressupostos de facto em que o direito é restringido. As longas demonstrações da existência ou inexistência de necessidade e de proporcionalidade da restrição em determinados pressupostos constituem a substância quer das opiniões que fizeram vencimento como das vencidas no referido Acórdão n.º 282/86 (sobre a suspensão e o cancelamento dos direitos emergentes dos técnicos de contas), assim como, também por exemplo, no Acórdão n.º 103/87 (sobre restrições aos direitos fundamentais dos agentes da Polícia de Segurança Pública). Por outro lado, a proibição de “diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucio- nais” do n.º 3 do artigo 18.º não se refere ao seu conteúdo à partida ( prima facie ou a priori), mas ao seu conteúdo “essencial”, como resulta afinal do processo de interpretação e aplicação dos preceitos constitucionais, incluindo a solução dos conflitos entre direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. Quer isto dizer que a final sem- pre haverá circunstâncias ou pressupostos de facto em que o direito fundamental é reconhecido e que constituem o seu conteúdo essencial. Nesta medida, a proibição da parte final do n.º 3 é uma consequência do princípio da harmonização ou concordância prática dos direitos ou interesses em conflito que o Tribunal tem aplicado (cfr., por exemplo, os citados Acórdãos n. os 177/92, 113/97 e o Acórdão n.º 288/98 [ Diário da República , I Série-A,
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