TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

260 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL informação procedimental reconhecido no artigo 62.º extensivo às pessoas que provem ter tal interesse. Ora não há nenhuma razão para que limites do mesmo género não existam no caso do direito de acesso do n.º 2. É que se trata de um género de limites que existe qualquer que seja o modo de definição de um direito na Constituição, porque resultam simplesmente da existência de outros direitos ou bens, igualmente reconhecidos na Constituição e que em certas circunstâncias com eles conflituam, bem como da possibilidade de conflitos em certas circunstâncias entre direitos idênticos na titularidade de diferentes pessoas. Os conflitos não podem ser evitados a não ser pela previsão na Constituição dessas circunstâncias e pela consequente transformação dos elementos do conflito em elementos da definição dos direitos ou bens constitucionais em jogo. Ora a previsão exaustiva das circunstâncias que podem dar lugar a conflitos deste tipo é praticamente impossível pela imprevisibilidade das situações de vida e pelos limites da linguagem que procura prevê-las em normas jurídicas, além de que a Constituição nunca pretendeu regular por- menorizadamente, ou tão exaustivamente quanto possível, os direitos que consagra. Estas considerações aplicam- -se a todos os direitos fundamentais reconhecidos na Constituição. Todos esses direitos podem ser limitados ou comprimidos por outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos, sem excluir a possibilidade de conflitos entre direitos idênticos na titularidade de diferentes pessoas (pense-se, quanto ao direito à vida, no regime legal de legítima defesa e do conflito de deveres, e no dever fundamental de defesa da Pátria – artigo 276.º, n.º 1, da Constituição), sendo sempre necessário fundamentar a necessidade da limitação ou compressão quando ela não se obtém por interpretação das normas constitucionais que regulam esses direitos. 8. Não vale dizer, em contrário, que quando a Constituição consagra um limite expresso, seja ele uma reserva de lei, implica que nenhum outro limite foi desejado. Este argumento obviamente não procede. Ele subentende que o limite expresso, ou a reserva de lei, é uma excepção e que existe uma regra que proíbe a existência de outras excepções além das expressas. A primeira premissa não é verdadeira. A reserva de lei do n.º 2 é uma remissão da Constituição para a lei e não uma excepção constitucional a normas constitucionais. É certo que da existência de uma remissão explícita não se deduz qualquer outra remissão e pode deduzir-se o carácter excepcional da remissão. Assim o n.º 2 do artigo 268.º implica que em matérias que não sejam relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas, o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos não tem à partida ( prima facie, a priori) os limites que resultam da lei nestas matérias. Nessas outras matérias apenas pode ter a posteriori os limites que resultam da solução constitucional das situações de conflito com outros bens ou inte- resses constitucionalmente protegidos, que são os únicos que valem para os direitos de informação procedimental ou instrumental do direito de tutela jurisdicional dos n. os 1, 4 e 5 do artigo 268.º (…) 9. É claro que as considerações antecedentes só são relevantes no pressuposto de que os direitos de acesso à informação administrativa consagrados no artigo 268.º são direitos fundamentais de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias enunciados no título II da Constituição (artigo 17.º da Constituição), para os efeitos da apli- cação do regime do artigo 18.º O Tribunal já afirmou o pressuposto nos Acórdãos n os 177/92 e 234/92 ( Acórdãos cit., p. 22, p. 401, p. 603), a isso não obstando certamente a dimensão institucional desses direitos, especialmente no caso do princípio do arquivo aberto do n.º 2 do artigo 268.º dirigido aos cidadãos (semelhantemente ao direito de acesso aos cargos políticos, como igualmente se decidiu nos Acórdãos n os 225/85 [p. 799] e 244/85 [p. 218, de modo dubitativo]). 10. Um segundo pressuposto da aplicação do regime do artigo 18.º é ainda o de que os limites ao direito de informação de que se trata no caso não estejam desde logo determinados à partida pela definição constitucional do objecto do direito. Ora, a definição constitucional do objecto de um direito fundamental implica por vezes limites que resultam, é certo, da possibilidade de situações de conflito com outros direitos ou interesses constitu- cionalmente protegidos, mas que já integram, tendo em conta o elemento histórico da interpretação, o próprio sentido das palavras que definem o direito. “Exprimir e divulgar livremente o seu pensamento” (artigo 37.º, n.º1) dir-se-á, significa coisa diferente de “difamar” ou “caluniar”, ou mais geralmente, “mentir” ou “ofender” (excluindo o uso de expressões ofensivas do domínio de protecção do direito, cfr. o Acórdão n.º 81/84, Acórdãos cit., 4.º Vol., p. 233). Poderá, assim, discutir-se se o direito do acesso aos arquivos e registos administrativos não exclui à partida o direito de revelação de segredos comerciais e industriais que deles constam. Nesta perspectiva, a recusa de acesso a documentos que ponham em causa segredos comerciais e industriais, por parte da Administração, e a

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