TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

226 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL é exigido à jurisdição constitucional, deve fazer-se (e só pode fazer-se) por intermédio da aplicação do prin- cípio da proporcionalidade. O juízo quanto à razoabilidade da medida da diferença – a acrescer quanto ao juízo relativo á racionalidade ou inteligibilidade da sua própria razão de ser – é um juízo que só pode fazer- -se utilizando os instrumentos que os “testes” da proporcionalidade conferem ao Tribunal. Nisto consiste, segundo entendemos, o princípio da igualdade proporcional. No entanto, a intensidade do escrutínio que a aplicação deste princípio confere ao Tribunal não é fixa, antes variando de acordo com as matérias legisladas. Matérias há em que a intensidade do escrutínio é, e não pode deixar de ser, de grau particularmente elevado. E tal ocorrerá sempre que o legislador estabelecer diferenças entre as pessoas com base em razões, ou critérios, que, à partida, a Constituição exclui que possam servir para fundamentar tratamentos diversos, quaisquer que eles sejam. Nestas circunstâncias, o escrutínio do tribunal será seguramente severo, cabendo ao legislador a demonstração da “bondade” da sua escolha. Fora destas maté- rias, porém, o juízo de igualdade proporcional manter-se-á (como sempre o tem dito o Tribunal) como um juízo de controlo externo das ações do legislador, que pode conduzir à invalidação de escolhas legislativa que sejam à evidências desrazoáveis – quer no seu fundamento quer na sua medida –, mas que não leva, nem pode levar, a que o Tribunal se coloque na situação do legislador, escolhendo em vez dele a melhor solução. 4. A Constituição não veda, à partida, que se estabeleçam diferenças entre os cidadãos que percebem por verbas públicas e os outros, sempre que estão em causa (como o estão agora) razões de diferenciação dotadas do peso constitucional que detêm aquelas que se relacionam com os imperativos de consolidação orçamental. Isso mesmo o reconheceu o Tribunal no Acórdão n.º 396/11. Assim sendo, a matéria sobre a qual, no caso, incide o juízo do Tribunal não pertence seguramente ao grupo daquelas que requerem a adoção do mais severo ou intenso escrutínio jurisdicional. Dizendo de outro modo: a matéria sobre a qual, no caso, incide o juízo do Tribunal não pertence ao grupo daquelas em que, por exigência da Constituição, se devolve ao legislador o ónus da demonstração da “bondade” das suas escolhas. É tendo em conta este dado, para nós impostergável, que se deve recordar o modo pelo qual o Tribunal – nas circunstâncias anteriores em que foi chamado a sindicar a constitucionalidade de normas do orçamento do Estado – aferiu o critério de aplicação do princípio da igualdade proporcional. 5. Tanto no Acórdão n.º 396/11 quanto no Acórdão n.º 353/12 foi o princípio densificado através de um duplo teste, que incidiu em especial sobre o modo de aferição da “medida da diferença”. Com coerência argumentativa, o Tribunal começou por averiguar da razão ou do fundamento da diferença estabelecida pelo legislador entre os cidadãos que eram alvo das medidas de redução remuneratória e os outros, que do âmbito de aplicação dessas medidas estavam excluídos. Depois, averiguou da medida da diferença, e da sua propor- cionalidade. Para tanto, usou um duplo teste: (i) o de saber se, à evidência, podiam as medidas escolhidas pelo legislador (as reduções remuneratórias) ser tidas como dispensáveis; (ii) o de saber se elas se continham ainda dentro dos limites do sacrifício (imposto a quem era chamado a contribuir para os encargos públicos). Podere- mos designar este standard de julgamento como contendo o teste negativo da não evidência da dispensabilidade e o teste positivo da contenção dentro dos limites do sacrifício. Na verdade, através dele o Tribunal fixou o seu próprio standard: os encargos especiais impostos pelo legislador seriam ainda conformes à Constituição con- quanto, cumulativamente, não fosse evidente a sua dispensabilidade (teste negativo); e se contivessem ainda tais encargos no âmbito da “justa medida da diferença” ou dos “limites do sacrifício” (teste positivo). Foi por, em 2011, se terem confirmado ambos os testes – na medida em que a primeira questão recebeu resposta negativa e a segunda resposta positiva – que se chegou a um juízo de não inconstitucionalidade. Mas já em 2012 o Tribunal respondeu afirmativamente à segunda questão. Tendo em conta a natureza logi- camente cumulativa que os estalões dos dois testes apresentam, tal conduziu, inevitavelmente, ao juízo de inconstitucionalidade. É este juízo que agora se repete, e é dele que dissentimos.

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