TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

222 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL É certo que a Lei do Orçamento do Estado de 2013 sofre as limitações e constrangimentos decorrentes das fortíssimas dificuldades financeiras por todos reconhecidas e obedece à vinculação assumida no Plano de Assistência Económica e Financeira (PAEF) celebrado com o Fundo Monetário Internacional, o Banco Cen- tral Europeu e a Comissão Europeia, no âmbito do qual são acordadas metas orçamentais bastante exigentes e com calendarização até 2014. Mas não é menos certo que as vinculações e a incidência de limites sobre o défice orçamental e a dívida pública no plano europeu não se esgotam nesse plano de assistência económica e financeira balizado tem- poralmente. Essas condicionantes vinculativas decorrentes de fontes normativas a que Portugal se encontra adstrito, nos termos do artigo 8.º da Constituição, encontravam-se presentes há largos anos [artigo 104.º do Tratado que estabelece a Comunidade Europeia (TCE) e 126.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)], antes do momento de assunção do quadro normativo decorrente do PAEF em que se esteia a reiteração da medida de corte de vencimentos. E, permanecendo os fatores que determinam as necessidades de financiamento, mostra-se fundado antecipar que irão exigir esforços e sacrifícios para além do horizonte temporal do PAEF, com intensidade não inferior ao que nele se estipula. Como, igualmente, no plano prospetivo, a partir do elevado montante atingido pela dívida pública, encontra cabimento ter em consideração a possibilidade de recurso a mecanismos de assistência recente- mente erigidos no âmbito europeu, em especial, ao Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE). Nesse qua- dro, eventual, mantém-se a exigência de celebração de memorando de entendimento e formulação de plano de ajustamento (cfr. artigos 13.º a 16.º do Tratado que instituiu o MEE, assinado em 2 de fevereiro de 2012). Perante tal panorama, esperava-se que o legislador integrasse a medida numa estratégia de consolidação orçamental que conduzisse à sua reversão, finalizado o PAEF, com o mesmo grau de segurança e certeza em que se apoia a sua instituição. De acordo, aliás, com a natureza excecional e temporária (mesmo que plurianual) com que fora considerada no Acórdão n.º 396/11, ou seja, como medida de consolidação orçamental one-off . Porém, o relatório do Orçamento do Estado de 2013, não sinaliza qualquer programação de reversão do corte salarial, concretizadora da sua temporalidade (assim também aconteceu com o documento de estratégia orçamental 2012-2016, apresentado em Abril de 2012). Na verdade, e em formulação que se aproxima da estipulação unilateral de cláusula cum potuerit , condiciona a duração da medida (entenda-se, a sua reiteração em sucessivos orçamentos) à “verificação de um equilíbrio efetivo das contas públicas”, ao mesmo tempo que remete a sua abordagem para o domínio da “política de rendimentos” e de “racionalização dos custos com pessoal”. Ou seja, remete para o plano duradouro, como patamar remuneratório, perspetiva que não se altera com a possibilidade, até pelo efeito da erosão monetária, de se virem no futuro a atingir os níveis salariais nominais anteriores à ablação operada em 2011 e mantida no orçamento de 2012. Assim sendo, mostra-se legítimo questionar a legitimidade constitucional de medida restritiva, que onera especialmente em tempo de crise económica quem desempenha funções que implicam a perceção de remunera- ção através de verbas públicas – sem esquecer que no universo de afetados encontram-se sujeitos que desempe- nham atividade no sector empresarial do Estado em concorrência direta com empresas privadas – e se cumula já por três anos consecutivos, apoiado primacialmente na praticabilidade derivada da suscetibilidade direta e ime- diata da retenção da prestação pecuniária por parte do ente Estado, optando pela veste de Estado-empregador. Independentemente do juízo formulado no Acórdão n.º 396/11, nos parâmetros valorativos em que se moveu a Lei do Orçamento do Estado de 2011, quanto à introdução da medida do corte salarial dirigida ape- nas aos servidores públicos – categoria de pessoas cuja vinculação especial à prossecução do interesse público não pode significar a limitação da vida privada e familiar e habilitação a posição de desfavor na perceção de direitos de natureza patrimonial por referência a outros credores de prestações públicas –, não creio que se possa mais configurar esse sacrifício discriminatório, no terceiro ano de aplicação, e com funcionalização genérica e ambígua ao “equilíbrio efetivo das contas públicas”, como materialmente justificado. Não basta a sua apresentação como medida de política financeira basicamente conjuntural, de combate a uma situação de emergência, por definição passageira e de curto prazo. Como criteriosamente apontou o Conselheiro Vítor Gomes em declaração de voto aposta no Acórdão n.º 353/12 “o decurso do tempo implica um acréscimo

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