TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

219 acórdão n.º 187/13 n.º 8) –, se insere no quadro de análise do princípio da confiança, configurado como corolário e exigência do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa), e do prin- cípio da proporcionalidade ( idem ). Na análise e aplicação destes princípios na situação vertente chegamos, todavia, a uma conclusão inversa à do presente Acórdão pois, segundo cremos, ambos se mostram ofendidos pelas normas legais em presença. 3.1 Quanto aos requisitos da tutela jurídico-constitucional da confiança segundo os quais é necessário que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expec- tativas» de continuidade, que tais expectativas sejam legítimas, justificadas e fundadas em boas razões, terem os privados feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento estadual» e, por último, que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continui- dade do comportamento que gerou a situação de expectativa (cfr. Acórdãos n.º 128/09 e, posteriormente, n.º 188/09 e n.º 3/10), deve desde logo considerar-se que a previsão pelo legislador de uma Contribuição Extraordinária que abrange, de modo universal, o conjunto das pessoas que já adquiriram a qualidade de beneficiários de um direito social a uma prestação a título de pensão de aposentação ou reforma ou equi- parada, qualquer que seja o regime ou regimes por que se encontram abrangidos e independentemente da natureza, pública ou privada, das verbas devidas e da consideração da duração das carreiras contributivas, não cai na zona de previsibilidade de comportamento dos poderes públicos. Por um lado, não obstante a evolução legislativa verificada mencionada no presente Acórdão, em especial desde a década de noventa, no sentido, designadamente, da alteração da fórmula de cálculo das pensões e do estabelecimento de uma limitação do montante da pensão no regime geral da segurança social e da convergên- cia entre o sistema de proteção social dos trabalhadores da função pública e aquele regime geral, certo é que o financiamento do sistema, na sua vertente previdencial, caracterizado como um sistema de repartição, tem assentado, no essencial, em prestações obrigatórias devidas pelos empregadores, públicos ou privados, e pelos que exercem uma atividade laboral (denominadas pela lei «contribuições» e «quotizações») – sem prejuízo de contribuições facultativas, resultantes de uma opção individual, para o regime complementar. Por outro lado, a expectativa de continuidade no que toca à não contribuição de todos os que já são beneficiários (tendo já contri- buído) para o financiamento do sistema de segurança social também não se pode ter por invertida pela previsão de uma medida com idêntico nome na Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (artigo 162.º, n.º 1) e na Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro (artigo 20.º, n.º 1 e n.º 15) – tendo em conta, em especial, o âmbito con- finado de incidência desta medida e o limiar quantitativo da sua aplicação, sem paralelo na medida em análise. Entende-se que a medida controvertida também frustra expectativas legítimas, justificadas e fundadas em boas razões dos respetivos destinatários, por a qualidade de beneficiário de um direito a uma prestação social com fundamento constitucional e legal já ter sido adquirida por força do preenchimento dos pres- supostos de que depende a sua atribuição e que o legislador, no âmbito da sua livre margem de apreciação, fixou; expectativas fundadas, em especial, no caso de as pessoas afetadas pela medida registarem carreiras contributivas longas e, ainda, no caso de pensões na eventualidade de velhice (ou invalidez na medida em que sejam abrangidas), determinadas pela dificuldade ou mesmo impossibilidade de exercício de uma atividade profissional remunerada que possa compensar a ablação decorrente da medida em causa. Quanto ao requisito da tutela jurídico-constitucional da confiança que impõe que os privados tenham feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento estadual» entende-se que o mesmo também se verifica por a prestação percebida a título de pensão ou reforma ou situação equipa- rada ser aquela que permitirá, em regra, custear a subsistência, manter práticas vivenciais, garantir a autono- mia e fazer face a compromissos assumidos e, inclusive, a gastos inerentes à qualidade de idoso – qualidade que terá a generalidade dos pensionistas com carreiras contributivas longas ou completas – ou de inválido. Por fim, quanto à ocorrência de razões de interesses público que justifiquem, em ponderação, a não con- tinuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa – e, assim, a prevalência das mesmas sobre a tutela da posição jurídico-subjetiva dos pensionistas abrangidos pela medida – e dada a sua invocação, nos

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