TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
216 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL expressão de uma medida excecional e transitória, não definitiva, justificada em face do interesse público de contenção da despesa pública e de redução do défice para tanto invocado. Não obstante subsiste, em nosso entender, uma questão que deve ser apreciada não na perspetiva da medida da diferença entre os destinatários das medidas em causa e os demais cidadãos, mas na perspetiva dos efeitos da medida dentro do universo dos seus destinatários. Com efeito, na sua formulação – e como se revela evidente por aplicação do n.º 2 do artigo 29.º da Lei n.º 66-B/2012, e do n.º 4 do artigo 77.º da mesma Lei – a medida de «suspensão do pagamento do subsídio de férias ou equivalente» prevista naqueles artigos abrange trabalhadores do setor público e pensionistas pagos por verbas públicas que auferem menores rendimentos, abrangendo a faixa entre os 600 e os 1100 euros men- sais, estando o primeiro destes limites próximo do mínimo de existência em termos de rendimento líquido de imposto previsto no n.º 1 do artigo 70.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares. Secundando-se a fundamentação do Acórdão na parte que respeita à não atribuição de estatuto jusfun- damental ao direito à irredutibilidade do montante da retribuição (cfr. n.º 26), extensivo, por identidade de razão, à prestação pecuniária correspondente ao subsídio de férias ou a quaisquer prestações correspondentes ao 14.º mês, merecerá especial tutela a situação daqueles que, auferindo retribuições ou pensões mais bai- xas, ainda são abrangidos pelas medidas em análise. Estas medidas devem ser apreciadas tendo em conta a remuneração anual no seu todo considerada e o impacto sobre a capacidade de fazer face à subsistência, a práticas vivenciais em razão do agregado familiar compatíveis com uma existência condigna e autónoma e a encargos e compromissos assumidos. Não se afigura desrazoável supor que no segmento de rendimentos em causa o rendimento disponível para fazer face a onerações de rendimento justificadas por motivos de inte- resse público, seja muito diminuto ou mesmo inexistente, por todo o rendimento ser alocado à satisfação de necessidades essenciais inerentes à existência e a compromissos básicos que concorram para essa existência, como o custo da habitação, da alimentação, da saúde e dos transporte – e outros custos, designadamente os derivados de outros direitos fundamentais como o direito à educação ou o acesso à cultura. Por essa razão, as medidas de suspensão do subsídio de férias ou equivalente, ainda que em parte, no que respeita ao segmento em causa, de rendimentos menos elevados representam face aos fins de interesse público por elas visados, um sacrifício que ultrapassará os limites de exigibilidade requeridos pelo princípio da pro- porcionalidade. Neste sentido mostrar-se-á desrespeitada uma das dimensões do princípio da igualdade pro- porcional, decorrente dos artigos 2.º e 13.º da Constituição da República Portuguesa, na comparação entre os fins de interesse público e os meios em causa para os prosseguir por o sacrifício exigido ao segmento em causa assumir uma intensidade acrescida face aos demais abrangidos pela medida. Pelo exposto nos pronunciámos no sentido da inconstitucionalidade das normas do n.º 2 do artigo 29.º e do n.º 4 do artigo 77.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro. B) Divergi quanto à decisão expressa na alínea e) da decisão do presente Acórdão no que respeita às normas do artigo 78.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, pelas razões essenciais que de seguida se explicitam. 1. O artigo 78.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, institui uma medida denominada «Contribui- ção Extraordinária de Solidariedade» que, no essencial – independentemente da sua perspetivação, na prática, como medida de redução de despesa ou de aumento de receita – se traduz numa ablação, com caráter progres- sivo, das prestações devidas em razão da qualidade de aposentado, reformado, pré-aposentado e equiparado. O juízo de não inconstitucionalidade formulado pela maioria parece residir, no essencial, na inexistência de qualquer ofensa ao princípio da proteção da confiança e ao princípio da proporcionalidade. Divergimos todavia da conclusão alcançada. 2. No percurso que nos leva a diferente conclusão, afiguram-se relevantes os seguintes aspetos. Em primeiro lugar, a configuração abrangente e unitária da medida. Configurada de modo abrangente – quer quanto ao âmbito objetivo de incidência no que respeita às prestações abrangidas, quer quanto ao âmbito subjetivo no que respeita aos beneficiários e entidades processadoras das prestações abrangidas (cfr. n.º 3 do
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