TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
200 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acresce que a mesma contribuição não toma em consideração, a qualquer título, as necessidades do agregado familiar – sendo certo que, por força da alínea f ) do n.º 2 do artigo 67.º da Constituição, incumbe ao Estado, para proteção da família, “regular os impostos e os benefícios sociais, de harmonia com os encar- gos familiares”. Enquanto tributação autónoma em relação ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, não são tomadas em consideração na CES quaisquer mecanismos ou técnicas que permitam acomodar os encargos familiares, como é o caso do método do quociente conjugal, acompanhado no orde- namento fiscal português de um sistema de deduções à coleta. Ora, como se decidiu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 57/95, “o princípio da igualdade é desrespeitado quando pessoas em condições iguais pagam impostos desiguais”. Assim, os rendimentos dos pensionistas são afetados mais penosamente em sede de tributação incidente sobre o rendimento pessoal do que os rendimentos de várias outras categorias de contribuintes. E não se vislumbra a justificação para tal penalização, independentemente da proveniência pública ou privada das pensões e da concreta capacidade contributiva dos pensionistas. O artigo 78.º da Lei do Orçamento do Estado para 2013 viola, pelo exposto, o artigo 104.º, n.º 1, da Constituição. 2. Mas o mesmo preceito suscita preocupações adicionais. Com efeito, a CES é não apenas híbrida, mas, na parte em que se reporta aos regimes especiais e com- plementares, antissistémica. Como o próprio Acórdão deixa transparecer, o sistema de segurança social não é monolítico: ao lado do sistema previdencial, de natureza obrigatória e assente no princípio da contributivi- dade, há que considerar outras realidades, como os sistemas complementares, que são facultativos e de base não necessariamente contributiva. O tratamento uniforme de realidades tão díspares conduz inevitavelmente a injustiças. Por outro lado, mesmo as necessidades de reforma dos sistemas previdenciais públicos (o geral e o específico da função pública) também não podem deixar de considerar diversas especificidades e de atender à proteção da confiança legítima. 3. Em primeiro lugar, no que se refere ao sistema previdencial e ao regime de proteção social convergente (vide, respetivamente, a Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, artigos 50.º a 66.º, e a Lei n.º 4/2009, de 29 de janeiro), não pode excluir-se em absoluto a admissibilidade de uma medida extraordinária de redução de des- pesa – como, por exemplo, a redução das pensões – paralela àquela que foi adotada em relação aos trabalhadores da Administração Pública. Se é certo que ambos os regimes previdenciais em causa funcionam com base num sistema de repartição, os mesmos, devido ao seu subfinanciamento estrutural, exigem em cada ano um contri- buto do Orçamento do Estado. E, numa situação de exceção como aquela que se vive, não deve ser afastada a possibilidade de os respetivos beneficiários serem chamados a dar o seu contributo para o esforço de consolida- ção global. Tal solução justifica-se tanto mais quanto a alternativa a tal contributo passaria por exigir um esforço acrescido aos atuais contribuintes para o sistema – os trabalhadores presentemente no ativo – sendo certo que os mesmos, por força das indispensáveis reformas no sistema da segurança social já realizadas e a realizar, e da evolução menos positiva da demografia, (já) estão neste momento a contribuir para o pagamento de pensões de valor muito superior àquele de que alguma vez irão poder beneficiar ao abrigo do mesmo regime previdencial. Porém, uma coisa são as medidas pontuais de caráter excecional em vista de estabilização orçamental, outra, bem diversa, é a introdução de medidas corretivas e a aplicação do princípio da justiça ou solidarie- dade intergeracional com vista a assegurar a autossustentabilidade do próprio sistema. Não se pretende negar a necessidade ou conveniência de tais medidas reformadoras. As mesmas, todavia, carecem de ser pensadas e concebidas dentro do próprio sistema como uma sua reforma estrutural. Tal não se compadece nem com um limiar mínimo de aplicação tão elevado como o referido no artigo 78.º, n.º 1 (pensões acima de 1 350 € ) nem com o tratamento indiferenciado de situações tão diversas (ao longo do tempo a base de cálculo da pen- são variou muito – há quem tenha pensões calculadas com base em cinco, dez ou trinta anos de contribui- ções). Numa eventual reforma promotora da autossustentabilidade do sistema haverá que respeitar, ao lado da justiça intergeracional, também a justiça intrageracional. Do mesmo modo, haverá que atender à situação
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