TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013

155 acórdão n.º 187/13 58. Nestes termos, é lícito concluir que a jurisprudência constitucional portuguesa é cautelosa no que res- peita à tutela, sustentada no direito à segurança social, de posições jurídicas concretas dos pensionistas. Ou seja, tem-se entendido que os requisitos exigidos para se adquirir o direito à pensão, bem como as regras de cálculo ou a quantia efetiva a receber, ainda que cobertos pelo princípio da proteção da confiança, poderão ceder, den- tro de um limitado condicionalismo, perante o interesse público justificativo da revisibilidade das leis. É certo que, no aresto acima mencionado (Acórdão n.º 3/10), estavam em causa as expectativas, even- tualmente tuteladas do ponto de vista jurídico, dos futuros pensionistas. Ou seja, tratava-se, então, no fundo, de “direitos a constituir”. No que respeita à questão ora em análise, a situação não é exatamente idêntica, uma vez que estão em causa “direitos já constituídos”, posições jurídicas de cidadãos que adquiriram defi- nitivamente o estatuto de pensionistas, com um conteúdo já perfeitamente definido pelas regras legais em vigor, no momento relevante para o seu cálculo. Este facto não é, no entanto, suficiente, do ponto de vista do direito à segurança social, para fundamentar posição distinta da assumida anteriormente pelo Tribunal quanto às regras de cálculo da pensão. Repare-se que as alterações ao regime da aposentação da função pública então em causa atingiam a gene- ralidade dos funcionários e não apenas aqueles que se encontrassem em início de carreira, incluindo aqueles que se encontravam a pouco tempo de poder requerer o estatuto de aposentados. Em regra, os cidadãos nesta situação passaram a ter direito a uma pensão calculada com base em duas parcelas: uma de acordo com o estatuto anterior e outra, respeitante ao tempo de serviço posterior às alterações ao regime legal. Nestes termos, viram-se afetados pela alteração legislativa trabalhadores da Administração Pública com um longo período de tempo de serviço e que eram titulares de uma legítima e forte expectativa jurídica, tendo então o Tribunal entendido que esse facto não era bastante para fundamentar um juízo de inconstitucionalidade, face à gravidade do interesse público então em causa (a sustentabilidade do sistema de pensões), cuja salvaguarda fundamentava o reconhecimento de uma ampla liberdade de conformação por parte do legislador. Ora, na presente situação, é igualmente indiscutível a existência de um interesse público relevante – a necessidade de garantir a sustentabilidade económico-financeira do Estado –, pelo que, do ponto de vista do princípio da igualdade, não existe uma diferença muito significativa entre aqueles que adquiriram já o esta- tuto de pensionistas e os trabalhadores que, contando já com uma longa carreira contributiva, se encontram prestes a preencher os requisitos legais para atingirem a mesma condição jurídica. 59. É, assim, de concluir que o reconhecimento do direito à pensão e a tutela específica de que ele goza não afastam, à partida, a possibilidade de redução do montante concreto da pensão. O que está constitucio- nalmente garantido é o direito à pensão, não o direito a um certo montante, a título de pensão. Este resulta da aplicação de critérios legalmente estabelecidos, mas de valor infraconstitucional. A única norma constitucional que tem incidência no montante da prestação é a do n.º 4 do artigo 63.º, que manda contabilizar “todo o tempo de trabalho” para o cálculo das pensões de velhice e de invalidez, inde- pendentemente do setor de atividade em que tiver sido prestado. O que se pretende, no entanto, aí salientar é o “princípio do aproveitamento total do tempo de trabalho”, permitindo a acumulação dos tempos de trabalho prestados em várias atividades e os respetivos descontos para os diversos organismos de segurança social (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, p. 819), o que não justifica, em si, a garantia de um determinado valor da pensão devida a um trabalhador em situação de aposentação. 2. O direito à pensão como manifestação do direito de propriedade (artigo 62.º da Constituição) 60. Como decorre da argumentação dos requerentes do processo n.º 5/13, pode estar também em causa o direito à propriedade privada, na sua vertente de propriedade societário-pensionista, protegido pelo artigo 62.º da Constituição. No âmbito jurídico germânico, é corrente e generalizadamente aceite, quer pela doutrina, quer pela juris- prudência constitucional, a extensão do âmbito de proteção da garantia da propriedade privada às posições

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