TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 86.º Volume \ 2013
154 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL princípios pertinentes, e em particular o da tutela da confiança, são repetíveis, mutatis mutandis , os ele- mentos argumentativos anteriormente utilizados, ou se o estatuto de aposentado ou reformado interpela diferentemente as valências protetivas desses princípios, por forma a fundamentar um juízo não coincidente. 1. O direito à pensão como manifestação do direito à segurança social (artigo 63.º da Constituição) 57. O direito a receber uma pensão de aposentação foi definido por este Tribunal, no Acórdão n.º 72/02, como uma manifestação do direito à segurança social reconhecido a todos no artigo 63.º da Constituição, radicado no princípio da dignidade da pessoa humana, ínsito nos artigos 1.º e 2.º da Constituição, que visa assegurar, designadamente, àqueles que terminaram a sua vida laboral ativa, uma existência humanamente condigna. Considerou ainda o Tribunal que algumas dimensões do direito à pensão de aposentação – como é o caso da contagem do tempo de serviço para efeitos de aposentação – podem ter natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, aplicando-se-lhe o regime destes, constante do artigo 18.º da Constituição (veja-se o teor do Acórdão n.º 411/99). Mais recentemente, no Acórdão n.º 3/10, que versou sobre as alterações ao regime legal da aposentação dos trabalhadores da Administração Pública, quer no que se refere às condições de aposentação, quer no que con- cerne ao cálculo da pensão, o Tribunal entendeu (na linha de jurisprudência anterior, designadamente do Acór- dão n.º 188/09) que o controlo da constitucionalidade das normas em causa deveria limitar-se ao confronto com os princípios fundamentais do Estado de direito democrático, entre os quais o da igualdade ou o da tutela da confiança legítima. Por estar em causa um direito económico, social e cultural (o direito à segurança social do qual decorre o direito dos pensionistas), em tudo o que vá para além de um conteúdo mínimo, ou nuclear, as concretizações legislativas específicas do direito à segurança social estão, no entender do Tribunal, sujeitas a uma larga margem de livre conformação por parte do legislador. Nestes termos, pode ler-se no Acórdão citado: «Deve, contudo, deixar-se claro que o direito à segurança social, previsto no artigo 63.º, n.º 1, da Constituição, “como um todo”, é um direito de natureza essencialmente económica e social, sendo portanto passível de uma maior margem de livre conformação, por parte do legislador, do que a generalidade dos direitos, liberdades e garan- tias, uma vez que a sua aplicabilidade direta (não estando excluída), é necessariamente mais limitada como se infere do artigo 18.º, n.º 1, da Constituição. Não há dúvida de que “os direitos sociais contêm também − ou podem conter − um conteúdo mínimo, nuclear ou, porventura essencial diretamente aplicável” (Rui Medeiros, in Cons- tituição da República Portuguesa Anotada , org. Jorge Miranda/Rui Medeiros, Tomo I, Coimbra Editora, p. 634). Mas é certo, também, que esse conteúdo mínimo ou nuclear diretamente aplicável tem um âmbito relativamente mais restrito do que nos direitos, liberdades e garantias e que, portanto, o legislador sempre manterá, em matéria de direitos económicos e sociais, uma mais ampla margem de livre conformação. […] Sendo o direito à segurança social um direito de caráter essencialmente económico e social, a sua realização depende, sobretudo, de prestações positivas de terceiros, isto é, dos atuais contribuintes para o sistema de segurança social e, em última análise, do Estado. Isso explica que, por regra, o seu conteúdo não se possa definir de forma independente da legislação. É ao legislador que incumbe fazer as necessárias ponderações que garantam a sustenta- bilidade do sistema e a justiça na afetação de recursos. Deste modo, a mera sucessão de leis no tempo em matéria de segurança social não é, em geral, passível de afetar o próprio direito à segurança social “como um todo”, salvo os casos em que esteja em causa o mínimo de existência condigna, o que não sucede na situação em análise, em que as alterações legislativas estão muito longe de traduzir uma supressão da proteção mínima àqueles que, por força da idade, perderam a capacidade de auferir rendimentos pelo trabalho. O direito à segurança social não é, de modo algum, um direito imune à possibilidade de conformação legisla- tiva. As condições de acesso ao direito à aposentação e a concreta forma de cálculo das respetivas pensões não são intocáveis pelo legislador, podendo este legislar de modo a definir tais condições e tal valor.»
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