TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012

429 acórdão n.º 618/12 reservando-se para o Tribunal o papel de árbitro e garante último da democraticidade da vida partidária. Trata-se do princípio da intervenção mínima do Tribunal Constitucional na vida interna dos partidos. Segundo este princípio, o Tribunal Constitucional só deve intervir «quando a violação da Constituição e da lei – e, em especial, dos direitos fundamentais dos respetivos militantes – seja grave e manifesta» (Miguel Prata Roque, “O Controlo Jurisdicional da Democraticidade Interna dos Partidos Políticos – O Tribunal Constitucional entre o princípio da intervenção mínima e um contencioso de plena jurisdição” in AA VV , 35.º Aniversário da Constituição de 1976 , vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2012, pp. 281 e segs., em espe­ cial pp. 293 e 310 e segs.). Para que a intervenção do Tribunal se justifique, não basta, portanto, a mera violação de um preceito estatutário, mesmo que esse preceito se integre nas «regras essenciais relativas à competência ou ao funcio- namento democrático do partido». A violação da regra em causa deve ser de tal ordem que comprometa o funcionamento democrático do partido e este juízo depende da ponderação sobre se os bens jurídicos tute- lados pela Constituição neste caso – a transparência, a organização e a gestão democráticas e a participação de todos os seus membros – são colocados em risco ou violados. 17. Diferentemente, pois, do sustentado pelo Recorrente, a violação do artigo 117.º dos Estatutos do PS não legitima, por si só, qualquer militante a impugnar perante o Tribunal Constitucional uma deliberação dos órgãos partidários tomada em desrespeito das regras ali contidas. Não é, com efeito, essa, a interpretação do artigo 103.º-D, n.º 2, da LTC que decorre, desde logo, da sua letra. Mesmo que uma «regra essencial» do partido seja violada, tal não significa que exista uma «grave viola- ção». A qualificação da gravidade da violação da regra exige uma análise autónoma e exigente.  O Acórdão recorrido parte desta interpretação. Considerando o artigo 117.º dos Estatutos do PS uma «regra essencial» entende, todavia, que, ainda que se verificasse uma violação deste preceito, no caso, não pode­ria sustentar-se o caráter qualificado (de «grave violação») da mesma, por não terem sido belisca- dos os valores tutelados pelo artigo 117.º dos Estatutos do PS decorrentes dos princípios democráticos de organização­partidária, em especial, a salvaguarda da reserva de iniciativa estatutária e a publicidade e ante- rioridade da discussão relativa à revisão estatutária. Como se lê no Acórdão em análise «independentemente de saber se ocorreu ou não uma irregularidade por a matéria das alterações estatutárias não ter sido formalmente inscrita na ordem de trabalhos do XVIII Congresso do Partido Socialista, ou por não ter sido aprovado no mesmo Congresso uma autónoma delibe- ração a delegar poderes de revisão estatutária na Comissão Nacional, é certo e seguro que os valores tutelados pelo disposto no artigo 117.º dos Estatutos do Partido não se mostram lesados. Consequentemente, a haver qualquer irregularidade – o que não se tem por adquirido – a mesma não poderá ser tida como uma ilegali- dade qualificada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 103.º-D, n.º 2, da LTC». São as seguintes as razões invocadas em suporte daquela conclusão: «Em primeiro lugar, no tocante à reserva de iniciativa de revisão estatutária. A limitação da iniciativa a uma percentagem mínima dos militantes inscritos – artigo 117.º, n.º 2, alínea c) , dos Estatutos do Partido Socialista – destina-se tão somente a prevenir que o Congresso seja obrigado a discutir iniciativas propostas sem um mínimo de representatividade. Trata-se, por assim dizer, de um mecanismo de prevenção contra eventuais disfuncionalida- des inerentes ao mecanismo de «agendamento potestativo» aí previsto. Não está em causa impedir os militantes, mediante «iniciativas das bases», de proporem revisões estatutárias. Por isso, mesmo desconhecendo o número de subscritores iniciais da moção política de orientação nacional vencedora no XVIII Congresso, a sua aprovação pelo mesmo seria, em qualquer caso, suficiente para ratificar uma eventual iniciativa irregular. Atentas as finalidades visadas pela limitação da iniciativa de simples militantes, uma vez respeitadas a ponderação e discussão das propos- tas de alteração dos Estatutos nos procedimentos preparatórios do Congresso, com especial destaque para a eleição dos delegados ao Congresso, nada obsta a que, durante a reunião do Congresso, este delibere ratificar eventuais

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