TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
428 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL partidos políticos, através do artigo 223.º, n.º 2, alínea h) , da Constituição, que prevê a competência deste tribunal para «julgar as ações de impugnação de eleições e de deliberações de órgãos de partidos políticos que, nos termos da lei, sejam recorríveis». Estes preceitos constitucionais são, assim, essenciais para proceder a uma interpretação constitucionalmente integrada dos poderes do Tribunal Constitucional. 16. No processo aqui em presença, a questão arguida prende-se com a correta interpretação do artigo 103.º-D, n.º 2, da LTC, mais concretamente ainda, com o sentido que deve ser dado à exigência ali contida de verificação de uma «grave violação». Existe, como é afirmado no Acórdão recorrido, uma diferença fundamental entre a ação de impugna- ção prevista no artigo 103.º-D, n.º 1, da LTC e a ação prevista no artigo 103.º-D, n.º 2, da LTC. No caso da primeira, a impugnação incide sobre «decisões punitivas dos respetivos órgãos partidários, tomadas em processo disciplinar em que seja arguido, e bem assim as deliberações dos mesmos órgãos que afetem direta e pessoalmente os seus direitos de participação nas atividades do partido» – pretende-se, portanto, tutelar os direitos individuais e a posição dos militantes partidários concretos. Já em relação à ação prevista no artigo 103.º-D, n.º 2, da LTC o legislador foi muito mais cauteloso. Esta ação, qualificada expressivamente pelo Acórdão recorrido de ação popular partidária, visa a tutela dos interesses gerais de transparência e democra- ticidade interna dos partidos, sendo atribuída legitimidade processual ativa a todos os militantes do partido. No entanto, neste caso, é preciso que o fundamento invocado seja a «grave violação de regras essenciais rela- tivas à competência ou ao funcionamento democrático do partido». Trata-se de uma delimitação da competência do Tribunal Constitucional feita pelo legislador em con- cretização do artigo 223.º, n.º 2, alínea h) , da Constituição (que remete para a lei a determinação de quais as deliberações de órgãos de partidos políticos que podem ser impugnadas perante o Tribunal Constitucional e em que termos). O legislador procurou assegurar que o Tribunal Constitucional apenas intervenha na vida interna dos partidos quando tal seja indispensável, nomeadamente para assegurar o respeito pelo artigo 51.º, n.º 5, da Constituição. De facto, a remissão para uma «grave violação» das «regras essenciais relativas à competência ou ao funcionamento democrático do partido» deve ser entendida como uma referência aos «princípios da transparência, da organização e da gestão democráticas e da participação de todos os seus membros», inscri- tos no preceito constitucional. Como refere o Acórdão recorrido, «a ratio é a de que, não estando em causa direitos individuais, mas apenas questões de legalidade interna, a intervenção do Tribunal Constitucional só se justifica relativamente a ilegalidades suscetíveis de comprometerem os princípios democráticos de orga- nização partidária (cfr. o artigo 51.º, n.º 5, da Constituição; sobre tais princípios e a legitimidade ativa dos militantes, vide Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , tomo I, 2.ª edição, Coim- bra, 2010, anotações ao artigo 51.º, XV, pp. 1016-1017, e XX, p. 1020; e Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição, Coimbra, 2007, anotações ao artigo 51.º, X e XI, pp. 686-687)». Assim o tem entendido também a jurisprudência do Tribunal Constitucional: «o legislador constitu- cional, tal como o legislador ordinário, rodeou de especiais cautelas a intervenção jurisdicional destinada a garantir a observância dos princípios organizatórios e procedimentais da democracia política, pretendendo evitar que, por essa forma, se pudesse vir a exercer um controlo sobre a atividade política dos partidos e, de algum modo, limitar a liberdade de organização da vontade popular, e por isso se circunscreveu os meios processuais de impugnação das deliberações de órgãos partidários àquelas que fossem consideradas mais im- portantes para assegurar os princípios da organização e gestão democráticas dos partidos políticos, sem, por outro lado, judicializar a respetiva vida interna, correndo o risco de tolher a sua liberdade de ação política e o seu espaço de afirmação interna e externamente» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 2/11, por refe- rência ao Acórdão do mesmo Tribunal n.º 85/04, disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt ) . O modelo de controlo assim delineado pauta-se pela contenção. Pretende-se evitar que o Tribunal Cons- titucional seja chamado, a cada instante, por qualquer militante, a dirimir conflitos internos partidários,
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