TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
401 acórdão n.º 547/12 é, por natureza, um ato do delegante; uma «delegação imposta por outrem» – ou, o que para o efeito redun- dará no mesmo – uma iniciativa de atribuição de poderes sujeita à condição de os poderes conferidos serem delegados, conflitua com a própria titularidade dos poderes a delegar no momento imediatamente anterior ao ato de delegação. Pelo exposto, não cabe a menor dúvida sobre a essencialidade das regras plasmadas no artigo 117.º, n.º 1, dos Estatutos do Partido Socialista, no que respeita à competência do Congresso Nacional e à com- petência da Comissão Nacional para rever os mesmos Estatutos e sobre a importância de tais regras para o funcionamento democrático do Partido: o referido Congresso – que é um órgão nacional do Partido [cfr. o artigo 59.º, alínea a) , dos Estatutos] – só tem poderes de revisão dos Estatutos, caso a alteração estatutária tenha sido inscrita na ordem de trabalhos da sua reunião, a pedido de uma ou mais das entidades referidas no n.º 2 do mesmo preceito; e a Comissão Nacional – que também é um órgão nacional do Partido [cfr. o artigo 59.º, alínea b) , dos Estatutos] – só pode aprovar alterações estatutárias, desde que o Congresso, devidamente habilitado com poderes de revisão estatutária, nela tenha delegado esses poderes de revisão. 8.4. Como referido, a ordem de trabalhos do XVIII Congresso Nacional do Partido Socialista não contemplava qualquer ponto relativo a alterações estatutárias. Tão-pouco consta da respetiva ata a referência expressa a uma «delegação de poderes» na Comissão Nacional referente à modificação dos Estatutos (cfr. o documento n.º 14 junto à contestação, fls. 222 a 225). Resulta ainda dos autos que a Comissão Nacional, na sua reunião de 31 de março de 2012, aprovou diversas alterações aos Estatutos, porque se considerou mandatada para o fazer (cfr. o artigo 6.º da petição inicial, o artigo 40.º da contestação, a deliberação ora impugnada e a ata da reunião da Comissão Nacional de 31 de março de 2012 junta pelo autor a fls. 25 e seguintes, a que corresponde o documento n.º 1 junto à contestação). A questão da existência de mandato para aprovar alterações estatutárias foi expressamente abordada naquelareunião da Comissão Nacional. Conforme se retira da ata respetiva, foi apresentado um requerimen- to no sentido de as propostas de alterações aos estatutos não serem submetidas a votação, por se considerar não estar a Comissão Nacional “devidamente mandatada pelo Congresso” para o efeito (cfr. fls. 26 e 27 ou fls. 64 e 65). E a sequência foi a seguinte (vide ibidem ): «Interveio o camarada António Ramos Preto, que esclareceu que o processo é anterior, que começou com a apresentação da candidatura a Secretário-Geral de António José Seguro, que vinha instruído com uma moção denominada “Novo Ciclo”. Nesta moção expressa que com a sua aprovação se mandata a Comissão Nacional para a revisão dos estatutos. Nessa sequência foi produzida a convocatória ao Congresso, foi votada a aprovação da moção de orientação (a qual obteve cerca de 75%). No dizer de António Ramos Preto, o que é preciso saber é se o artigo 117.º foi cumprido, ou não, e quais as consequências. No seu entender foi dado cumprimento através de uma inscrição prévia, independentemente de não ter sido a mais comum. Todos tinham consciência do processo, não havendo a omissão de qualquer formalidade essencial, pelo que não existe efeito invalidante. Interveio a Presidente da Mesa, Maria de Belém Roseira, que justificou a sua interpretação e porque estava obrigada a este procedimento. De acordo com o artigo 9.º do Código Civil a interpretação não deve cingir-se à letra da lei e explicou que a moção, de acordo com o artigo 61.º, n.º 5 [dos Estatutos]. Dissolve-se o Congresso e as suas conclusões têm valor vinculativo. Foi desta forma que se sentiu obrigada a Comissão Nacional com esta ordem de trabalhos [para a reunião de 31 de março de 2012], sendo hoje o dia limite para se cumprir a decisão referida. Posto à votação o requerimento, foi este rejeitado com 25 votos a favor e 134 votos contra.» É, por conseguinte, manifesto que o formalismo previsto no artigo 117.º dos Estatutos do Partido Socialista quanto à alteração dos mesmos Estatutos não foi observado. A questão que se coloca, e que é deci- siva para julgar da procedência da presente ação quanto à nulidade do acórdão da CNJ de 29 de setembro de
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