TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
400 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E o assumir destes poderes é de tal modo relevante que são muito poucas as fontes legítimas para que se proceda a essa inclusão na ordem de trabalhos. Na verdade, no n.º 2 do artigo 117.º dos estatutos do PS considera que essa inclusão na ordem de trabalhos pode ocorrer: “ a. Por iniciativa da Comissão Nacional ou da Comissão nacional Política Nacional, ou mediante proposta do Secretário-Geral; b. Pela maioria das Comissões Políticas das Federações que representem também a maioria dos militantes inscritos; c. Por iniciativa de 5% dos militantes inscritos. Deste preceito resulta que estamos perante uma enumeração taxativa das vias juridicamente legitimadas para conduzirem à inscrição de alterações estatutárias na ordem de trabalhos do Congresso. Repare-se, aliás, que os estatutos são inequívocos, quando indicam qual a via de que o secretário-geral dispõe para conseguir que eles sejam modificados num Congresso. Ele tem apenas um caminho à sua dis- posição: propor a inscrição desse ponto na ordem de trabalhos. Não lhe é dada qualquer outra hipótese. Portanto, algo diferente, mesmo para o secretário-geral, não é suficiente. Por isso, o Congresso Braga de setembro passado, realmente, não teve poderes de alteração estatutária. Ora, o Congresso só poderia ter delegado poderes de alteração estatutária à Comissão Nacional se os tivesse. Ninguém pode delegar poderes que não tem. Por isso, a Comissão nacional do PS não tem competência legal para votar qualquer alteração estatutá- ria, até que um novo Congresso Nacional decida outorgar-lhos. Perante a clareza dos textos, não é provável que qualquer tribunal decida noutro sentido. 29. Donde, a Comissão Nacional ao ter aprovado tal deliberação, que ora entende a CNJ como tendo sido tomada de forma válida, torna-se para nós, absolutamente óbvio que o dito órgão nacional (CN) cometeu gritante e ostensiva ilegalidade de tal deliberação, por clara e também ostensiva violação do disposto no artigo 117.º, n.º 1 in fine dos Estatutos do PS, na sua redação anterior àquela que lhe foi dada pela dita deliberação estatutariamente ilegal.» A exigência de inscrição prévia na ordem de trabalhos do Congresso Nacional da alteração dos Esta- tutos, independentemente de tal alteração dever ser realizada pelo próprio Congresso ou por ele delegada na Comissão Nacional, tal como prevista no artigo 117.º, n.º 1, dos Estatutos do Partido Socialista, é uma regra básica e fundamental de transparência e de publicidade do procedimento de formação democrática da vontade partidária. O relevo desta exigência é ainda reforçado pela circunstância de a mesma se encontrar associada a uma reserva de iniciativa quanto a alterações estatutárias, nos termos do n.º 2 do mesmo precei- to. Com efeito, decorre do artigo 117.º em análise que o Congresso Nacional do Partido Socialista só tem poderes de revisão estatutária, desde que tal revisão seja inscrita na respetiva ordem de trabalhos a pedido das entidades especialmente legitimadas para o efeito. Pretende-se, assim, evitar que este órgão assuma por iniciativa própria e em situações não previstas antecipadamente os aludidos poderes de revisão. A inscrição prévia na ordem de trabalhos apresenta-se, deste modo, simultaneamente como uma salvaguarda da reserva de iniciativa estatutária e uma salvaguarda da ponderação e discussão prévias à própria reunião do Congresso das alterações estatutárias a discutir no seio deste órgão. A titularidade de poderes de revisão estatutária pelo Congresso sobreleva a questão da delegação desses poderes na Comissão Nacional. Isto é, uma vez dotado de poderes de revisão, cabe ao Congresso, e só a ele, decidir se os exerce diretamente ou se os delega na Comissão Nacional. Com efeito, o Congresso só pode delegar poderes de que seja titular, e essa titularidade é-lhe conferida mediante a inscrição das alterações estatutárias na ordem de trabalhos da sua reunião. A partir do momento em que o Congresso se encontra dotado de poderes de revisão estatutária, o mesmo é «soberano» no sentido de os exercer, ou não, e, por maioria de razão, de os delegar, ou não. Qualquer outro entendimento desfiguraria a liberdade própria do delegante relativamente ao ato de delegação. Em especial, conceber a possibilidade de um condicionamento do exercício de poderes de revisão estatutária pelo modo como é promovida a inscrição das alterações esta- tutárias na ordem de trabalhos do Congresso, designadamente no sentido de admitir que tais poderes sejam obrigatoriamente delegados na Comissão Nacional, contraria a própria ideia de delegação de poderes. Esta
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