TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
393 acórdão n.º 547/12 princípio enformador da exigência de exaustão dos meios internos. Esta última, conforme salienta o autor na resposta às exceções, visa tão só impedir que o Tribunal Constitucional, em matéria de contencioso partidá- rio, seja a primeira entidade a resolver o respetivo litígio (cfr. o artigo 32.º daquele articulado). Na verdade, se o órgão máximo de jurisdição de um partido político já decidiu da validade de uma dada deliberação tomada por um órgão do mesmo partido, a apreciação que o Tribunal Constitucional venha a fazerda mesma deliberação é necessariamente indireta, não funcionando o Tribunal como a primeira ins- tância de controlo da legalidade interna ou externa de tal deliberação. A apreciação que o Tribunal realiza é necessariamente antecedida pela interpretação e aplicação do direito, mormente das normas estatutárias e demais normas internas, feita por um órgão de controlo de legalidade do próprio partido político, ressalvan- do-se, desse modo, o mínimo de autonomia inerente à liberdade de auto-organização. Importa, na verdade, não esquecer que a criação de partidos políticos ainda é uma expressão da liberdade de associação (cfr. artigo 51.º, n.º 1, da Constituição). Aliás, a exigência de uma reclamação prévia nas aludidas circunstâncias, enquanto limitação ou retarda- mento do acesso ao Direito e ao Tribunal Constitucional, teria de ter uma justificação que de todo em todo não se vislumbra. A reclamação é um meio de impugnação de uma decisão perante o respetivo autor e, como tal, pode dar lugar a uma decisão secundária ou de controlo de uma decisão primária – aquela que respeita a uma dada situação da vida que deva ser objeto de decisão formal. Porém, tratando-se da reclamação de uma decisão secundária, a decisão da reclamação já só pode ocasionar uma nova decisão secundária: a um primei- ro juízo de controlo, segue-se um segundo emitido pelo mesmo órgão. Se o que está em causa, da perspetiva de quem impugna uma deliberação ou decisão primária, recorrendo dela para um órgão de controlo, é a discordância quanto à própria apreciação da decisão primária por tal órgão, que interesse poderá justificar a exigência de uma segunda apreciação da mesma decisão primária pelo mesmo órgão de controlo, enquanto condição necessária para a abertura da via jurisdicional? Saliente-se, por fim, que a impugnabilidade imediata perante o Tribunal Constitucional de decisões proferidas pelo órgão de jurisdição máximo de um partido político sobre decisões para ele inicialmente reclamadas ou recorridas – ou seja, a impugnabilidade imediata de decisões sobre reclamações ou recursos de decisões primárias – agora afirmada em nada contende com a jurisprudência anterior deste mesmo Tribunal, mormente a referida pelo réu na sua contestação. Com efeito, e como resulta dos excertos transcritos naquele articulado (cfr. o artigo 16.º), o Acórdão n.º 317/10 versou sobre uma situação em que o órgão jurisdicio- nal máximo do partido – no caso o Conselho de Jurisdição Nacional do Partido Social Democrata – atuou como órgão de decisão primário, e não como instância interna de controlo. Acresce que a decisão em causa correspondia à aplicação de uma sanção disciplinar – matéria objeto da norma contida no artigo 22.º, n.º 2, da LPP, segundo a qual, “compete aos órgãos próprios de cada partido a aplicação das sanções disciplinares, sempre com garantias de audiência e defesa e possibilidade de reclamação ou recurso”. Como nota o autor na sua resposta às exceções, em sede de controlo interno de sanções disciplinares, a lei “alude à figura da reclamação ou recurso, mas ainda assim, nunca exigindo cumulativamente o uso dos dois meios processuais. Na verdade, utiliza a disjuntiva (ou) e nunca a cumulativa (e). O mesmo é dizer, que apenas exige (e apenas em sede disciplinar!) […] que o impugnante faça uso, ou do recurso respetivo, ou da reclamação que ao caso seja adequada a obter a eventual reapreciação da decisão tomada por um órgão de um partido” (cfr. o artigo 20.º; vide também o artigo 31.º do mesmo articulado) Neste contexto, compreende-se a citada jurisprudência anterior deste Tribunal, em particular o excerto do Acórdão n.º 317/10 transcrito pelo réu (artigo 16.º da contestação): «[A]pesar de não se encontrar expressamente prevista nos Estatutos do Partido Social Democrata a possibili- dade de reclamação ou recurso da deliberação do Conselho de Jurisdição Nacional que aplica a sanção disciplinar de cessação da inscrição no Partido, a existência dessa garantia é imposta pelo disposto no artigo 22.º, n.º 2, da Lei dos Partidos Políticos.
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