TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
335 acórdão n.º 614/12 exercíciodo direito ao recurso: melhor efetivação do princípio da igualdade de armas, de forma a que a maior tempo para a perseguição criminal corresponda equitativamente maior tempo para a defesa. 9. A necessidade de extender os prazos processuais de arguição em função da excecional complexidade do procedimento havia, aliás, sido afirmada por este Tribunal Constitucional pouco antes da revisão do Código de Processo Penal operada em 2007, através do Acórdão n.º 42/07, prolatado em 23 de janeiro. Apreciou-se nesse aresto a norma do artigo 123.º do Código de Processo Penal, de acordo com a qual, num processo especialmente complexo, o arguido dispõe de três dias para arguir irregularidades de atos de inquérito, face ao princípio consagrado no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição (CRP), segundo o qual o processo criminal assegura todas as garantias de defesa. Considerou, então, o Tribunal que a diferenciação do tempo disponível para a investigação em procedimentos especialmente complexos coloca situações em que o tempo para a defesa será objetivamente exíguo, em termos de afetar, nessa medida, as garantias de defesa. Para atingir essa conclusão, ponderou o Tribunal a ausência de norma que permitisse o alargamento do prazo em atenção «às circunstâncias de objetiva inexigibilidade» do prazo de arguição em presença, como agora acontece com os atos processuais previstos no atual n.º 6 do artigo 107.º do Código de Processo Penal. Releva para o caso em apreço, especialmente o seguinte segmento desse aresto: «(...) O n.º 1 do artigo 32.º da Constituição determina que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa. Do ponto de vista substancial, o princípio consagrado implica a concessão de uma efetiva possibilidade de exercício da defesa (o poder de arguir vícios dos atos praticados no inquérito é inquestionavelmente um direito de defesa), o que pressupõe naturalmente o acesso à informação necessária, ou seja, aos elementos do processo. Tal acesso e a aquisição da informação inerente consomem tempo, variando, naturalmente, a quantidade de tempo em função da dimensão material e da complexidade do processo. O artigo 123.º do Código de Processo Penal estabelece um prazo de três dias para a arguição de nulidades, concretizando o princípio da celeridade processual. No entanto, como entendeu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 406/98 ( www.tribunalconstitucional.pt ) , o princípio da celeridade processual não se sobrepõe ao núcleo essencial das garantias de defesa. De resto, nesse Acór- dão, o Tribunal julgou inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, o artigo 287.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na versão anterior ao Decreto-Lei n.º 317/95, de 27 de novembro, na medida em que fixava em cinco dias, contados da notificação da acusação, o prazo para o arguido requerer a abertura da instrução, com o fundamento de tal prazo, dada a sua exiguidade, não permitir à defesa a gestão da sua estratégia e das corres- pondentes iniciativas. Cabe salientar, neste contexto, que o Código de Processo Penal determina a elevação dos prazos de duração máxima de prisão preventiva nos casos em que é declarada a especial complexidade do processo (artigo 215.º, n.º 3), reconhecendo a necessidade de diferenciar os processos em função da respetiva complexidade. Ora, o prazo de três dias a contar da notificação da acusação para arguição de vícios dos atos praticados no inquérito em casos de especial complexidade pode afigurar‑se insuficiente, já que se repercute, em princípio, nas possibilidades de identificação desses vícios e, consequentemente, no exercício dos direitos de defesa. Na verdade, o reconhecimento da especial complexidade de um processo repercutir‑se-á, não só no tempo disponível para a investigação, mas também no tempo para a defesa exercer os seus direitos de defesa. Por outro lado, se é certo que haverá irregularidades cuja natureza as tornará questão de fácil e imediata iden- tificação, em outros casos, em processos de especial complexidade, essa complexidade afetará, necessariamente, a avaliação pela defesa de certas irregularidades (recorde-se que estava em causa a arguição de irregularidades de atos de inquérito e que a acusação deduzida contra 57 arguidos tinha 477 páginas com mais de uma centena de alegados lesados e 215 testemunhas de acusação arroladas, podendo a irregularidade repercutir-se na acusação). Deste modo, conjugando a especial complexidade do processo com a natureza da irregularidade em causa, haverá obviamente situações em que o prazo de três dias para arguir a irregularidade é objetivamente exíguo. Ora, não contemplando
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