TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 85.º Volume \ 2012
313 acórdão n.º 594/12 a disposição tenha de ser qualificada como arbitrária” (1 BVerfGE 14, 52; mais recentemente, cfr. 12 B VerfGE 341, 348; 20 BVerfGE 31, 33; 30 BVerfGE 409, 413; 44 BVerfGE 70, 90; 51 BVerfGE 1, 23; 60 BVerfGE 101, 108). Caminhos idênticos foram percorridos pelo Tribunal Constitucional português (a título meramente exemplifi- cativo, cfr. os Acórdãos n. os 44/84, 186/90, 187/90 e 188/90, in Acordãos do Tribunal Constitucional , 3.º Vol., pp. 133 e segs., e 16.º Vol., pp. 383 e segs., 395 e segs. e 411e segs., respetivamente). No Acórdão n.º 39/88, o Tribu- nal teve ocasião de dizer: “[O] princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio; ou seja, proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, segundo critérios de valor objetivo constitucionalmente relevantes (...)” (in Acordãos do Tribunal Constitucional , 11.º Vol., pp. 233 e segs.). E, curiosamente, também nos Estados Unidos se alude à necessidade de, no estabelecimento de diferenciações, obedecer a um cânone de razoabilidade (reasona- bleness) (cfr. J. Tussman e J. tenBroek, “The equal protection of the laws” , in California Law Review , n.º 37, 1949, p. 344, cit. por Gianluca Antonelli, “La giurisprudenza italiana e statunitense sul principio di solidarietà”, in Studi parlamentari e di politica costituzionale, n. os 125-126, 1999, p. 89; sobre o princípio da razoabilidade na jurispru- dência norte-americana, cfr. Giovanni Bognetti, “Il principio di ragionevolezza e la giurisprudenza della Corte Suprema degli Stati Uniti”, in AA.VV., Il principio di ragionevolezza nella giurisprudenza della Corte Costituzionale. Riferimenti comparatistici, Milão, 1994, pp. 43 e segs.). Neste domínio em especial, merece destaque a evolução da jurisprudência constitucional italiana que, tendo firmado em termos absolutos a ideia da discricionariedade do legislador ( sentenze n. os 28/1957 e 56/1958) , veio pouco depois indagar se uma dada lei se apresentava “destituída de qualquer justificação” e se a mesma detinha uma “razão idónea” ( sentenza n.º 46/1959). Na sentenza n.º 15/1960, a Corte disse que era sua jurisprudência constante considerar que “(...) o princípio da igualdade é violado mesmo quando a lei, sem um motivo razoável, procede a um tratamento diverso de cidadãos que se encontram em situação idêntica”. A doutrina, de seu lado, não andou longe destas asserções: já Mortati afirmava, por exemplo, que o legislador tinha “a obrigação de não violar as leis da lógica” ( Istituzioni di diritto pubblico, Pádua, 1958, p. 715; mais recentemente, cfr. a mesma obra, 9.ª edição, atua- lizada, Pádua, 1976, pp. 1412 e segs.). Mais tarde, Carlo Lavagna teve a perceção clara da necessidade do recurso a um princípio de razoabilidade que definiu como “la utilizzazione razionale dei contesti umani nella costruzione di norme sulla base delle prescrizioni-fonte” e enunciou os diversos critérios da sua ponderação: a correspondência (cor- rispondenza) , o juízo sobre a finalidade (giudizio sulle finalità) , a pertinência (pertinenza) , a congruência (congruità) meios/fins, a coerência (coerenza) , a evidência (evidenza) e, enfim, a motivação (motivazione) (cfr. “Ragionevolezza e legittimità costituzionale”, in Studi in memoria di Carlo Esposito , vol. III, Pádua, 1973, pp. 1573 e segs.). De igual modo, Vezio Crisafulli reconheceu que o Tribunal, ao indagar de eventuais violações do princípio da igualdade, fá-lo, designadamente, com base numa “cláusula geral de razoabilidade” (cfr. Lezioni di diritto costituzionale, tomo II, 5.ª edição, Pádua, 1984, p. 372). Contrariando a tese do “racional como razoável” (Aulis Aarnio), Gustavo Zagrebelski veio distinguir a ideia de racionalidade que, em seu entender, corresponderia à coerência lógica da ideia de razoabilidade, estando esta ligada a uma adequação aos valores de justiça que funciona primacialmente como um vínculo negativo do legislador [cfr. La giustizia costituzionale, 2.ª edição, Bolonha, 1988, pp. 147 e segs.; idem ,“Su tre aspetti della ragionevolezza”, in AA.VV., Il principio..., cit., pp. 179 e segs., em esp. pp. 181-184 (onde parece aproximar os conceitos de razoabilidade e racionalidade)]. E, justamente naquele primeiro sentido isto é, no sentido de uma racionalidade coerente, aludiu o Tribunal Constitucional italiano, na sua sentenza n.º 204/1982, a um“cânone geral de coerência” (generale canone di coerenza) [cfr., sobre a evolução jurisprudencial do Tribunal Constitucional italiano, A. Agrò, “Commento all’art 3 Cost.”, in G. Branca (org.), Commentario della Costituzione, vol. I, Bolonha e Roma, 1975, pp. 141 e segs.; Paolo Barile, “Il principio di ragionevolezza nella giurisprudenza della Corte Costituzionale”, in AA.VV., Il principio... , cit., pp. 21 e segs; Livio Paladin, “Ragionevolezza (principio di)”, in Enciclopedia del Diritto – Aggiornamento, vol. I, Milão, 1997, em esp. pp. 900 e segs.]. Destaque-se, por outro lado, que também a jurisprudência do Conselho Constitucional francês fez referência à necessidade de o legislador se nortear por critères rationnels et objectifs . Particularmente no que respeita ao princí- pio da igualdade perante os encargos públicos, o Conselho admitiu a introdução de discriminações, desde que as mesmas se fundassem em critérios objetivos e racionais cfr. as decisões 83-164 DC de 29-12-1983, 89-270 DC de
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